É possível a progressão de regime de execução da pena fixada em sentença não transitada em julgado por meio de execução provisória da pena?

Aline Marques de Oliveira[1]

Resumo: A pena privativa de liberdade é a principal forma de punição encontrada na legislação pátria, sendo aplicada desde a primeira Constituição Brasileira. Ela é aplicada por meio da execução penal, que é o momento em que a sentença penal condenatória é de fato imposta ao indivíduo condenado. Embora prisão, via de regra, deva ocorrer após findar o processo, é possível que ela aconteça antes de haver uma sentença condenatória, mas é em caráter excepcional e cautelar, devendo está presente os requisitos determinados pela lei, de forma a evitar arbitrariedade. Em 2009, o STF no julgamento do HC nº 84.078/MG, contudo, em fevereiro de 2016, o STF, ao julgar o HC nº 126.292/SP, se posicionou em sentido contrário, permitindo a execução provisória da pena antes do trânsito em julgado. Assim, será analisado os aspectos gerais e legais da pena privativa de liberdade, igualmente da prisão cautelar, como suas espécies, e quais os efeitos que a condenação poderá causar ao condenado, e por último será analisada a decisão do STF no HC nº 126.292/SP, buscando compreender os argumentos em que os Ministros fundamentaram seus votos, frente ao que é disposto pela Constituição Federal de 1988 e a legislação penal e processual penal.

Palavras-chave: Pena privativa de liberdade. Prisão Cautelar. Efeito da Condenação. Execução Provisória da pena.

Abstract: A penalty of freedom is one of the main forms of punishment, having been applied for the first time by the Brazilian Constitution. It is applied to the means of penal execution, which is the time when a conviction penalty is actually imposed on the convicted individual. Although restricted, the attempt to be convicted should be exceptionally cautious and should be present in the balanced by law, so arbitrariness. In 2009, the STF in the judgment of HC nº 84.078 / MG, also, in February of 2016, the STF, in judging HC nº 126.292 / SP, in view of the contrary, allowing the provisional execution of the finality of the res judicata. Thus, the right to vote and the custodial sentence, as a precautionary measure, as their species, will be analyzed, and they will be condemned, and, finally, the STF decision will be analyzed in HC nº 126.292 / SP, seeking the arguments in favor of human rights and the federal legislation of 1988 and the penal criminal procedural legislation.

Keywords: Deprivation of liberty. Precautionary arrest. Provisional execution of the penalty. HC # 126.292 / SP.

Sumário: Introdução. 1. Pena de Prisão no Brasil. 2. Prisão cautelar. 2.1 Espécies de Prisão Cautelar. 2.1.1 Prisão Temporária. 2.1.2 Prisão Flagrante. 2.1.3 Prisão Preventiva. 2.2 Prisão por Sentença Penal Condenatória Recorrível. 3. Efeitos da Condenação. 4. A Execução Provisória da Pena e o STF. 4.1 Caso do HC 126.292/SP. 4.1.1 Votos Favoráveis 4.1.2 Votos Desfavoráveis.  Conclusão. Referências.

INTRODUÇÃO

A Constituição Federal está impregnada de direitos que são considerados fundamentais para o cidadão, e possuem como um dos seus principais objetivos, proteger o indivíduo do Estado, estabelecendo limites para a atuação do Poder Público.

Dentre esses direitos fundamentais, estão os direitos do réu que sempre foram alvo de inúmeros debates, seja pela doutrina, seja nos Tribunais. Dentre tais direitos, está a presunção de inocência, também denominado presunção de não culpabilidade, consagrada no art. 5º, inciso LVII, da Carta Magna de 88, que determina, em síntese, que a execução da pena só deverá iniciar após o processo trânsito em julgado.

Em contraponto, temos a execução provisória da pena, objeto de várias controvérsias justamente por propor o contrário da presunção de inocência, visto que propõe que a pena comece a ser cumprida antes do processo transitar em julgado.

Nesse embate, após o julgamento do Habeas Corpus nº 84.078/MG no Supremo Tribunal Federal, o princípio da presunção de inocência ganhou ainda mais notoriedade, visto que o referido Tribunal consagrou o entendimento no sentido de não executar a pena antes do trânsito em julgado, que até então era permitido, gerando a modificação das jurisprudências consolidadas no sentido contrário em vários tribunais.

Porém, em fevereiro de 2016, o STF retornou o debate em torno do assunto para julgar o Habeas Corpus nº 126.292/SP, e modificou mais uma vez o entendimento, determinando a possibilidade de execução da pena antes do trânsito em julgado. Diante de tal mudança surge um questionamento: existe congruência entre a decisão em torno da execução provisória da pena e o Ordenamento Jurídico Brasileiro?

Assim, ante a este questionamento, esta pesquisa justifica-se pela necessidade do estudo em torno do tema visando cooperar para solucionar esta problemática ainda discutida constantemente pela doutrina e pela jurisprudência.

Destarte, este trabalho tem como objetivo geral a pesquisa sobre a pena privativa de liberdade, suas modalidades e os efeitos que a condenação gera para o réu, compreendendo a aplicabilidade dos mesmos segundo a legislação pátria. E possui como objetivo específico a análise da decisão proferida pelo STF no julgamento do HC nº 126.292/SP que trata sobre a execução provisória da pena. Como hipóteses para o questionamento apresentado se direcionam a conformidade ou não da decisão com a Constituição.

Além disso, possui uma abordagem qualificativa, devido ao seu caráter subjetivo, se baseando em conceitos jurídicos para o real entendimento dos fundamentos abordados no julgamento do STF, para isso, será utilizado o método dedutivo, partindo da análise da instituição da prisão, e suas modalidades, no Brasil, passando pelo estudo acerco dos efeitos causados pela condenação, para alcançar a compreensão dos argumentos e fundamentos em que foi alicerçada a mudança jurisprudencial que será estudada.

Assim, no primeiro capítulo será tratado sobre a pena privativa de liberdade e seus aspectos gerais, compreendendo como se deu sua aplicação no decorrer dos anos no Brasil, assim como abordar seus conceitos e sua utilização na nossa legislação vigente.

No segundo capítulo será explanado a prisão cautelar que, em regra, é a prisão cabível para ocorrer antes do trânsito em julgado do processo, estando presentes os requisitos determinados pela lei.

Em sequência, será abordado os efeitos da condenação no terceiro capítulo, entendo quais os impactos que a prisão comumente causa, seja em de forma geral, ou de forma específica, ou seja, quando é aplicado a situações a casos pertinentes a determinadas circunstância expostas pela própria lei.

E por fim, será analisado a própria decisão do STF e os posicionamentos defendidos pelos Ministros de forma geral, observando os fundamentos dos votos favoráveis e desfavoráveis a execução provisória da pena.

1 PENA E PRISÃO NO BRASIL

Em tempos atuais muito se discute sobre a pena privativa de liberdade, e para muitos ela é considerada um mal necessário, com sua efetividade quanto a ressocialização gravemente comprometida. Hoje a pena de prisão é vista no Direito Brasileiro como o último recurso de punição do indivíduo, buscando-se ressocializar através de medidas alternativas.

O Direito Penal Brasileiro, bem como seu sistema penitenciário, foi influenciado grandemente pelos ideais iluministas de Beccaria, que trouxe importantes argumentos quanto a humanização da pena, ou seja, apenas quando houvesse disposição legal seria possível fixar penas e juiz só poderia aplicar a pena dentro dos limites legais e da proporcionalidade da pena aplicada ao crime cometido; bem como trouxe severas críticas a tortura, e reprovou a aplicação da pena de morte.

Além dele, existiram outros tantos autores que contribuíram cada vez mais para que a pena privativa de liberdade fosse plenamente adotada para a maioria das infrações no Brasil, contribuindo para houvesse uma melhora na forma de punir, sempre respeitando a dignidade da pessoa humana, sendo essa a concepção utilizada em nosso Ordenamento Jurídico.

Ao falarmos da pena de prisão, é necessário compreendermos o conceito do termo que estamos utilizando. Segundo o professor Claudio Brandão, “pena é considerada um mal porque acarreta perda de bens jurídicos; […] A pena pode ser definida como a consequência jurídica do crime, traduzida em um mal, imposto pelo 5Estado, com o fim de evitar a pratica de novos delitos. ” (2010, p. 316).

Mougenot (2010) leciona que a prisão é dividida em duas espécies, sendo elas a prisão-pena aquela que sucede em razão de uma sentença condenatória transitada em julgado aplicando a pena privativa de liberdade; e a prisão sem pena é aquela que não sucede de uma decisão condenatória transitada em julgado, e, portanto, não consiste na pena propriamente dita. A doutrina divide a prisão sem pena em quatro categorias: a prisão administrativa, a prisão civil, a prisão disciplinar e a prisão processual, sendo esta última tratada neste trabalho.

A pena privativa de liberdade está presente no Direito Pátrio desde a Constituição do Império, outorgada em 1824 por D. Pedro I, consagrando também princípios como o da irretroatividade da pena, da pessoalidade da pena, da proporcionalidade, etc., conforme exposto no art. 179, a partir do inciso XI,

“Art. 179, XI. Ninguem será sentenciado, senão pela Autoridade competente, por virtude de Lei anterior, e na fórma por ella prescripta.

XIII. A Lei será igual para todos, quer proteja, quer castigue, o recompensará em proporção dos merecimentos de cada um.

XIX. Desde já ficam abolidos os açoites, a tortura, a marca de ferro quente, e todas as mais penas crueis.

  1. Nenhuma pena passará da pessoa do delinquente. Por tanto não haverá em caso algum confiscação de bens, nem a infamia do Réo se transmittirá aos parentes em qualquer gráo, que seja.

XXI. As Cadêas serão seguras, limpas, o bem arejadas, havendo diversas casas para separação dos Réos, conforme suas circumstancias, e natureza dos seus crimes” (BRASIL, 1824).

Portanto, fica claro que ainda no período Imperial a pena privativa de liberdade já era a principal forma de punição, sendo vedada as penas corporais. Esse artigo engloba direitos dos condenados, sendo possível vislumbrar a grande influência do Iluminismo Penal que predominou no Século XXVIII, e alguns deles estão presentes no nosso Ordenamento Jurídico até os dias atuais.

Apesar da influência de Beccaria que condenava a pena de morte, o Brasil, em 1830 instituiu o Código Criminal, porém, ainda sim é notável a presença do constratualismo, característica do Iluminismo no Código (ZAFFARONI; PIERANGELI, 2011). Com o declínio do imperialismo, foi instituído um novo Código Penal, em 1890, e este aboliu a pena de morte, passando a adotar a pena de prisão como regra, regulando-a por meio do sistema progressivo, conforme demonstra o art.50 do referido Código, “O condemnado a prisão cellular por tempo excedente de seis annos e que houver cumprido metade da pena, mostrando bom comportamento, poderá ser transferido para alguma penitenciaria agricola, afim de ahi cumprir o restante da pena.”.

Em 1940 foi criado o atual Código Penal, responsável por trazer uma série de novos princípios, mas manteve a pena de prisão como regra, assim como manteve o sistema progressivo, apesar de ter sido criado durante uma ditadura, porém os doutrinadores Zaffaroni e Pierangeli (idem, p. 199-200) o definem como

“Um código rigoroso, rígido, autoritário no seu cunho ideológico, impregnado de “medidas de segurança” pós-delituosas, que operavam através do sistema do “duplo binário”, ou da “dupla via”. Através deste sistema de “medidas” e da supressão de toda norma reguladora da pena no concurso real, chegava-se a burlar, dessa forma, a proibição constitucional da pena perpétua. Seu texto corresponde a um “tecnicismo jurídico” autoritário que, com a combinação de penas retributivas e medidas de segurança indeterminadas (própria do Código Rocco), desemboca numa clara deterioração da segurança jurídica e converte-se num instrumento de neutralização de “indesejáveis”, pela simples deterioração provocada pela institucionalização idemasiadamente prolongada.”

Apesar de ainda vigente, Código Penal de 1940 passou por grande reforma em 1984 numa tentativa de atualizá-lo ao direito corrente à época, modificando principalmente a parte geral, e foi sistematizado de forma mais de acordo com a evolução dos Direitos Humanos que ocorreram desde o fim da Segunda Guerra, “o neo idealismo autoritário desaparece do texto, […] Retoma-se um direito penal de culpabilidade ao erradicar as medidas de segurança do Código Rocco e ao diminuir, consideravelmente, os efeitos da reincidência.” (ZAFFARONI; PIERANGELI, 2011, p. 201-202).

Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, houve um grande avanço na proteção dos direitos humanos, consagrando a liberdade como regra, e a prisão uma exceção, e “mesmo após a condenação passada em julgado, a prisão eventualmente aplicada não será perpétua, isto é, sempre será provisória. ” (PACELLI, 2014, p. 496), é o que determina o art. 5º, LXI, ao afirmar que a prisão só ocorrerá por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo em caso de flagrante.

Além disso, instituiu como premissa o princípio da presunção de inocência, de acordo com o art. 5º, LVII, que dispõe “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória; ”. Assim sendo, a pena privativa de liberdade, via de regra, só será aplicada em último caso.

Até o trânsito em julgado da sentença condenatória, o réu tem o direito público subjetivo de não ostentar o status de condenado.

Trata-se de uma projeção dos princípios do devido processo legal, da dignidade da pessoa humana, do Estado Democrático de Direito, do contraditório, da ampla defesa, do favor libertatis, do in dubio pro reu e da nulla poena sine culpa.

Somente quando a situação originária do processo for, definitivamente, resolvida é que se poderá inscrever, ou não, o indivíduo no rol dos culpados, porque existe a presunção relativa, ou juris tantum, da não culpabilidade daqueles que figuram como réus nos processos penais condenatórios. (BULOS, 2014, p. 714)

Ante ao exposto, é incontestável que trata-se de uma garantia constitucional processual de que até o final do processo, isto é, até o trânsito em julgado, ninguém poderá ser visto como culpado, portanto, implica àqueles que acusam o dever de provar a culpa do indivíduo que estiver sendo acusado, caso contrário, não havendo provas suficientes, não se pode presumir a culpa, devendo o juiz absolver o acusado. (MOUGENOT, 2012)

Analisando ainda o texto constitucional, o art. 5º, inciso LXI, conclui-se que a pena privativa de liberdade se divide em duas modalidades: prisão em flagrante (cautelar) e prisão por sentença penal condenatória transitada em julgado. Porém, a prisão em flagrante é apenas uma das espécies de prisão cautelar, sendo possível outras espécies que serão tratadas adiante.

Seguindo o que foi preceituado pela Carta Magna, o Código Penal determina em seu art. 32, inciso I, que a pena privativa de liberdade pode ser aplicada de duas formas: a reclusão e a detenção, conforme exposto no art. 33-A da legislação supracitada, e dele é possível extrair que a reclusão é a pena de prisão aplicada a punição dos delitos de maior gravidade, uma vez impõe ao condenado, inicialmente, o regime mais severo, enquanto na detenção é o contrário, se aplica para situações menos gravosas, e em início no regime menos severo, embora seja possível a regressão. (BITENCOURT, 2012)

Apesar de ainda vigente, Código Penal de 1940 passou por grande reforma em 1984 numa tentativa de atualizá-lo ao direito corrente à época, modificando principalmente a parte geral, e foi sistematizado de forma mais de acordo com a evolução dos Direitos Humanos que ocorreram desde o fim da Segunda Guerra, “o neo idealismo autoritário desaparece do texto, […] Retoma-se um direito penal de culpabilidade ao erradicar as medidas de segurança do Código Rocco e ao diminuir, consideravelmente, os efeitos da reincidência.” (ZAFFARONI; PIERANGELI, 2011, p. 201-202).

A reforma no Código Penal manteve o sistema progressista adotado desde a origem da referida legislação, de forma que foi mantida concepção de que a pena de prisão deverá ser cumprida de acordo com os regimes aplicados a cada situação. Os regimes estão expostos no art. 33-A, §1º do CP, sendo eles fechado, semiaberto e aberto, e são “determinados pelo mérito do condenado e, em sua fase inicial, pela quantidade da pena imposta e pela reincidência. ” (MIRABETE, FABBRINI, 2007, p. 256)

“O regime fechado será executado em estabelecimento de segurança máxia ou média; o semi-aberto será executado em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar; e, finalmente, o regime aberto será cumprido em casa de albergado ou em estabelecimento adequado” (BITENCOURT, 2009, p. 482).

Também dentro do sistema progressista, foi instituído o limite máximo de 30 (trinta) anos para o cumprimento da pena privativa de liberdade, conforme dispõe o art. 75, caput, do CP, “O tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a 30 (trinta) anos.”. Portanto, ainda que o indivíduo tenha sido condenado em vários processos e que unificando as penas some mais de 30 (trinta) anos, ainda sim, ele não poderá mais tempo recolhido.

Compreendido em linhas gerais a forma de aplicação da pena de prisão em nosso país e alguns de seus limites, sabemos que via de regra vigora a liberdade e o princípio da presunção de inocência, porém, a Constituição permite a que haja a prisão provisória, ou seja, antes do trânsito em julgado da sentença condenatória, desde que cumpridos os requisitos estabelecidos em lei, contudo, ela é exceção.

2 PRISÃO CAUTELAR

A Carta Magna de 1988 consolidou a liberdade como um direito fundamental, bem como consagrou o princípio da presunção de inocência, de forma que determina que “o réu aguarde o transcurso do processo em liberdade. ” (MOUGENOT, 2010, p. 533). Contudo, há casos em que é necessário a determinação da prisão antes da sentença condenatória ou do transito em julgado da mesma, buscando a segurança da sociedade, ou ainda, para que o processo possa prosseguir sem interferência.

A prisão cautelar ou provisória está presente no Ordenamento Jurídico Brasileiro desde antes da Independência do Brasil, porém sofreu várias modificações quanto a sua aplicação ao longo dos anos. Atualmente a prisão cautelar é compreendida pela doutrina e pela jurisprudência como a “[…] prisão processual, ou seja, a prisão que pode ocorrer durante a fase processual, antes da condenação transitar em julgado. ” (BITENCOURT, 2007, p. 502)

Portanto, em tese, qualquer prisão que ocorre antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, uma vez que a sentença ainda é passível de modificação através dos recursos cabíveis diante do caso concreto. O seu caráter cautelar decorre da necessidade de proteger a coletividade, bem como, proteger o andamento do processo (MOUGENOT, 2012).

Conforme mencionado, o instituto da prisão cautelar está presente no Direito Pátrio há bastante tempo, é possível verificar o tratamento sobre a prisão preventiva, espécie de prisão cautelar, nas Ordenações Manuelinas, que foram aplicadas no Brasil por deliberação de D. Manoel I durante o período colonial.

Com a Independência do Brasil em 1822, e por consequência, com o advento da primeira Constituição do Brasil, outorgada em 1824, houve uma preocupação do constituinte em disciplinar acerca do tema, por isso o art. 179, a partir VIII, da Carta Magna, dispõe que,

“VIII. Ninguem poderá ser preso sem culpa formada, excepto nos casos declarados na Lei; e nestes dentro de vinte e quatro horas contadas da entrada na prisão, sendo em Cidades, Villas, ou outras Povoações proximas aos logares da residencia do Juiz; e nos logares remotos dentro de um prazo razoavel, que a Lei marcará, attenta a extensão do territorio, o Juiz por uma Nota, por elle assignada, fará constar ao Réo o motivo da prisão, os nomes do seu accusador, e os das testermunhas, havendo-as.

  1. Ainda com culpa formada, ninguem será conduzido á prisão, ou nella conservado estando já preso, se prestar fiança idonea, nos casos, que a Lei a admitte: e em geral nos crimes, que não tiverem maior pena, do que a de seis mezes de prisão, ou desterro para fóra da Comarca, poderá o Réo livrar-se solto.
  2. A’ excepção de flagrante delicto, a prisão não póde ser executada, senão por ordem escripta da Autoridade legitima. Se esta fôr arbitraria, o Juiz, que a deu, e quem a tiver requerido serão punidos com as penas, que a Lei determinar” (BRASIL, 1824).

Vislumbra-se neste artigo o princípio da prisão cautela no Brasil, sendo possível verificar a possibilidade da prisão em flagrante de forma parecida com a que é aplicada hoje, além de outras garantias que protegiam o acusado de atos arbitrários por parte do Poder Público.

Contudo, foi durante o Estado Novo (1937 – 1945) que houve um grande avanço na matéria penal, uma vez que foi neste período que foram criados o Código Penal, já citado, e o Código de Processo Penal. Convém ressaltar que o “[…] Estado Novo se constitui nas bases do autoritarismo e do terror policial, reforçando as práticas e ideologias de controle social instauradas pelo regime escravocrata, mas agora com feições republicanas e constitucionais, feições estas, meramente decorativas uma vez que do que se tratava era de verdadeira autocracia de exceção” (PATTO, 2017, p. 07).

Com base no autoritarismo mencionado por Belmiro J. Patto, o Código de Processo Penal de 1941 intensificou a aplicabilidade das prisões cautelares, principalmente no que diz respeito a prisão preventiva, ampliando as hipóteses de sua aplicabilidade, criando inclusive uma forma de utilização obrigatória.

Na Exposição dos Motivos do CPP, o Ministro da Justiça e Negócios Interiores, Francisco Campos expõe que “É restringida a aplicação do in dubio pro reo. É ampliada a noção do flagrante delito, para o efeito da prisão provisória. A decretação da prisão preventiva, que, em certos casos, deixa de ser uma faculdade, para ser um dever imposto ao juiz, adquire a suficiente elasticidade para tornar‐se medida plenamente assecuratória da efetivação da justiça penal” (SARAIVA, 2017, p. 589).

Diante disso, é óbvio que o CPP foi uma ferramenta de opressão criada durante a ditadura para cooperar com o domínio do Poder Público sobre os indivíduos, restringindo, inclusive, garantias fundamentais, de formar a reprimir ideias e manifestações contrárias a Governo.

Mesmo com o declínio do Estado Novo e com a promulgação de uma nova Constituição em 1946 baseada em princípios democráticos que ascenderam com o fim da Segunda Guerra Mundial, o Código de Processo Penal resistiu, e tem resistido, ao longo dos anos.

2.1.  Espécies de Prisão Cautelar

A prisão cautelar foi dividida em três espécies no Ordenamento Jurídico Brasileiro, de acordo com a sua aplicação no caso concreto, são elas: a prisão preventiva, a prisão temporária e a prisão em flagrante. “Por não constituir antecipação de pena, uma vez que inexiste trânsito em julgado de condenação, toda e qualquer prisão cautelar exige a presença dos seguintes requisitos: indícios suficientes de autoria ou participação – o fumus boni iuris; e existência de risco social ou processual – periculum libertatis, que nada mais é do a cautelaridade” (MOUGENOT, 2010, p. 533).

Portanto, para que não haja arbitrariedade na aplicação das prisões cautelares, faz-se necessário a presença dos requisitos da fumaça do bom direito e do perigo da liberdade do acusado, independentemente da prisão cautelar que se está aplicando. Porém, as espécies de prisão cautelar são aplicadas em diferentes situações, possuindo requisitos próprios, bem como tempo determinado para a sua aplicação.

  • Prisão Temporária

A prisão temporária é caracterizada por sua finalidade específica de garantir o êxito do inquérito policial. “Trata-se de modalidade de prisão cautelar, específica para o inquérito policial, que tem por finalidade permitir a investigação de crimes particularmente graves. ” (MOUGENOT, 2012, p. 671). Ao contrário das demais prisões cautelares, está disciplinada em uma lei específica, a Lei n. 7960/89, que em seu art. 1º,

“Art. 1° Caberá prisão temporária:

I – quando imprescindível para as investigações do inquérito policial;

II – quando o indicado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos necessários ao esclarecimento de sua identidade;

III – quando houver fundadas razões, de acordo com qualquer prova admitida na legislação penal, de autoria ou participação do indiciado nos seguintes crimes: a) homicídio doloso; b) sequestro ou cárcere privado; c) roubo; d) extorsão; e) extorsão mediante; f) estupro; g) atentado violento ao pudor; h) rapto violento; i) epidemia com resultado de morte; j) envenenamento de água potável ou substância alimentícia ou medicinal qualificado pela morte; l) quadrilha ou bando; m) genocídio, em qualquer de suas formas típicas; n) tráfico de drogas; o) crimes contra o sistema financeiro; p) crimes previstos na Lei de Terrorismo” (BRASIL, 1989).

Assim sendo, a prisão temporária só poderá ser aplicada quando estiverem presentes na situação esses requisitos. Através da leitura do presente artigo, nota-se que são exigências de cunho protetivo da própria investigação, se aplicando em situações muito específicas e taxativas, evitando a impossibilidade da mesma em virtude de atos do acusado que possam prejudicar de alguma forma

.           Existe uma divergência doutrinária quanto a aplicação dos requisitos para a decretação da prisão temporária. Há doutrinadores, que defendem que só com a presença das três situações expostas no artigo citado acima, concomitantemente, poderá ser decretada a prisão temporária, contudo, há outros que entendem                                                                                                                                                                                                                        que basta apenas uma das situações, ou seja, não é necessário cumular os requisitos (CAPEZ, 2016). Para Nucci (2015, p. 531) “[…] não se pode decretar a temporária somente porque o inciso I foi preenchido, pois isso implicaria viabilizar a prisão para qualquer delito, inclusive os de menor potencial ofensivo, desde que fosse imprescindível para a investigação policial, o que soa despropositado. ”. Já Pacelli (2014), defende que seria necessário a presença dos incisos I e III para que seja decretada a prisão temporária, pois para ele o inciso II já estaria inserido no inciso primeiro, uma vez que a ausência de residência fixa ou dúvidas quanto a identidade do acusado comprometeria as investigações.

Convém lembrar que apesar do rol de delitos disposto no inciso III do art. 1º da Lei n. 7960/89 é taxativo, porém não é o único, uma vez que também será possível decretar a prisão temporária nos casos de crimes hediondos e equiparados, por força do art. 2º, §4º da Lei n. 8072/90.

Considerando sua natureza provisória, possui dois prazos, conforme ensina Mougenot (2012), o prazo de 5 (cinco) dias, disposto no art. 2º, caput, da Lei n. 7960/89, adotado para as situações e delitos previsto no art. 1º da referida lei, sendo possível a prorrogação deste prazo uma única vez por igual período, desde que demonstrada e fundamentada a necessidade. Ainda há o prazo de 30 (trinta) dias, porém este só será aplicado nos casos de crimes hediondos, tráfico de drogas e terrorismo, podendo o prazo ser prorrogado por igual período, devendo está presente os mesmos requisitos citados anteriormente.

A prisão temporária poderá ser requerida pela autoridade policial ou pelo Ministério Público, não podendo o juiz decretá-la de ofício. Aquele que for preso temporariamente deverá ser posto em local diferenciado dos outros detentos, conforme o art. 3º da Lei n. 7960/89. Após decorrido o prazo, o preso deverá ser colocado em liberdade, exceto se houver decretação da prisão preventiva, não sendo necessário que seja expedido um Alvará de Soltura.

  • Prisão Flagrante

De Plácido e Silva (2012, p. 291) define flagrante como aquilo que “é claro, o que é evidente ou aparente”. Diante de tal definição fica claro que a prisão em flagrante tem uma natureza cautelar, pois é aquela que acontece no momento da prática do delito, e por isso o art. 5º, LXI, da Carta Magna autoriza esta modalidade de prisão, sem a necessidade de que seja expedido um mandado de prisão pelo juiz competente, dada a urgência da situação (NUCCI, 2015).

Uma vez que não precisa ser determinada pela autoridade judiciária, a prisão em flagrante deve estar em conformidade com os preceitos legais expostos no Código de Processo Penal, para que não haja abusos. Assim sendo, o art. 302 do CPP determina que:

“Art. 302.  Considera-se em flagrante delito quem:

 I – está cometendo a infração penal

II – acaba de cometê-la;

III – é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração;

IV – é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração” (BRASIL, 1941).

Diante do artigo acima exposto, sabe-se que o flagrante não se trata apenas do momento do delito, podendo se estender para momentos posteriores ao delito, desde que com eles interligados. Considerando o exposto, a doutrina e a jurisprudência classificaram o flagrante de acordo com as situações em que ocorrem, e estas classificações serão tratadas a seguir.

A primeira classificação é chamada de flagrante próprio, perfeito ou propriamente dito, e está presente nos incisos I e II do art. 302 do CPP. O inciso I trata do exato momento em que o crime está acontecendo.

“Nessa situação, havendo a intervenção de alguém, impede-se o prosseguimento da execução, redundando, muitas vezes, em tentativa. Mas, não é raro que, no caso de crime permanente cuja consumação se prolonga no tempo, a efetivação da prisão ocorra para impedir, apenas, o prosseguimento do delito já consumado” (NUCCI, 2015, p. 537-538).

E inciso II trata da hipótese do delito já consumado, porém, o agente precisa ter sido encontrado logo após ter cometido o crime, não pode haver espaço de tempo entre a conduta, de forma que não deixe dúvidas sobre a autoria do delito. “Embora consumado o delito, não se desligou o agente da cena […]. A hipótese não se subsume o autor que consegue afastar-se da vítima e do lugar do delito, sem que tenha sido detido. ” (Idem Ibidem, p. 538)

A segunda classificação é denominada flagrante impróprio ou imperfeito, e está disposto no art. 302, inciso III, do CPP, o qual traz o termo “logo após”, exigindo como requisito para que seja enquadrado como flagrante que a perseguição seja imediata, portanto, não há nenhuma regra legalmente constituída que determine e explique o termo “logo após”, de forma que sua determinação ocorrer de acordo com o caso concreto. Porém, Fernando Capez alerta que não há “[…] qualquer fundamento a regra popular de que é de vinte e quatro horas o prazo entre a hora do crime e a prisão em flagrante, pois, no caso do flagrante impróprio, a perseguição pode levar até dias, desde que ininterrupta. ” (2016, p. 353). Além disso, o dispositivo legal dispõe que o autor deve ser encontrado em uma situação que faça presumir que ele é o infrator.

Ainda quanto ao flagrante impróprio, o inciso II ainda utiliza a expressão “situação que faça presumir ser ele o autor da infração”, e da mesma forma que o termo “logo após”, não há no Ordenamento Jurídico pátrio qualquer definição para esse termo, somente diante de um caso concreto será possível a definição.

A terceira classificação é o flagrante presumido, o inciso IV do art. 302 do CPP dispõe a respeito, e para muitos doutrinadores é uma modalidade de flagrante impróprio ou imperfeito, visto que utiliza-se do mesmo requisito de imediatidade, com o termo “logo depois”, porém o indivíduo deve está portando instrumentos que demonstrem que ele é o autor da infração.

“A regra de experiência nos indica que, para que haja encontro do acusado, deve haver a anterior perseguição. Do contrário (e como parece ser), a lei estaria se referindo ao encontro casual, fortuito, entro o aprisionado e a autoridade policial ou qualquer pessoa do povo, uma vez que tratando-se de flagrante, toda pessoa está autorizada a realizar a prisão. Assim, desde que o encontro ocorresse logo depois da prática do crime, tanto bastaria para estar caracterizada a situação de flagrante” (PACELLI, 2014, p. 534).

Existe ainda uma quarta uma classificação, chamado flagrante preparado ou provocado, trata-se da situação em que o indivíduo é instigado por algum agente a cometer o delito, de forma que o agente que o instigou consiga prendê-lo em flagrante. Todavia, segundo a Súmula n. 145 do Supremo Tribunal Federal, que dispõe: “Não há crime, quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação. ”, este tipo de flagrante não é permitido. Alguns doutrinadores expõem que, uma vez que súmula refere-se apenas a polícia, então seria possível um particular instigar a ocorrência do delito, entretanto, esse entendimento não é pacificado (NUCCI, 2015).

O flagrante preparado ou provocado se difere do flagrante esperado, outra classificação de flagrante, pois neste último ocorre quando a polícia tem a ciência de que um delito acontecerá, e diante dessa informação, desloca-se ao local e espera que a infração ocorra para efetuar a prisão em flagrante, sendo isto permitido pela lei.

Em caso de crimes permanentes são aqueles em que “[…] a consumação se prolonga no tempo, dependente da ação do sujeito ativo” (MIRABETE E FABBRINI, 2007, p. 118), dessa maneira, a prisão em flagrante poderá ocorrer a qualquer instante.

Já no caso de crime habitual, que é aquele, segundo Mirabete e Fabbrini “[…] constituído de uma reiteração de atos, penalmente indiferentes de per si, que constituem um todo, um delito apenas […]. Embora a prática de um ato apenas não seja típica, o conjunto de vários, praticados com habitualidade, configurará o crime. ” (2007, p. 122), se difere o crime permanente, pois, em tese, não cabe a prisão em flagrante, uma vez que as condutas, separadamente, não constituem infração. Porém, parte da doutrina defende que se a autoridade policial tiver ciência e provas dos atos habituais, será possível efetuar o flagrante em qualquer um deles (CAPEZ, 2016).

É necessário lembrar que o polo ativo da prisão em flagrante pode ser ocupado por qualquer pessoa, seja particular ou uma autoridade, conforme estipula o art. 301 do CPP: “Qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito”. Portanto, compreende-se que qualquer cidadão tem a faculdade, a escolha, de efetuar a prisão, porém, os policiais têm o dever de realizar a prisão, podendo vir a responder por omissão caso não realize a mesma (TOURINHO FILHO, 2013). Quanto ao polo passivo, o artigo supracitado utiliza o termo “quem quer que seja”, assim sendo, qualquer pessoa poderá ser presa em flagrante. Contudo, existem algumas exceções, em virtude de cargos ocupados.

O art. 304 do CPP determina que após a prisão em flagrante, o indivíduo deverá ser apresentado em uma Delegacia de Polícia, onde deverá ser ouvido aquele que efetuou a prisão, bem como as possíveis testemunhas, e caso não haja testemunhas, o §2º do referido artigo permite que ainda sim seja lavrado o auto de prisão em flagrante, desde que conste a assinatura do condutor e de duas pessoas que tenham testemunhado o momento da apresentação a autoridade policial.

Existem algumas divergências na doutrina quanto a autoridade policial relaxar a prisão, Nucci (2015) defende que o art. 304, §1º do CPP deixa margem para a discricionariedade da autoridade, porém ela está sujeita a lei, ou seja, a autoridade policial cabe apurar os detalhes da situação que envolve o delito, para que haja certeza de que o indivíduo apresentado é de fato o culpado, ou se a situação possui alguma excludente de ilicitude, nestes casos, a autoridade policial, poderá deixar de lavrar o auto de prisão em flagrante, relaxando a prisão, e posteriormente, informar ao Juiz competente.

Após ser lavrado o auto, o mesmo deverá ser encaminhado para o Juiz competente, e este terá o prazo de 24 horas para: relaxar a prisão, quando ilegal; ou conceder a liberdade provisória com ou sem fiança; ou ainda converter o flagrante em prisão preventiva, conforme o art. 310 do CPP. Independente da medida que o Juiz adote, qualquer uma deverá ser fundamentada.

  • Prisão Preventiva

Assim como as anteriores, a prisão preventiva é uma prisão cautelar, e por consequência possui uma natureza provisória, devendo ser observados os requisitos dispostos na lei para que sua aplicação. Mougenot (2012, p. 656) conceitua da seguinte forma:

“Prisão preventiva é a modalidade de prisão provisória, decretada pelo juiz a requerimento de qualquer das partes, por representação do delegado de polícia ou de ofício, em qualquer momento da persecução penal, para garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal.”

A prisão preventiva está prevista a partir do art. 311 do CPP, e sua aplicação pode ser decretada de ofício pelo juiz competente, desde que durante a investigação ou ação penal; ou a requerimento do querelante, ou assistente, ou do Ministério Público; ou ainda através de representação da autoridade policial.

“[…] raríssima a decretação da prisão preventiva durante a fase da investigação policial, sendo por vezes incompreensível que o juiz o faça. Existe, como medida cautelar mais adequada, a prisão temporária, indicada justamente para os crimes mais graves, a demandar a segregação cautelar do investigado. Se não cabe, por exemplo, prisão temporária para o caso de furto, porque a Lei 7.960/89 não o arrola dentre os delitos que comportam a medida (art. 1.º, III), teria sentido decretar a prisão preventiva? Somente em caráter excepcional, como poderia ocorrer em se tratando de indiciado com inúmeros antecedentes e imputação da prática de vários furtos, não merecedor da liberdade, pois coloca em risco a ordem pública. Mas, essa situação, repita-se, é rara, de modo que a preventiva se tornou escassa durante a fase do inquérito” (NUCCI, 2015, 578)

Contudo, para que seja decretada é necessário que estejam presentes os requisitos dispostos no art. 312 do CPP, são eles: a prova da existência do crime e indício de autoria. Esses requisitos são cumulativos, portanto, devem estar presentes concomitantemente no caso concreto. A prova da existência do crime trata-se da materialidade, dessa forma, devem existir fundamentação material evidentes. Já os indícios de autoria são as informações, bem como as provas, que comprovam de maneira convincente, ainda que de forma superficial, a autoria do delito. Tais requisitos correspondem ao fumus boni iuris (MOUGENOT, 2012).

Porém, eles não são os únicos requisitos, o art. 312 do CPP ainda traz a exigência de que para que seja decretada a prisão preventiva, que se tenha como objetivo a garantia da ordem pública ou da ordem econômica; ou por conveniência da instrução criminal; ou ainda para assegurar a aplicação da lei pena, e estes correspondem ao periculum in mora.

A garantia da ordem pública versa sobre a necessidade de manter a ordem na sociedade, sendo esta suprida por meio da retirada do indivíduo que está sendo acusado pelo delito do convívio de todos. Porém, existem algumas divergências, pois tal conceito não está plenamente pacificado.

“Há entendimentos no sentido de se aferir o risco à ordem pública a partir unicamente da gravidade do crime praticado, a reclamar uma providência imediata por parte das autoridades, até mesmo para evitar o mencionado sentimento de intranquilidade coletiva que pode ocorrer em tais situações.

Mas o argumento, quase incontornável, contrário a semelhante modalidade de prisão, é no sentido de que estaria violado o princípio da inocência, já que, quer se pretenda fundamentar a prisão preventiva para a garantia da ordem pública em razão do risco de novas infrações penas, quer se sustente a sua justificação em razão da intranquilidade causada pelo crime (aqui acrescido de sua gravidade), de uma maneira ou de outra, estar-se partindo de uma antecipação de culpabilidade. Como se percebe, a questão é bastante complexa” (PACELLI, 2014, p. 556-557)

Alguns doutrinadores entendem que não cabe a prisão preventiva caso o indivíduo acusado de cometer o delito esteja sendo alvo de retaliação por parte da população, com a justificativa que é dever do Estado a proteção, porém, ainda que haja fundamento nesta justificativa, o meio cautelar aqui discutido não é a medida correta para isso.

Já a garantia da ordem econômica, em muito se parece com a anterior, se diferencia apenas por se aplicar a crimes que trazem prejuízos financeiros, de forma que a decretação da prisão preventiva visa evitar outros danos, e consequentemente a sensação de impunidade (MOUGENOT, 2012).

A conveniência da instrução criminal trata da fase do andamento processual, na qual será de aplicada a prisão cautelar, na modalidade preventiva, quando o acusado estiver impedindo ou perturbando o andamento do processo, seja ameaçando as testemunhas, seja influenciando nas provas, etc. (TOURINHO FILHO, 2013).

E ainda para assegurar a aplicação da lei penal, ou seja, para garantir que o indivíduo responsável por cometer determinada infração responda penalmente por tal ato, e que o Estado possa puni-lo conforme está estabelecido em lei. Conforme leciona Mougenot (2012, p. 660), “nesse caso, a prisão cautelar faz-se necessária em nome da efetividade do processo penal, assegurando que o acusado estará presente para cumprir a pena que lhe for imposta.”.

O parágrafo único do art. 312 do CPP traz outro objetivo para a prisão preventiva, além dos que já estão dispostos no caput do artigo, que é quando se tratar de descumprimento de medida cautelar, contudo, a prisão preventiva neste caso só tem uma natureza subsidiária, uma vez que é possível aplicar outra medida cautelar presente no art. 319 do CPP.

Quanto as hipóteses de cabimento da prisão preventiva, suprido os requisitos, ela caberá, conforme o art. 313 do CPP, no caso de crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos, assim sendo, não cabe prisão preventiva em crimes culposos ou em contravenções; no caso do indivíduo tenha sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto art. 64, I do Código Penal, ou seja, para que caiba a prisão preventiva será preciso que ele já possua uma condenação por crime doloso transitada em julgado, não tendo decorrido 5 (cinco) anos desta condenação, e que a atual condenação também seja por crime doloso; no caso do crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência, portanto, neste caso caberá prisão preventiva contra crimes de violência doméstica, pois muitas vezes a proteção da vítima está sujeita a distância daquele que cometeu o crime.

Diferente das prisões cautelares anteriores, a prisão preventiva não possui tempo estabelecido por lei de duração, pois entende-se que ela deve perdurar enquanto perdurar o processo e/ou a situação fática que a gerou.

2.2.        Prisão Por Sentença Penal Condenatória Recorrível

A modalidade de prisão aqui tratada é defendida por alguns autores como uma prisão de natureza cautelar, visto que ainda é possível que haja modificação da pena, porém outros entendem que não há natureza cautelar, e sim satisfativa, uma vez que a sentença condenatória estaria sendo aplicada, embora ainda seja possível sua a alteração da sentença.

Embora estejamos tratando com o termo “sentença”, a discussão sobre o tema não se restringe a decisão condenatória pelo Juiz de 1º Grau, sendo mantida no que diz respeito aos acórdãos proferidos em 2º Grau.

O art. 387, §1º, do CPP, determina que na sentença o juiz poderá, se necessário, decretar a prisão preventiva ou alguma medida cautelar diversa, porém o CPP não cita como uma antecipação do cumprimento da pena, sendo claro no sentido de que o juiz só poderá decretar a prisão se preciso for, ou ainda, poderá mantê-la, caso tenha sido decretada antes da decisão condenatória. Ainda que a decisão condenatória seja contestada através da interposição do recurso de apelação, isto não afetará a prisão cautelar que tenha sido decretada ou mantida no momento da sentença condenatória. Embora o a legislação processual penal determine expressamente a natureza cautelar da prisão antes do trânsito em julgado, ainda há divergências por parte dos doutrinadores, conforme já mencionado.

Porém, recentemente o Supremo Tribunal Federal adotou um novo posicionamento, estabelecendo que após a decisão condenatória de segundo grau, poderá ser determinada a antecipação do cumprimento da pena, conforme expresso no julgamento do Habeas Corpus 126292/SP, “A execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência.”. (STF. Plenário. HC 126292/SP, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 17/02/2016).

Assim sendo, o indivíduo que for recolhido a um estabelecimento prisional adequado para sua situação processual, estando sujeito aos efeitos da condenação que estão dispostos no art. 91 e 92 do CP e que vão além da esfera penal, gerando consequências em outras esferas do direito, como civil e trabalhista.

  1. EFEITOS DA CONDENAÇÃO

Os efeitos da condenação, segundo Nucci (2014, p. 508), “são efeitos secundários ou acessórios a sentença”. O art. 91 do Código Penal estabelece os efeitos genéricos da condenação, são eles:

“Art. 91 – São efeitos da condenação:

 I – tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime;

II – a perda em favor da União, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé:

  1. a) dos instrumentos do crime, desde que consistam em coisas cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito;
  2. b) do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente com a prática do fato criminoso” (BRASIL, 1940).

A doutrina entende que tais efeitos exibidos no art. 91 são extrapenais, pois incide principalmente no âmbito civil, e são considerados genéricos pois são aplicáveis obrigatoriamente. O inciso I determina a obrigação de reparar o dano que o crime gerar, tal preceito também está disposto nos arts.186 e 927 do Código Civil, e é imediato no nosso Ordenamento Jurídico, ou seja, comprovada a culpa do indivíduo que gerou dano a outrem, então aquele terá o dever de restaura, independentemente do juiz responsável pela condenação se manifestar explicitamente a respeito (NUCCI, 2014).

Transitada em julgado a sentença condenatória e morrendo o condenado, a execução civil será promovida contra seus herdeiros, nas forças da herança, em decorrência do princípio da responsabilidade civil (art. 943 do CC e art. 5º, XLV, da CF/88). Aliás, a extinção da punibilidade por qualquer causa, após o trânsito em julgado da sentença condenatória, não exclui seu efeito secundário de obrigar o sujeito à reparação do dano (art. 67, inciso II, do CPP). (MIRABETE, FABBRINI, 2007, p. 357-358)

O inciso II trata de um efeito da condenação de confisco por parte da União dos instrumentos do crime, quando ilícitos sua fabricação, ou sua transmissão, ou seu porte, ou ainda sua detenção; e dos produtos do delito ou ainda de qualquer bem ou valor que tenha sido obtido na prática do crime.

No conceito de instrumentos estão inclusos todas os materiais utilizados, desde que ilícitos. Rogério Greco (2015) traz como exemplo a pessoa que utiliza-se de um carro, de formar dolosa, para lesionar alguém, neste caso, o carro é um objeto completamente lícito, portanto, não caberia o confisco pela União.

“Ressalve-se, ainda, como determinado pelo inc. II do art. 91 do Código Penal, o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé, que não poderá ter seus instrumentos perdidos caso venham a ser utilizados indevidamente pelo agente condenado pela prática da infração penal, desde que não consistam em coisas cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito, bem como que não ocorra qualquer das modalidades de concurso de pessoas, vale dizer, a coautoria ou a participação” (GRECO, 2017, p. 389).

Quanto aos produtos do delito, são os objetos, bens ou valores adquiridos através do delito, por isso, para que haja o confisco é necessário a comprovação de que de fato o objeto ou o valor foi adquirido por meio ilícito.

O art. 92 do CP traz os efeitos da condenação específicos, que são aqueles que precisam que o juiz responsável pela sentença condenatória os aplique de forma expressa e fundamentada na própria sentença e também da situação trazida pelo próprio artigo citado. Portanto, são eles:

“Art. 92 – São também efeitos da condenação:

I – a perda de cargo, função pública ou mandato eletivo: 

  1. a) quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano, nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública;
  2. b) quando for aplicada pena privativa de liberdade por tempo superior a 4 (quatro) anos nos demais casos.

II – a incapacidade para o exercício do pátrio poder, tutela ou curatela, nos crimes dolosos, sujeitos à pena de reclusão, cometidos contra filho, tutelado ou curatelado; 

 III – a inabilitação para dirigir veículo, quando utilizado como meio para a prática de crime doloso” (BRASIL, 1940).

Tais efeitos são aplicados em situações específicas trazidas, portanto, apenas diante na análise do caso concreto poderá ser determinada a aplicação do art. 92. Assim sendo, para que haja perda de cargo, função pública ou mandato eletivo, é necessário que seja em caso de crime contra a Administração Pública e que a pena aplicada por esse delito seja igual ou superior a 1 (um) ano; e nos demais tipos de crimes determinados pela legislação, é preciso que a pena seja superior a 4 (quatro) anos.

Quanto ao efeito trazido pelo inciso II, tem como objetivo de proteger aqueles que necessitam de tutela ou curatela, e ainda, aqueles que estão sujeitos a autoridades de responsáveis em razão de não possuírem idade para responder por seus atos legalmente (GRECO, 2015). Desta forma, aquele que cometer algum delito, intencionalmente, contra o tutelado, curatelado ou aquele que se encontra legalmente sob sua responsabilidade, e a punição seja reclusão, independentemente do tempo, terá como um dos efeitos de sua condenação será a declaração de sua incapacidade para responder por aquele indivíduo que foi vítima.

Já o inciso III versa sobre crimes que tiveram como instrumento um veículo, por isso a inabilitação é específica a essas situações, e tal inabilitação possui uma natureza preventiva, ou seja, o intuito dessa consequência da condenação é evitar que o condenado continue a praticar o mesmo delito e, possivelmente, utilizando-se também de veículos. “A inabilitação não se confunde com a suspensão da autorização ou de habilitação para dirigir o veículo, prevista no Código Penal como pena substitutiva aplicável apenas os autores de crimes culposos de trânsito, com duração de pena substituída (arts. 47, III, 55 e 57). ” (MIRABETE, FABBRINI, 2007, p. 366).

Portanto, em linhas gerais, esses são os efeitos acima exposto são os cabíveis para o réu que for condenado em sentença penal, contudo, é possível que haja alguns efeitos específicos em outras áreas do direito, visto que para muitos os efeitos da condenação é um rol exemplificativo.

  1. A EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA E O STF

Em fevereiro de 2016, o Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento do Habeas Corpus 126292/SP trouxe um novo entendimento acerca da execução provisória da pena, isto é, sobre o cumprimento da pena privativa de liberdade antes da sentença penal se tornar imutável em razão de não haver mais recurso cabível contra ela, ou por estar precluso o prazo para propor recurso.

Não é a primeira vez que o STF muda de posicionamento sobre o tema. Em 1991, no julgamento de HC 68726, tendo como relator o Ministro Neri da Silveira, a posição do Tribunal foi muito parecida com a que foi adotada recentemente.

“HABEAS CORPUS. SENTENÇA CONDENATÓRIA MANTIDA EM SEGUNDO GRAU. MANDADO DE PRISÃO DO PACIENTE. INVOCAÇÃO DO ART. 5, INCISO LVII, DA CONSTITUIÇÃO. CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, ART. 669. A ORDEM DE PRISÃO, EM DECORRÊNCIA DE DECRETO DE CUSTODIA PREVENTIVA, DE SENTENÇA DE PRONUNCIA OU DE DECISÃO DE ÓRGÃO JULGADOR DE SEGUNDO GRAU E DE NATUREZA PROCESSUAL E CONCERNE AOS INTERESSES DE GARANTIA DA APLICAÇÃO DA LEI PENAL OU DE EXECUÇÃO DA PENA IMPOSTA, APÓS O DEVIDO PROCESSO LEGAL. NÃO CONFLITA COM O ART. 5, INCISO LVII, DA CONSTITUIÇÃO. […]. NÃO SENDO, ASSIM, ILEGAL O MANDADO DE PRISÃO QUE ÓRGÃO JULGADOR DE SEGUNDO GRAU DETERMINA SE EXPECA CONTRA O RÉU. HABEAS CORPUS INDEFERIDO.”

(STF – HC: 68726 DF, Relator: Min. NÉRI DA SILVEIRA, Data de Julgamento: 28/06/1991, TRIBUNAL PLENO, Data de Publicação: DJ 26-11-1992 PP-21612 EMENT VOL-01685-01 PP-00209, grifo nosso)

Conforme o exposto na ementa do HC 68726/DF, é perceptível que o Supremo Tribunal Federal interpretava o princípio da presunção de inocência de forma muito similar ao posicionamento adotado no julgamento do HC 126292/SP, assim sendo já aplicava-se execução provisória da pena a partir da decisão condenatória do segundo grau. Inclusive, posteriormente foram criadas as Súmulas nº 716 e 717 do STF que tratam sobre o referido tema.

“Súmula nº 716: Admite-se a progressão de regime de cumprimento da pena ou a aplicação imediata de regime menos severo nela determinada, antes do trânsito em julgado da sentença condenatória.

Súmula nº 717: Não impede a progressão de regime de execução da pena, fixada em sentença não transitada em julgado, o fato de o réu se encontrar em prisão especial”.

As Súmulas espelham a posição do STF que perdurou até 2009, quando houve julgamento do HC 84078/MG, que teve como relator o Ministro Eros Grau, havendo a mutação constitucional, ou seja, a norma permaneceu a mesma mudou-se apenas a sua interpretação, determinando a execução da pena não poderia ser antecipada, pois não condiz com a Carta Magna de 1988.

“HABEAS CORPUS. INCONSTITUCIONALIDADE DA CHAMADA “EXECUÇÃO ANTECIPADA DA PENA”. ART. 5º, LVII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. ART. 1º, III, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. […]”. 6. A antecipação da execução penal, ademais de incompatível com o texto da Constituição, apenas poderia ser justificada em nome da conveniência dos magistrados — não do processo penal. […] 8. Nas democracias mesmo os criminosos são sujeitos de direitos. Não perdem essa qualidade, para se transformarem em objetos processuais. São pessoas, inseridas entre aquelas beneficiadas pela afirmação constitucional da sua dignidade (art. 1º, III, da Constituição do Brasil). É inadmissível a sua exclusão social, sem que sejam consideradas, em quaisquer circunstâncias, as singularidades de cada infração penal, o que somente se pode apurar plenamente quando transitada em julgado a condenação de cada qual Ordem concedida.

(STF – HC: 84078 MG, Relator: Min. EROS GRAU, Data de Julgamento: 05/02/2009, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJe-035 DIVULG 25-02-2010 PUBLIC 26-02-2010 EMENT VOL-02391-05 PP-01048, grifo nosso)

Para muitos, essa percepção do STF buscava impedir que o instituto da execução provisória fosse utilizado pela “simples existência de sentença condenatória ou mesmo pela interposição de recurso extraordinário ou especial sem efeito suspensivo, já que o sistema requer que toda prisão antes do trânsito em julgado seja de natureza cautelar.” (TÁVORA; ALENCAR, 2016, p. 2618).

Portanto, em 2009 a pena não mais poderia ser executada provisoriamente enquanto os recursos aguardavam julgamento nos Tribunais Superiores. Foi esse o entendimento que perdurou até 2016, quando houve o julgamento do HC 126292/SP, que teve como relator o Ministro Teori Zavascki.

4.1.      Caso do HC 126.292/SP

            Como dito anteriormente, o Supremo Tribunal Federal julgou com repercussão geral o HC 126.292/SP, que versa sobre a condenação do paciente em primeira instância a 5 (cinco) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, incialmente em regime fechado pelo crime de roubo agravado pelo uso de arma de fogo e concurso de fogo, nos termos do art. 157, §2º, incisos I e II, do Código Penal. O condenado recorreu, por meio da apelação, porém, a decisão foi mantida pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, e logo após foi expedido o mandado de prisão.

Posteriormente, foi impetrado pela defesa Habeas Corpus com pedido liminar no Superior Tribunal de Justiça, HC 313.021/SP, alegando

“da col. 4º Câmara do e. TJSP que determinou a expedição de mandado de prisão contra o Paciente exclusivamente em razão do julgamento de apelação da Defesa, sem, contudo, declinar qualquer fundamentação cautelar que justificasse a execução da pena antes do trânsito em julgado tendo sido indeferida liminar, logo após o impetrante recorreu da decisão no Supremo Tribunal Federal, o que gerou o julgamento aqui analisado” (BRASIL, 2014).

Porém, o Min. Francisco Falcão, em decisão monocrática, indeferiu o pedido, em razão da jurisprudência do STJ considerar que o habeas corpus não é a medida cabível contra a decisão, e sim o recurso especial. Insatisfeito com a referida decisão, o paciente impetrou outro habeas corpus, agora perante o STF.

Houve ainda um questionamento quanto a impossibilidade do STF julgar o caso, em razão da Súmula nº 691 do referido Tribunal, que diz: “Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do relator que, em habeas corpus requerido a tribunal superior, indefere a liminar.”. Por esta súmula, entendemos que em regra não cabe ao STF julgar HC contra decisão do STJ que indeferiu liminar em ação de HC.

Percebe-se que o HC 126.292/SP trata exatamente da situação exposta na súmula citada acima, por isso, em seu voto, o Relator expõe que cabe ao STF julgar excepcionalmente em razão do STJ ter mantido a decisão dada em segunda instância pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, inclusive a prisão do impetrante, portanto, a pena estava sendo executada provisoriamente, contrariando assim a jurisprudência do STF definida no HC 84078/MG julgado em 2009.

“No caso específico do paciente, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, ao negar provimento ao recurso de apelação, determinou a imediata execução provisória da condenação, com a ordem: “Expeça-se mandado de prisão contra o acusado Márcio”. Não se tratando de prisão cautelar, mas de execução provisória da pena, a decisão está em claro confronto com o entendimento deste Supremo Tribunal, consagrado no julgamento do HC 84.078/MG (Rel. Min. Eros Grau, Tribunal Pleno, DJe de 26/2/2010), segundo o qual a prisão decorrente de condenação pressupõe o trânsito em julgado da sentença. Essa circunstância autoriza o excepcional conhecimento da impetração, não obstante a referida Súmula 691/STF” (BRASIL, 2016 p. 04).

Superada a questão da Súmula nº 691 do STF, houve o julgamento, e por maioria dos votos, indeferiu o pedido do paciente, enunciando a seguinte decisão:

“EMENTA: CONSTITUCIONAL. HABEAS CORPUS. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA (CF/88, ART. 5º, LVII). SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA CONFIRMADA POR TRIBUNAL DE SEGUNDO GRAU DE JURISDIÇÃO. EXECUÇÃO PROVISÓRIA. POSSIBILIDADE. 1. A execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência afirmado pelo artigo 5º, inciso LVII da Constituição Federal. 2. Habeas corpus denegado” (HC 126292, Relator(a):  Min. TEORI ZAVASCKI, Tribunal Pleno, julgado em 17/02/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-100 DIVULG 16-05-2016 PUBLIC 17-05-2016)

Assim, por meio desta decisão o STF passou a considerar que após a decisão condenatória proferida em segunda instância, é possível iniciar a execução provisória da pena, ainda que o réu recorra aos Tribunais Superiores, o que não irá mais impedir que o mesmo seja recolhido a uma penitenciária correspondente a sua pena.

4.1.1.      Votos Favoráveis

Os Ministros Teori Zavascki, Edson Fachin, Luiz Roberto Barroso, Dias Toffoli, Luiz Fux, Cármem Lúcia e Gilmar Mendes votaram no sentido de permitir a antecipação do cumprimento a pena, trazendo como argumentos os fundamentos expostos a seguir.

  • Do Princípio da Presunção de Inocência

Sabe-se que a Constituição Federal trouxe em seu art. 5º, inciso LVII, determina o princípio da presunção de inocência, sendo esta uma garantia processual do réu. Contudo, para os Ministros acima citados, nenhum princípio é absoluto, não devendo ser interpretado de forma isolada, e sim em conjunto com os outros princípios trazidos como direito fundamental na Carta Magna.

Como Relator, o Min. Teori Zavascki trouxe em sua fundamentação o entendimento de que o princípio da não culpabilidade não deve ser entendido de forma absoluta até a última instância. Compreende que antes da sentença penal, o princípio da presunção de inocência deve ser aplicado em sua totalidade, impondo à acusação o dever de provar o contrário, contudo, ao haver sentença condenatória em pelo juízo de primeiro grau e sendo confirmada e mantida pelo juízo de segundo grau, não há porque manter a presunção de não culpabilidade em caráter absoluto, pois é nessas instâncias que há o exame de provas e fatos, de forma que as decisões são fundamentadas nas mesmas.

Da mesma forma explana o Min. Edson Fachin, acrescentando o fato de que a interpretação não deve ser feita de forma isolada, e sim, correlacionando com os demais princípios trazidos pela Constituição vigente.  Nesse sentido, ele entende que em contrapartida ao referido direito fundamental, há o princípio da duração razoável do processo exposto também no art. 5º, inciso LXXVIII, da CF/88, sendo tão importante quanto o direito de ser considerado inocente até o trânsito em julgado do processo. Ante a isso, fica claro que nenhum princípio deve ser interpretado de forma absoluta e superior aos outros.

Ele ainda argumenta que se aplicarmos o princípio da presunção de inocência de forma absoluta, não fazendo diferença a decisão condenatória em primeiro grau e ainda concordada por decisão em segunda instância, seria o mesmo que declarar que a Constituição tem dúvida quanto as decisões proferidas nesses juízos. Ainda que haja equívocos, há medidas para efetivas para saná-las.

Em concordância com ele, Ministro Luiz Fux faz uma correlação com o que é trazido na Declaração Universal dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas, que determina que “Toda pessoa acusada de um ato delituoso tem o direito de ser presumida inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada.”, não há menção ao trânsito em julgado.

Luís Roberto Barroso traz a ideia de que como princípio, a não culpabilidade não precisa ser aplicado necessariamente de forma objetiva, como são as regras, pois, para ele, os princípios devem ser aplicados de acordo com a realidade, em maior ou menor intensidade, de acordo com o andamento do processo. “Há, desse modo, uma ponderação a ser realizada. Nela, não há dúvida de que o princípio da presunção de inocência ou da não culpabilidade adquire peso gradativamente menor na medida em que o processo avança, em que as provas são produzidas e as condenações ocorrem” (BRASIL, 2016 p. 41).

A Ministra Cármen Lucia diferencia a evidência de condenação com a evidência de culpa, afirmando que a culpa está atrelada a condenação, uma vez que não existe a condenação se não houver culpa.

“[…] considerei que a interpretação da Constituição no sentido de que ninguém pode ser considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória haveria de ser lido e interpretado no sentido de que ninguém poderá ser considerado culpado e não condenado. Quer dizer, condenado ele está, mas o que a Constituição diz é que a esfera de culpa ou o carimbo da culpa, com consequências para além do Direito Penal, inclusive com base na sentença penal transitada, é uma coisa; quer dizer, algo é dizer que ninguém será considerado culpado, e esta é a presunção de inocência que foi discutida na Constituinte” (BRASIL, 2016, p. 61)

Já Gilmar Mendes observou um detalhe muito importante quanto a presunção de inocência, que apesar de ser uma garantia processual do réu no sentido de não ser considerado culpado, a lei não traz a definição de culpado, nem institui de que forma a culpabilidade será aferida a medida que o réu seja considerado culpado no decorrer do processo e das instâncias em que for condenado.

  • Dos Recursos e Da Efetividade Jurisdicional

Outro argumento trazido pelo Relator e reiterado pelo demais Ministros que votaram no sentido da permissão da execução provisória da pena foi acerca dos recursos.

Sabe-se que o recurso extraordinário, conforme leciona Nucci (2014, p. 1179), é “[…] voltado a garantir a harmonia da aplicação da legislação infraconstitucional em face da Constituição Federal, evitando-se que as normas constitucionais sejam desautorizadas por decisões proferidas nos casos concretos pelos tribunais do País”, por isso, regra geral não possuem efeito suspensivo, assim dispõe o art. 637 do CPP: “O recurso extraordinário não tem efeito suspensivo, e uma vez arrazoados pelo recorrido os autos do traslado, os originais baixarão à primeira instância, para a execução da sentença.”.

Diante disso, Teori Zavascki entendeu que o princípio do duplo grau de jurisdição inerente aos recursos só existe de fato até a segunda instância e que é nela em que ele é concretizado, visto que o exame das provas é esgotado nessa instância.

“É nesse juízo de apelação que, de ordinário, fica definitivamente exaurido o exame sobre os fatos e provas da causa, com a fixação, se for o caso, da responsabilidade penal do acusado. É ali que se concretiza, em seu sentido genuíno, o duplo grau de jurisdição, destinado ao reexame de decisão judicial em sua inteireza, mediante ampla devolutividade da matéria deduzida na ação penal […]” (BRASIL, 2016, p. 9).

O Relator ainda argumenta que nos recursos excepcionais, como é o caso do recurso extraordinário, se limitam ao exame da matéria jurídica tratada no processo, não há um exame das provas em si, por isso, ao seu ver, a execução da pena deve iniciar a partir da decisão condenatória em segundo grau, pois a decisão terá sido fundamentada no caso concreto em si, por meio das provas, e não tendo consequências a interposição de recurso extraordinário, pois seu efeito é meramente devolutivo, e não suspensivo, como dito anteriormente.

Nessa perspectiva, para o Ministro Luís R. Barroso após a decisão condenatória em segundo grau ficam determinadas “[…] algumas certezas jurídicas: a materialidade do delito, sua autoria e a impossibilidade de rediscussão de fatos e provas. ” (BRASIL, 2016, p.45)

Ainda quanto aos recursos, o mesmo traz uma observação quanto a consequência causada pelo impedimento da antecipação do cumprimento da pena antes do trânsito em julgado, argumentando que tal impedimento serviu de estímulo para que houvesse mais interposição de recursos, muitas vezes com o interesse de procrastinar, visando muitas vezes a prescrição da sanção penal.

O Min. Edson Fachin ainda dispõe que:

“Se pudéssemos dar à regra do art. 5º, LVII, da CF/88 caráter absoluto, teríamos de admitir, no limite, que a execução da pena privativa de liberdade só poderia operar-se quando o réu se conformasse com sua sorte e deixasse de opor novos embargos declaratórios. Isso significaria dizer que a execução da pena privativa de liberdade estaria condicionada à concordância do apenado” (BRASIL, 2016 p. 24-25)

Pelo exposto, compreende-se que há sempre uma possibilidade de interpor algum recurso, retardando o trânsito em julgado.

A efetividade da função jurisdicional penal perante a sociedade também foi trazida tanto pelo Relato quanto pelos outros Ministros, ressaltando que a execução provisória da pena, além de evitar os recursos protelatórios, garante uma maior efetividade, visto que em muitos processos ocorre a prescrição punitiva, em razão da morosidade do Poder Judiciário, agravada pela quantidade de processos.

O Ministro Gilmar Mendes reconheceu essa morosidade quando afirmou em seu voto, “Resta-nos reconhecer que as instâncias extraordinárias, da forma como são estruturadas no Brasil, não são vocacionadas a dar respostas rápidas às demandas. ” (BRASIL, 2016, p.71), assim sendo, fica claro que a morosidade impede a eficácia do exercício jurisdicional, não estando só atrelada a quantidade, mas também a estrutura do Poder Judiciário em si

Deve-se lembrar que a efetividade jurisdicional para todo o contexto da sociedade, não se trata apenas da punição em si, mas de demonstrar a eficácia do sistema penal, de comprovar que o Estado pune aqueles que agem em confronto com as normas, resultando inclusive em uma forma de prevenção, uma vez que dá uma maior credibilidade ao Poder Público.

  • Da Possibilidade de Mudanças das Decisões

Prevendo os eventuais questionamentos acerca de possíveis equívocos nas decisões de primeira e segunda instância, o Relator já ressaltou em seu voto que há medidas adequadas no nosso Ordenamento Jurídico para sanar a situação, determinando o efeito suspensivo do recurso.

Tal argumento foi acompanhado pelos demais Ministros, inclusive Edson Fachin ressalta que nos casos em que houver alguma decisão contrária a moralidade, ao bom senso, dentro da interpretação dentro do Direito Brasileiro, o STF pode suspender o efeito da mesma de ofício.

4.1.2.      Votos Desfavoráveis

            Em sentido contrário aos argumentos expostos até agora, votaram os Ministros Rosa Weber, Celso de Mello, Marco Aurélio e o então presidente do STF, Ricardo Lewandowski

O Ministro Marco Aurélio apesar de concordar com a morosidade do Poder Judiciário, entende que embora seja papel do STF interpretar a Constituição, essa hermenêutica tem limitações, e para ele, o art. 5º, inciso LVII, da CF/88, que determina o princípio da presunção da inocência é bastante claro, não deixando espaços para tal interpretação, de forma que fazê-la estaria reformando o preceito constitucional.

Já a Ministra Rosa Weber trouxe o princípio da segurança jurídica como principal fundamento, alegando que tais mudanças afetam toda sociedade, por isso é necessário estabilizar as relações jurídicas e a jurisprudência, principalmente quando trata-se de direitos fundamentais expressos pela Constituição. Convém lembrar que o não tem muitos anos que o STF determinou o entendimento em sentido contrário.

Embasado na própria história do surgimento do princípio da presunção de inocência, que segundo o Ministro Celso Bandeira de Mello, surgiu da própria necessidade de limitação dos atos do Poder Público, para evitar a arbitrariedade, sendo um direito fundamental e uma condição para a execução, não sendo compatível com a interpretação exposta pelo Relator, assim o Ministro expõe:

“Disso resulta, segundo entendo, que a consagração constitucional da presunção de inocência como direito fundamental de qualquer pessoa – independentemente da gravidade ou da hediondez do delito que lhe haja sido imputado – há de viabilizar, sob a perspectiva da liberdade, uma hermenêutica essencialmente emancipatória dos direitos básicos da pessoa humana, cuja prerrogativa de ser sempre considerada inocente, para todos e quaisquer efeitos, deve prevalecer, até o superveniente trânsito em julgado da condenação criminal, como uma cláusula de insuperável bloqueio à imposição prematura de quaisquer medidas que afetem ou restrinjam a esfera jurídica das pessoas em geral” (BRASIL, 2016, p. 84)

Em seu voto, o então Presidente do STF, o Ministro Ricardo Lewandowski manteve o mesmo posicionamento que teve no julgamento do HC 84.078/MG, no sentido de que o princípio do art. 5º, inciso LVII, da CF/88 é um direito fundamental, e como tal é uma cláusula pétrea, não podendo ser modificado ou suprimido. Ele ainda argumenta que em decisões anteriores o STF reconheceu a falência do sistema penitenciário, então ao seu ver, não teria sentido colaborar com o ingresso por meio da antecipação do cumprimento da pena.

Portanto, para os Ministros que votaram contrários a execução provisória da pena, o texto expresso na Constituição Federal que consagra o princípio da presunção de não culpabilidade é bastante claro, não cabendo a interpretação proposta pelo Ministro Teori Zavascki. Porém, pela maioria dos votos, a execução provisória da pena passou a ser possível após a decisão condenatória proferida em segunda instância.

Sintetizando os votos:

Votos favoráveis a execução provisória da pena Votos desfavoráveis a execução provisória da pena
Teori Zavascki (Relator) Ricardo Lewandowski (Presidente)
Edson Fachin Rosa Weber
Luís Roberto. Barroso Celso Bandeira de Mello
Luiz Fux Marco Aurélio
Dias Toffoli  
Cármen Lucia  
Gilmar Mendes  

(HC 126292, Relator(a):  Min. TEORI ZAVASCKI, Tribunal Pleno, julgado em 17/02/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-100 DIVULG 16-05-2016 PUBLIC 17-05-2016)

Portanto, visualizamos que por sete votos a quatro, o STF passou a decidir no sentido da permissão da execução provisória da pena antes do trânsito em julgado, caracterizando um retorno a jurisprudência que foi sustentada durante anos pelo STF. Porém, tal decisão, embora já tenha se passado algum tempo, ainda está se assentando, visto que possui algumas divergências, principalmente, por estarmos lidando com um direito fundamental expresso na Constituição de 1988.

CONCLUSÃO

É de conhecimento geral que o Brasil passa por uma crise na esfera penal, a impressão que reina na sociedade é de impunidade, caracterizada pelos índices de criminalidade estarem cada vez maiores, sendo amplamente exposto pelos mais diversos meios de comunicação.

Dentro deste cenário, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do HC 126.292/SP que ocorreu em fevereiro de 2016, trouxe um novo debate em torno da execução provisória da pena, passando a permitir que a mesma se inicie após decisão condenatória proferida em segunda instância, em busca de garantir a eficácia das decisões condenatórias.

Porém, tal decisão gerou inúmeras controvérsias em razão do direito fundamental ao estado de inocência transitória consagrado na Constituição Federal de 1988, sendo considerado também um princípio fundamental do estado democrático de direito e do próprio Sistema Jurídico Brasileiro, que não permite a prisão do réu antes do trânsito em julgado, tendo sido demonstrado inclusive na Declaração Universal de Direitos Humanos, sendo considerado um direito universal, pois é inerente a condição humana.

Ante a estes fatos, o presente trabalho abrangeu o estudo do instituto da prisão em seus aspectos gerais, bem como as evoluções dos direitos e garantias do réu ao longo das diversas Constituições que tivemos, abordando também as hipóteses em que deverá ser aplicada de acordo com o texto legal.

Posteriormente tratou da prisão cautelar e de suas espécies, sendo esta o tipo de prisão que a lei regula, e que ocorre antes do trânsito em julgado, trazendo os conceitos e as referências legais das prisões temporária, preventiva e em flagrante, sendo esta o tipo de prisão que a lei regula, e que ocorre antes do trânsito em julgado.

Além disto, também foi abordado os efeitos da condenação, que em regra, são aplicados quando a partir do momento que a decisão condenatória não pode mais ser recorrida, em consonância com o direito fundamental de que não poderá ser preso antes do trânsito em julgado.

Por fim, apresentou como a execução provisória da pena foi tratada pelo Supremo Tribunal Federal ao longo dos anos, tendo sido mantido durante muito tempo, desde 1991, a jurisprudência de que o cumprimento poderia ser antecipado após a decisão condenatória de segunda instância, contudo em 2009 houve uma alteração em sentido contrário, tendo permanecido assim até 2016, como o julgamento do HC nº 126.292/SP, tendo sido analisado os votos dos Ministros do STF, com intuito de compreender como se deu a idealização do entendimento jurisprudencial proferido, através dos argumentos favoráveis e desfavoráveis sustentados em plenário.

Destarte, em conclusão, compreende-se que é válida intenção da Suprema Corte em buscar uma maior efetividade das decisões proferidas em instâncias ordinárias, porém, apesar de ser dever do Estado punir aqueles que agem de forma contrária ao que determina nossa legislação, também é dever do Estado agir em conformidade com princípios que norteiam a Constituição Federal de 1988, assegurando o cumprimento dos direitos e garantias fundamentais.

Assim, ante ao problema apresentado inicialmente no trabalho, se existe congruência entre a decisão do STF aqui estudada e a Constituição, pode-se concluir que a hipótese de não concordância entre a resolução trazida no julgamento do HC nº 126.292/SP e a Carta Magna vigente é a verdadeira, visto que como guardião da Constituição, não cabe ao STF apresentar uma hermenêutica diversa do que é trazido no art. 5º, inciso LVII, que condiciona o início da execução da pena ao trânsito em julgado. Ao colocarmos os argumentos favoráveis expostos diante do que consagra a Constituição, eles demonstram a não congruência dos mesmos em relação ao texto constitucional, de forma que se tornam insuficientes diante de um princípio que faz parte dos fundamentos da própria Carta Magna.

Além disso, é dever do STF zelar pelo cumprimento da Constituição, porém tal decisão revela um anseio em solucionar um desejo de justiça que tem afligido a sociedade por meio da relativização do conceito de trânsito em julgado, que trata-se justamente da impossibilidade de modificação da decisão. E ainda no caso dos recursos de natureza excepcional, não é afastado a ideia da modificação da pena, mesmo que a análise gire em torno matéria jurídica.

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[1] Advogada. Pós Graduanda em Direito e Processo Tributário.

É possível a progressão de regime de execução da pena fixada em sentença não transitada em julgado mesmo na hipótese de o réu se encontrar em prisão especial?

Não impede a progressão de regime de execução da pena, fixada em sentença não transitada em julgado, o fato de o réu se encontrar em prisão especial. Trata-se de habeas corpus originariamente impetrado perante o Supremo Tribunal Federal contra decisão emanada de eminente Ministra de Tribunal Superior da União.

É possível a execução provisória Cível de sentença penal condenatória que ainda não tenha transitado em julgado?

Admite-se no Brasil, a execução provisória de sentença penal condenatória, ainda que sujeito a recurso extraordinário e especial, ou seja, a possibilidade do réu ser condenado à prisão antes do trânsito em julgado da sentença.

É possível progressão de regime na execução provisória?

Hodiernamente, portanto, está pacificamente consolidado na Jurisprudência do STF o entendimento de que é plenamente cabível a execução provisória da pena e, por conseguinte, a progressão de regime prisional antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, com base na Súmula 716 da nossa Corte Suprema.

É possível a progressão de regime antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória?

Admite-se a progressão de regime de cumprimento da pena ou a aplicação imediata de regime menos severo nela determinada, antes do trânsito em julgado da sentença condenatória.