João Cabral de Melo Neto nasceu no dia 09 de janeiro em Recife, Pernambuco efaleceu no Rio de Janeiro, em 9 de outubro de 1999. Foi além de poeta, diplomata. Sua obra poética, que vai de uma tendência surrealita até a poesia popular, porém caracterizada pelo rigor estético, com poemas avessos a confessionalismos e marcados pelo uso de rimas toantes, inaugurou uma nova forma de fazer poesia no Brasil. É considerado o maior poeta de língua portuguesa por escritores como Mia Couto, escritor moçambicano atualemnte, sendo o único, depois de João Cabral, galardoado com o Prêmio Neustadt, tido como o "Nobel Americano" . Tanto Mia quanto João Cabral foram os únicos até agora a receberam tal honraria.
João Cabral de Melo Neto redigia versos, como quem lapidava um diamante: talhando as arestas pacientemente, buscando o formato perfeito. Sua obra provocou uma revolução sem precedentes na literatura brasileira: o triunfo de uma estética perfeccionista, rigorosa na escolha das palavras e na valorização geométrica das estrofes, sem concessões à veia dramática da poesia convencional. Mais transpiração do que inspiração, assim pode ser qualificado o estilo de Cabral. A definição sugere o esmero demasiado com que o autor se lança à “construção” dos versos . Poeta-engenheiro e arquiteto das palavras, João Cabral de Melo Neto compunha uma poesia não-lírica, não-confessional e sem ornamentos - por isso mesmo tachada de seca e áspera -, que suscitou polêmicas, mas venceu a resistência da crítica, despertando o fascínio da academia, desencadeando uma revolução formal e influenciando as gerações seguintes.
Na poesia de Cabral percebem-se algumas dualidades antitéticas, trabalhadas com um certo barroquismo e à exaustão. Entre espaço e tempo, entre o dentro e o fora, entre o maciço e o não-maciço, entre o masculino e o feminino, entre o Nordeste desértico e a Andaluzia fértil, ou entre a Caatinga desértica e o úmido Pernambuco. É uma poesia que causa algum estranhamento a quem espera uma poesia emotiva, pois seu trabalho é basicamente cerebral e "sensacionista", buscando uma poesia construtivista e comunicativa, objetiva.
O autor de "Morte e Vida Severina" nunca escondeu seu amor pelo futebol, a ponto de quase trocar a poesia e o futuro ofício de diplomata pela pelota, em 1935, quando sagrou-se campeão juvenil pelo Santa Cruz. Embora fosse primo de Gilberto Freyre e de Manuel Bandeira, talentos eminentes da literatura brasileira, João Cabral só tinha olhos para os gramados.
O interesse pela poesia só viria em 1936, quando descobre uma antologia de poetas modernos, que lhe introduz o universo lírico de Manoel Bandeira, Jorge de Lima e Carlos Drummond de Andrade. Drummond, sobretudo, provocou um fascínio intenso no pernambucano
“Quando o li ainda no Recife, declarou numa reportagem da Folha de São Paulo, " foi uma revelação. Eu tenho a impressão de que eu escrevo porque li o primeiro livro dele, “Alguma Poesia”. Foi ele quem me mostrou que ser poeta não significava ser sonhador, que a ironia e a prosa cabiam dentro da poesia”. Outros autores da segunda geração modernista também se
tornariam referência para o jovem escritor: Graciliano Ramos e João Guimarães Rosa, sobretudo.
Em 1938, havia em Recife uma roda literária, que freqüentava o Café Lafaiete e se reunia em torno de Ville Levy e do pintor Vicente do Rego Monteiro. Foi com este grupo que Cabral primeiro travou contato. Sobre o incentivo de Ville Levy, o jovem escritor passou a se interessar pelos autores franceses. Baudelaire e
Mallarmé são os primeiros da lista. Mas foram os ensaios críticos sobre arquitetura de Paul Valéry que mais influenciaram o poeta, ampliando sua paixão pelas formas e artes visuais.
Autodidata, João Cabral nunca demonstrou empolgação por algum curso superior, preferindo trabalhar: conseguiu seu primeiro emprego em 1937, na Associação Comercial de Pernambuco. Datam desta época, os primeiros sintomas de uma forte dor de cabeça, que o acompanharia ao longo da vida e seria posteriormente celebrizada em versos (“Monumento à aspirina”). Segundo o irmão Virnílio Cabral de Melo, João ratificaria o interesse definitivo pela poesia após nova hospitalização. À esta altura, redigira já vários poemas.
Numa reportagem ao Diário de Pernambuco, em 09 de outubro de 2004, Virnílio assim declarou :
“João começou a escrever por volta de mil novecentos e trinta e poucos, mas trancava tudo nas gavetas. Ninguém via nada. Em 1940 nós fomos passar umas férias no Rio de Janeiro e ele mostrou suas poesias a Murilo Mendes, que escreveu, no Jornal do Brasil, um artigo sobre o poeta de 20 anos. Eu li essa notícia e como eu era meio bisbilhoteiro e, além de bisbilhoteiro, eu era o primogênito,
procurei descobrir onde é que João guardava esses escritos. Descobri, tirei e mostrei a papai. Papai gostou e procurou a Empresa Gráfica Brasileira, que era a melhor tipografia daquele tempo, aqui em Recife, e assim nasceu Pedra do Sono, seu primeiro livro”.
Esta viagem foi um marco na vida de João Cabral. Além do contato com Murilo Mendes, foi apresentado a Carlos Drummond de Andrade e ao círculo de intelectuais que se reunia no consultório do médico e escritor Jorge de Lima. Influenciado pela ironia da fase inicial de Drummond e a poesia imagética de Murilo Mendes, Cabral estreou na poesia em 1942, com “Pedra do Sono”. No mesmo ano, muda-se para a capital carioca e começa a escrever ´O Engenheiro´, obra que seria finalizada em 1945 e onde radicalizaria o seu estilo formalista, negando o subjetivismo e “levando a poesia pra esse lado arquitetônico”.
Uma curiosidade : o cabra pernambucano João Cabral de Melo Neto considerava que poesia era uma coisa romântica para gente meio afeminada. Mas tudo mudou ao entrar em contato com a poesia fragmentária, gaguejada e torta de Carlos Drummond de Andrade. Ler Drummond funcionou como uma revelação. João percebeu que poderia inventar uma poesia macha, tensa e tesa, com língua de faca, mandacaru e fuzil. Na busca obsessiva de fazer poesia com coisas, João criou poemas concretos, poemas-objetos, esculturas verbais cubo-futuristas: "O sol de Pernambuco é sol de dois canos/de tiro repetido.O primeiro dos dois, o fuzil de luz/revela real o real: tiro de inimigo". Contudo, essa postura de negar a subjetividade alimentou o mito de que seria um poeta exclusivamente cerebral, um homem sem alma, que tinha como principal musa a razão, a cabeça de engenheiro. A própria obra de Cabral se encarrega de desmentir esse mito, pois a arquitetura rigorosa de sua poesia é sempre minada pela tensão do cabra pernambucano visceral: "E, por baixo, a realidade prima/Tão violenta, que ao tentar aprisioná-la/Toda imagem rebenta".
Quando veio a residir no Rio de Janeiro, levou uma vida bem intensa. Aproximou-se mais de Drummond, publicou novo livro - “Os três mal-amados” - e ficou amigo do poeta Vinícius de Moraes, que considerava um irmão. Em 1945, ingressa na carreira diplomática. No ano seguinte, casa-se com Stela Maria Barbosa de Oliveira, com quem teve cinco filhos. A partir de 1947, João Cabral passa a residir no exterior, em função da carreira diplomática, sem desistir da veia literária.
Observa-se nas suas poesias que os grandes temas de Cabral eram : a aridez, a crueza, a obsessão pela materialidade, a dimensão animal da vida, o fio afiado da linguagem, a busca de uma antipoesia. Isso fica evidente mesmo em uma despretensiosa resposta de Cabral a uma poema de Vinicius de Moraes, em certo sentido o seu antipoda romântico, que o chamou de "camarada diamante". A réplica de Cabral constitui, na verdade, quase que uma poética: "Não sou um diamante raro/nem consegui cristalizá-lo/se ele se surge no que faço,/será um diamante opaco,/de quem por incapaz do vago/quer de toda a forma evitá-lo,/senão com o melhor, o claro,/do diamante, com o impacto;/com a pedra, a aresta, com o aço/do diamante industrial, barato,/que incapaz de ser cristal raro/vale pelo que tem de cacto".
O poeta e acadêmico João Cabral de Melo Neto veio a falecer no dia 09 de outubro de 1999, por volta das 11h30, em seu apartamento, no Flamengo (zona sul do Rio), aos 79 anos. A causa da morte não foi divulgada.
Seu filho João Cabral de Melo disse que o pai não sofria de nenhuma doença além do problema visual. E disse que ele" morreu de mãos dadas com sua mulher, Marly de Oliveira, rezando. Ele estava praticamente cego e sofria de depressão nos últimos anos de vida.
O escritor era casado pela segunda vez.
Tinha cinco filhos.
Segundo o também acadêmico Antônio Olinto, a limitação visual aumentava a depressão de João Cabral, porque ele era um grande apreciador de pintura. Desde os 30 anos, o poeta sofria de dores de cabeça frequentes.
João Cabral foi eleito para a ABL em 1968 e ocupava a
cadeira número 37, que já havia sido ocupada, entre outros, por Getúlio Vargas e Assis Chateaubriand.
O enterro foi realizado no dia seguinte do falecimento no mausoléu da academia, no cemitério São João Batista, em Botafogo (zona sul).
João Cabral de Melo Neto era diplomata, tendo
exercido o cargo de embaixador no Senegal e na Colômbia.
Seu último posto na carreira diplomática foi o de cônsul-geral do Brasil na cidade do Porto, em Portugal, em 1985, quando se aposentou.
O primeiro livro do poeta foi "Pedra do Sono", lançado em 1942. Para Antônio
Olinto, a obra iniciou uma nova fase na literatura brasileira, marcada por um antiparnasianismo que influenciou vários outros poetas brasileiros.
FONTES DE REFERÊNCIA :
- Jornal Folha de São Paulo, 10 de outubro de 1999.
- Jornal "O Correio Braziliense", 18/01/2010.