Porque o Brasil deixou de investir nas ferrovias quais foi o impacto que esta decisão teve para o transporte brasileiro?

O Brasil é, por muitas vezes, tido como um país eminentemente rodoviarista, ou seja, um país que apresenta um predomínio do modal rodoviário em sua estrutura de transportes e deslocamentos ao longo de toda a sua extensão territorial. Atualmente, o país possui uma média de 1,03 km de rodovia pavimentada por habitante e 7,35 km de rodovia não pavimentada, conforme apontam dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

A política do rodoviarismo no Brasil é, no entanto, muito criticada, principalmente porque a priorização desse modal contribuiu para que outros tipos de transportes fossem colocados em segundo plano, como as ferrovias e as hidrovias, que costumam apresentar uma melhor relação custo-benefício. Enquanto um caminhão, por exemplo, transporta 30 toneladas de carga, um trem transporta 125 toneladas com o mesmo custo e as hidrovias possibilitam o transporte, da mesma forma, de mais de 575 toneladas.

Mas por que o Brasil investiu em rodovias em detrimento dos demais tipos de transporte?

O Brasil começou a investir, realmente, em rodovias somente ao longo do século XX. O auge dessa política veio com o Governo JK, pois o processo de industrialização do Brasil, naquela época, demandava uma maior integração territorial, o que incluía, sem dúvidas, uma rede de transporte articulada por todo o território nacional. Nesse sentido, Juscelino Kubitschek trouxe para o país a indústria automobilística, construiu a capital Brasília no interior do espaço brasileiro e promoveu a construção de várias rodovias importantes, essas ocupando praticamente todo o orçamento então destinado a transportes terrestres.

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Durante o Regime Militar, a política rodoviarista manteve-se com o Programa de Integração Nacional (PIN), que visava a uma maior ocupação do Centro-Oeste do país e também da Amazônia. Nesse momento, foram construídas estradas como a Perimetral Norte, Cuiabá/Santarém e a polêmica Transamazônica, que liga a região Nordeste à região Norte no sentido leste-oeste.

Porque o Brasil deixou de investir nas ferrovias quais foi o impacto que esta decisão teve para o transporte brasileiro?

Rodovia Transamazônica (BR-230) em trecho no estado da Paraíba

Atualmente, mais de 62% do sistema de transporte brasileiro é rodoviário, fruto da concentração de investimento nesse setor. No entanto, isso não significa que haja uma grande qualidade das estradas, pois muitas delas apresentam-se em péssimas condições, gerando muitos acidentes e aumentando os custos para o escoamento de produtos, o que acaba encarecendo-os no mercado. O grande problema é que esse modal é bastante oneroso no sentido da manutenção, o que exige mais gastos públicos e mais direcionamento de verba, algo que nem sempre ocorre.

A partir dos anos 1990, iniciaram-se os processos de privatização das estradas brasileiras, uma política que repassava para a iniciativa privada a manutenção das estradas e transferia os custos para o usuário por meio dos pedágios. Atualmente, o governo vem dando continuidade a esse processo, enquanto obras públicas tentam priorizar o acabamento de outras estradas e os investimentos em outros modais de transporte, com ênfase no ferroviário.

O Brasil é um país com dimensões continentais, apresentando uma larga extensão norte-sul, além de uma grande distância no sentido leste-oeste em sua porção setentrional. Por esse motivo, é necessária uma ampla rede articulada que ligue os diferentes pontos do território nacional a fim de propiciar o melhor deslocamento de pessoas e mercadorias.

Além disso, para que o país possa ampliar as exportações, importações e, principalmente, os investimentos estrangeiros, é necessário que os meios de transporte ofereçam condições para que os empreendedores tanto do meio agrário quanto do meio industrial possam ter condições de exercer suas funções sociais. No Brasil, a estratégia principal foi a de priorizar a estruturação do sistema rodoviário – sobretudo a partir do Governo JK – em detrimento da construção de ferrovias e hidrovias, que só recentemente vêm recebendo maiores investimentos.

As rodovias no Brasil

O transporte rodoviário no Brasil foi – e ainda é – o meio responsável pela maior parte dos fluxos de bens e pessoas no país, que priorizou a sua construção para favorecer as empresas estrangeiras do setor automobilístico e promover a entrada delas no país. A expectativa era estruturar o modal rodoviário a fim de propiciar a construção de polos industriais de automóveis no Brasil com o objetivo de ampliar a geração de empregos, embora hoje as indústrias desse setor empreguem cada vez menos trabalhadores, em função das novas tecnologias fabris.

Outra característica da implantação das rodovias no Brasil foi a integração das diferentes partes do território brasileiro, que concentrou seus investimentos nas regiões litorâneas. Esse quadro começou a mudar ao longo do século XX, destacando-se a construção da capital Brasília. Assim, rodovias como Belém-Brasília, Cuiabá-Porto Velho e tantas outras tinham como preocupação estabelecer a ligação entre pontos e localidades até então desconectados.

A grande crítica a essa dinâmica questiona a opção por rodovias, algo não muito recomendado para países com larga extensão territorial, como o Brasil. Em geral, as estradas costumam ter um custo de manutenção mais elevado do que outros meios de transporte, como o ferroviário e o hidroviário, além de um maior gasto com combustíveis e veículos. Em virtude dos elevados custos e da política neoliberal de redução dos gastos públicos em investimentos estruturais, iniciou-se uma campanha de privatização das rodovias, que encontrou o seu auge na década de 1990, mas que ainda ocorre atualmente através de concessões públicas.

Apesar disso, a qualidade das rodovias no Brasil é bastante ruim, além da larga quantidade de estradas não pavimentadas. Elas oneram os gastos públicos, que muitas vezes não conseguem atender às necessidades principais, fator que não se modifica nem com as privatizações, uma vez que as concessões costumam ocorrer apenas com as estradas que já estão prontas e estruturadas.

Porque o Brasil deixou de investir nas ferrovias quais foi o impacto que esta decisão teve para o transporte brasileiro?

Trecho da rodovia Belém-Brasília em Tocantins (BR-153) ¹

As ferrovias no Brasil

O transporte ferroviário no Brasil foi predominante até o final do século XIX, quando estruturava os deslocamentos de mercadorias da economia cafeeira, sendo, por essa razão, bastante consolidado na região Sudeste. As ferrovias, apesar dos elevados custos em suas construções, possuem baixos gastos em manutenção, o que não impediu que, de 1950 até os dias atuais, várias delas fossem sucateadas e até desativadas.

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Além disso, existem várias ferrovias no Brasil em construção, mas que as obras encontram-se inacabadas, muito embora os recentes investimentos por meio do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) trabalhem para modificar esse cenário. A principal ferrovia no Brasil em construção é a Ferrovia Norte-Sul, que já possui algumas áreas concluídas e em operação (ou com uso e operação a serem efetuados em breve).

Após a privatização de boa parte das ferrovias nacionais na década de 1990 e da derrocada da Rede Ferroviária Federal (RFFSA), empresa estatal responsável por administrá-las, a participação das ferrovias no Brasil até aumentou, apesar de atender interesses e deslocamentos muito específicos e limitados. Ainda hoje, a malha ferroviária nacional concentra-se nas regiões Sul e Sudeste.

Porque o Brasil deixou de investir nas ferrovias quais foi o impacto que esta decisão teve para o transporte brasileiro?

Trecho da rodovia norte-sul na cidade de Imperatriz (MA) ²

As hidrovias no Brasil

O transporte hidroviário é o que possui a menor representatividade e participação nos sistemas de deslocamento nacional, o que é uma grande contradição, haja vista o grande potencial que o país possui para esse modal. No Brasil, a rede hidroviária é muito ampla e muitos rios são navegáveis sem sequer exigir a construção de grandes empreendimentos e estruturas, como obras de correção e instalação de equipamentos.

Uma justificativa para a negligência de investimentos nas hidrovias brasileiras é a existência de muitos rios de planalto, que são mais acidentados e exigem mais obras de correção para facilitar o transporte. Os rios de planície, mais facilmente navegáveis, encontram-se em áreas afastadas dos grandes centros econômicos.

Por outro lado, cita-se a concentração de investimentos em rodovias em áreas onde o mais indicado seria o investimento em hidrovias, cujo exemplo mais notório é o caso da Transamazônica, uma estrada construída quase que paralelamente ao rio Amazonas, de fácil navegação.

No entanto, a partir dos anos 1980 e sobretudo após a criação do Mercosul, que passou a exigir mais das hidrovias para a integração do Cone Sul, os investimentos públicos nessa área elevaram-se, mas ainda são insuficientes. As principais hidrovias do Brasil são a Tietê-Paraná, a do Rio São Francisco, a do Amazonas, entre outras.

Porque o Brasil deixou de investir nas ferrovias quais foi o impacto que esta decisão teve para o transporte brasileiro?

Eclusa em operação na Hidrovia Tietê-Paraná ³

Em resumo, o que se percebe é que os meios de transporte no Brasil precisam de diversificação para que haja menos dependência das rodovias nos deslocamentos de mercadorias e pessoas. Em geral, é necessária a instalação de uma matriz multimodal, ou seja, com vários sistemas de transportes diferentes integrados. Outra necessidade é uma maior integração rumo ao oeste do país, principalmente em direção aos países sul-americanos e ao Oceano Pacífico, com vistas a ampliar as trocas comerciais dentro do continente e em direção aos países asiáticos.

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¹ Créditos da imagem: Agência CNT de Notícias / Wikimedia Commons

² Créditos da imagem: Etore.Santos / Wikimedia Commons

³ Créditos da imagem: Hermógenes Teixeira Pinto Filho / Wikimedia Commons

Por que o Brasil deixou de investir em ferrovias?

A falta de investimentos e o desenvolvimento das rodovias tirou a força das locomotivas brasileiras. Por volta do ano de 1960, a malha ferroviária brasileira chegou ao seu auge no que diz respeito a quilometragem dos trilhos.

O que aconteceu com as ferrovias no Brasil?

Em 15 anos, o Brasil tinha perdido 8 mil km de ferrovias, que se estendiam naquele momento por cerca de 30 mil km do território nacional. Desde então, o tamanho da malha ferroviária patina no mesmo patamar. Atualmente, de acordo com o os dados do Anuário Estatístico de Transportes, tem 29,8 mil km.

Quais são os principais problemas do transporte ferroviário no Brasil?

Uma das mais graves complicações atuais da malha ferroviária brasileira é a falta de extensão de trilhos.

Quem acabou com as ferrovias?

No governo de Fernando Collor de Mello, foi instituído o Plano Nacional de Desestatização, sendo realizadas dezenas de concessões. Todavia, elas acabaram por concentrar as linhas férreas, principalmente, em três grandes grupos empresariais, a América Latina Logística (ALL), a Vale S.A. e a MRS Logística.