Qual a regra geral de foro do CPC?

Neste artigo, eu vou explicar para você, passo a passo, tudo sobre a competência no âmbito do Processo Civil.

  • Dica: você pode assistir o vídeo abaixo para entender, de forma definitiva, o tema. Nele, eu desenho tudo sobre o assunto.

Em primeiro lugar, é preciso lembrar que a jurisdição é una e indivisível.

Contudo, é possível estabelecer limites em face do exercício da jurisdição.

Os limites, aqui, serão definidos pelas regras de competência.

A competência, portanto, é compreendida como um fator de legitimação da atuação dos julgadores.

Você pode estar se pergutando: “mas quem define quem é competente para o que???”.

Essa resposta está no art. 44 do Código de Processo Civil.



Observe o que diz o dispositivo:

Art. 44. Obedecidos os limites estabelecidos pela Constituição Federal , a competência é determinada pelas normas previstas neste Código ou em legislação especial, pelas normas de organização judiciária e, ainda, no que couber, pelas constituições dos Estados.

Portanto, quem define a competência é:

  1. O CPC;
  2. A legislação especial;
  3. As normas de organização judiciária;
  4. A Constituição dos Estados.

A competência será determinada no momento do registro ou distribuição da petição inicial.

Observe o que dispõe o art. 43 do Código de Processo Civil:

Art. 43. Determina-se a competência no momento do registro ou da distribuição da petição inicial, sendo irrelevantes as modificações do estado de fato ou de direito ocorridas posteriormente, salvo quando suprimirem órgão judiciário ou alterarem a competência absoluta.

O registro ocorre em face de processo eletrônico, ao passo que a distribuição ocorre em relação aos processos físicos.

Neste momento de determinação da competência, incide o denominado princípio da perpetuatio jurisdictionis.

Segundo esse princípio, a ação deve ser preservada onde inicialmente foi distribuída/ registrada. Deve-se impedir o deslocamento de competência de um juízo para outro, mesmo que seja criado órgão dentro da mesma comarca.

Essa preservação, contudo, não será aplicada se:

  1. Ocorrer a supressão da vara;
  2. Ocorrer a modificação de competência absoluta.

Ainda a título de introdução, é preciso lembrar que o próprio julgador sempre terá uma competência de reconhecer sua própria competência (ou incompetência), ainda que diante de regras de competência absoluta.

Trata-se do denominado princípio do Kompetenz-Kompetenz.

Classificação da Competência

A competência poderá ser absoluta ou relativa.

A competência absoluta não poderá ser alterada/ modificada.

O Direito chama a alteração da competência de prorrogação de competência.

Por isso, a doutrina esclarece que a competência absoluta não admite prorrogação da competência.

A competência é absoluta em razão da:

  1. Matéria: tem como parâmetro de fixação a matéria debatida nos autos (por exemplo, justiça do trabalho);
  2. Pessoa: tem como parâmetro de fixação a pessoa que é parte no processo (por exemplo, na hipótese da União ser parte do processo, a competência será Federal);
  3. Hierarquia: tem como parâmetro de fixação o grau de jurisdição  (por exemplo, o REsp será julgado pelo STJ);
  4. Funcional: tem como parâmetro de fixação um processo anterior (por exemplo, embargos de terceiro devem ser distribuídos onde foi distribuído o processo principal).

Aliás, como bem esclarece o art. 62 do CPC, “a competência determinada em razão da matéria, da pessoa ou da função é inderrogável por convenção das partes“.

A falta de competência absoluta pode ser declarada de ofício ou pela parte em qualquer momento do processo.

Essa espécie de incompetência é tão grave que pode ser alegada, inclusive, em ação rescisória (art. 966, II, CPC) e não convalesce com o decurso do tempo.

Você pode estar se perguntando: “e como fica o processo na hipótese de ser conduzido por juiz absolutamente incompetente?“.

Neste caso, os atos praticados são mantidos, inclusive os atos decisórios. Caberá ao juiz competente decidir se mantém os atos ou não.



A competência relativa, por sua vez, admite alteração/ modificação, ou seja, poderá ocorrer a prorrogação de competência.

A competência será relativa em razão do:

  1. Valor da causa;
  2. Território.

O art. 63 do CPC destaca que “as partes podem modificar a competência em razão do valor e do território, elegendo foro onde será proposta ação oriunda de direitos e obrigações“.

A competência relativa não pode ser declarada de ofício.

Contudo, poderá declarar:

  1. a abusividade da cláusula de eleição de foro;
  2. a incompetência na hipótese de juizado especial. Aqui, o juiz pode reconhecer sua incompetência (absoluta ou relativa), hipótese em que o processo será extinto sem resolução do mérito.

Muito embora o conceito de competência relativa admita prorrogação, fato é que existem algumas exceções…

Como se sabe, a parte pode, abrindo mão do valor excedente, ajuizar ação no juizado especial cível (procedimento sumaríssimo), ou ainda, optar pelo procedimento comum. Trata-se de competência fixada em razão do valor da causa.

Contudo, não é possível modificar a competência na hipótese de Juizado Especial Federal e Juizado Especial da Fazenda.

Em razão do território, a regra é que será competente para julgar a demanda o foro de domicílio do réu.

Neste caso, tem-se o seguinte:

  1. Réu com mais de um domicílio: será competente o foro de qualquer deles;
  2. Réu sem domicílio certo: será competente o foro do local onde for encontrado ou o  foro do domicílio do autor.

Por se tratar de competência relativa, admite-se a prorrogação de competência, exceto:

  1. Em ação real imobiliária;
  2. Em ação possessória de bem imóvel.

Quanto ao tema, o Código de Processo Civil esclarece o seguinte:

Art. 47. Para as ações fundadas em direito real sobre imóveis é competente o foro de situação da coisa.

§ 1º O autor pode optar pelo foro de domicílio do réu ou pelo foro de eleição se o litígio não recair sobre direito de propriedade, vizinhança, servidão, divisão e demarcação de terras e de nunciação de obra nova.

§ 2º A ação possessória imobiliária será proposta no foro de situação da coisa, cujo juízo tem competência absoluta.

Portanto, neste caso, será competente o foro:

  1. da situação da coisa;
  2. de eleição (do contrato);
  3. de domicílio do Réu

Observe que o próprio dispositivo (Art. 47, § 1º, do CPC) esclarece que esse tipo de escolha cabe apenas se o litígio não recair sobre:

  1. Direito de propriedade;
  2. Direito de servidão;
  3. Divisão e demarcação de terras;
  4. Direito de vizinhança;
  5. Nunciação de obra nova.

Em todos esses casos, será obrigatório a propositura da ação no foro da situação o bem.

Serão propostas no domicílio do autor da herança as ações de:

  1. Inventário
  2. Partilha
  3. Arrecadação
  4. Cumprimento de disposições de última vontade;
  5. Impugnação ou anulação de partilha extrajudicial;
  6. Todas as ações em que o espólio for réu, ainda que o óbito tenha ocorrido no estrangeiro.

Você pode estar se perguntando: “e na hipótese do autor da herança não ter domicílio?“

Neste caso, o foro competente será:

  1. O local do bem imóvel;
  2. O local de quaisquer dos bens imóveis, se tem mais de um imóvel;
  3. O local onde tem bens, se não possui bens imóveis.

Na hipótese de pessoa jurídica de direito público integrar a relação jurídica processual, será competente sempre o foro do domicílio da parte adversária.

Por exemplo:



  1. Pessoa física/ jurídica contra Estado/ União. A competência será do foro do domicílio do Autor.
  2. Estado/ União contra Pessoa física/ Jurídica. A competência será do foro do domicílio do Réu.

Além disso, como regra, a intervenção da pessoa jurídica de ente federal enseja o deslocamento da competência para a justiça federal.

Excepcionalmente, não ocorre o deslocamento nas hipóteses de:

  1. Acidente do trabalho;
  2. Falência e recuperação judicial;
  3. Justiça eleitora;
  4. Justiça trabalhista.

É importante observar que o CPC esclarece que a intervenção da parte, na condição de amicus curiae (art. 138, § 1º, CPC) , não gera o deslocamento da competência.

Por fim, é interessante observar as regras de competência delimitadas pelo art. 53 do Código de Processo Civil:

Art. 53. É competente o foro:

I – para a ação de divórcio, separação, anulação de casamento e reconhecimento ou dissolução de união estável:

a) de domicílio do guardião de filho incapaz;

b) do último domicílio do casal, caso não haja filho incapaz;

c) de domicílio do réu, se nenhuma das partes residir no antigo domicílio do casal;

d) de domicílio da vítima de violência doméstica e familiar, nos termos da Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha);            (Incluída pela Lei nº 13.894, de 2019)

II – de domicílio ou residência do alimentando, para a ação em que se pedem alimentos;

III – do lugar:

a) onde está a sede, para a ação em que for ré pessoa jurídica;

b) onde se acha agência ou sucursal, quanto às obrigações que a pessoa jurídica contraiu;

c) onde exerce suas atividades, para a ação em que for ré sociedade ou associação sem personalidade jurídica;

d) onde a obrigação deve ser satisfeita, para a ação em que se lhe exigir o cumprimento;

e) de residência do idoso, para a causa que verse sobre direito previsto no respectivo estatuto;

f) da sede da serventia notarial ou de registro, para a ação de reparação de dano por ato praticado em razão do ofício;

IV – do lugar do ato ou fato para a ação:

a) de reparação de dano;

b) em que for réu administrador ou gestor de negócios alheios;

V – de domicílio do autor ou do local do fato, para a ação de reparação de dano sofrido em razão de delito ou acidente de veículos, inclusive aeronaves.

Como alterar a competência relativa?

A competência relativa poderá ser alterada em razão de:

  1. Cláusula de eleição de foro;
  2. Inércia do réu na contestação;
  3. Conexão;
  4. Continência;
  5. Conflito de competência

O art. 65 do CPC dispõe que “prorrogar-se-á a competência relativa se o réu não alegar a incompetência em preliminar de contestação“.

Portanto, a inércia da parte na contestação justifica a alteração da competência relativa, quando possível.

Observe que, no CPC de 2015, a incompetência relativa e absoluta devem ser alegas em preliminar de contestação.

Art. 64. A incompetência, absoluta ou relativa, será alegada como questão preliminar de contestação.

Por isso, inclusive, a alegação de incompetência, por si só, não suspende o processo.

Lembre-se, ainda, que, mesmo nestes casos, há situações que não autorizam a prorrogação de competência (vide comentários sobre competência em razão do valor da causa e competência territorial).

O art. 54 do CPC esclarece que “a competência relativa poderá modificar-se pela conexão ou pela continência“.

A conexão e a continência tratam de uma situação em que duas ações são similares (não iguais…).

Lembre-se que são elementos que identificam a ação as partes, a causa de pedir e o pedido.

Enquanto na litispendência e coisa julgada tem-se hipótese de ações idênticas, na conexão e continência configura-se hipótese de ações parcialmente idênticas.

Na hipótese de conexão, há causa de pedir ou pedido iguais (art. 55 do CPC).

O CPC, ainda, destaca hipótese de conexão entre ações, caso exista risco de decisão conflitante.

Trata-se da denominada conexão por prejudicialidade.

Observe o que disciplina o art. 55

art. 55 (…)

§ 3º Serão reunidos para julgamento conjunto os processos que possam gerar risco de prolação de decisões conflitantes ou contraditórias caso decididos separadamente, mesmo sem conexão entre eles.

A reunião de ações conexas, excepcionalmente, não ocorrerá para decisão conjunta, se uma dessas ações já houver sido sentenciado (art. 55, § 1º, CPC).

Na continência, todos os elementos da ação são iguais, contudo, o pedido de uma ação é maior do que da outra.

A ação que tem o pedido maior é chamada de ação continente, ao passo que a ação que tem o pedido menor é chamada de ação contida.

Neste caso, funciona assim:

  1. Ação contida é distribuída primeiro: ocorre a reunião das ações para julgamento conjunto no juízo da ação contida (juízo prevento);
  2. Ação continente é distribuída primeiro: ocorre a extinção da ação contida, mantendo-se apenas a ação continente.

Por fim, também altera a competência relativa o conflito de competência, seja ele positivo, seja ele negativo.

Bibliografia

Fernando da Fonseca Gajardoni e Outros – Comentários ao Código de Processo Civil. 2022.

Tenha acesso ao Código de Processo Civil Comentado em volume único. Essa edição traz, também, atualizações em razão da Lei nº 14.133/2021 (nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos); Lei nº 14.195/2021 (que alterou o CPC quanto à citação e à prescrição intercorrente); Lei nº 14.230/2021 (reforma da Lei 8.429/1992); Lei nº 14.289/2022 (sigilo em processos sobre a condição de portador de HIV, HBV e HCV das partes) –além de trazer julgados relevantes dos tribunais superiores.

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Alexandre Freitas Câmara. O Novo Processo Civil Brasileiro. 2022.

O autor reflete sobre todos os temas que formam o alicerce do Direito Processual Civil brasileiro a partir da Constituição Federal e do Código de Processo Civil (CPC). Dividido em duas partes, geral e especial, este livro aborda grandes temas da disciplina, desde suas normas fundamentais até o modo como se desenvolvem os processos nos tribunais

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Ivo Fernando Pereira Martins

OABSP n. 308461. Advogado graduado em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Pós-graduado em Direito pela mesma Instituição. Extensão em Mediação e Arbitragem pelo IDC (Instituto de Direito Contemporâneo). Professor de Direito. Atuou como conciliador do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Sócio administrador do escritório Martins Sociedade Individual de Advocacia. Sócio fundador do Direito Desenhado (empresa de ensino jurídico).

Qual a regra de foro geral?

O Código de Processo Civil estabelece que: → o foro geral ou comum – dá-se em razão do domicílio do réu (art. 46 CPC ) e não há regra diferenciada quanto à fixação da competência.

Qual em regra é o foro para a realização dos atos processuais?

Em regra, o lugar onde os atos processuais devem ser praticados é a sede do juízo (onde o juiz procede seu expediente).

Como saber qual é o foro competente?

Basta digitar o nome da rua (logradouro) ou o CEP na ferramenta de busca no endereço www.tjsp.jus.br/app/CompetenciaTerritorialpara localizar os foros da cidade de São Paulo. O resultado da consulta se dá exclusivamente por conceitos geográficos e não define, por si só, a competência.

Qual é a parte geral do CPC?

A Parte Geral, portanto, está subdivida conforme seus seis livros. Assim, ela trata das normas gerais do direito processual civil brasileiro, dispondo de regras aplicáveis a todos os procedimentos. Abrange, então, questões de jurisdição, competência, sujeitos e atos processuais.