Qual a importância da laicidade na Constituição brasileira e no mundo?

Leia os textos motivadores.

TEXTO 1:

O Estado laico surgiu junto ao republicanismo a fim de garantir que houvesse igualdade entre todos os cidadãos. Após diversas guerras e conflitos por conta de religião, as pessoas começaram a enxergar a necessidade de separar as decisões estatais da Igreja, pois ela não poderia servir como base para justificar as ações do governo.

A junção entre Estado e Igreja foi abandonada com o modo de governar do Antigo Regime pela maioria dos países, pois os monarcas absolutos de antes necessitavam da suposta bênção divina para justificar as suas ações. O republicanismo e a dissolução do poder estatal no Parlamento retiraram o peso das ações governamentais da religião e colocaram-no inteiramente no povo, na competência dos agentes públicos e no âmbito do Estado.

Estado laico ou, no âmbito religioso, Estado secular é aquele que não adota religião oficial, não interfere nos assuntos religiosos – a menos que esses estejam relacionados diretamente com questões jurídicas – e não se deixa ser influenciado por nenhum viés unilateral religioso, ou seja, é independente de qualquer religião.

A palavra secular também é utilizada para designar algo que é laico. Secular vem do latim saeculare, que significa mundano, ou seja, o que é do mundo físico e “não pertencente a Deus”.

Em um Estado laico, não é vedada a prática religiosa, muito pelo contrário, as pessoas são protegidas pela Constituição para manifestarem livremente suas crenças e cultos, desde que observado o princípio de que a religião pertence à vida privada e não pode servir de parâmetro para um agente público em exercício do dever.

Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/sociologia/estado-laico.htm. Acesso em 10 de outubro de 2020.

TEXTO 2:

A laicidade é garantia da diversidade

Professor da Unesp discute a separação entre Estado e religião e as suas consequências

A recente ação do Ministério Público Federal, que solicita que as novas cédulas de real sejam produzidas sem a frase “Deus seja louvado”, ressaltou uma importante questão que engloba toda a sociedade brasileira: a laicidade do Estado, que é a separação entre Estado e religião. Juarez Tadeu de Paula Xavier, doutor em Comunicação e Cultura pela USP e professor da Unesp (Universidade Estadual Paulista) em Bauru, falou ao NJSR sobre o assunto.

De que maneira a laicidade do Estado garante maior eficiência do poder público?

Todas e todos tornam-se iguais ante o Estado, sem privilégios religiosos, na distribuição dos serviços públicos, no acesso aos direitos constitucionais e na garantia das liberdades individuais e coletivas. Ninguém poderá ser perseguido por professar uma determinada religião, desde que essa não afete o Estado democrático de direito. Assim, a violência contra as tradições de matrizes africanas e indígenas não afetam essas comunidades, mas sim o Estado democrático de direito, que proíbe qualquer manifestação que propague a intolerância religiosa e cultural. O Estado, então, inibe as ações violentas contra as matrizes sagradas não hegemônicas (as que não são baseadas no cristianismo catolicismo, evangelismo, pentecostal ou neo pentecostal). Dessa forma, o poder público tem o obrigação constitucional de tratar todas as manifestações da mesma forma, e quando isso não ocorre, garante aos adeptos dessas tradições de recorrerem à justiça, quanto têm esses direitos violados.

Disponível em: http://www2.eca.usp.br/njsaoremo/?p=3189. Acesso em 10 de outubro de 2020.

TEXTO 3:

“O filósofo Jürgen Habermas, um dos que reconhecem o papel relevante da religião como elemento constitutivo da sociedade, define a laicidade do Estado como “a neutralidade do poder estatal, no que tange às cosmovisões, neutralidade que garante iguais liberdades éticas a todos os cidadãos”. Isso significa que o Estado não deve privilegiar nem coibir determinada religião em suas políticas públicas – mas deve, sim, garantir a liberdade religiosa e de culto, inclusive público.””A definição de Habermas não condena apenas um dos extremos, que seria o Estado confessional; ela também nos recorda que Estado laico não é o mesmo que Estado ateu. O ateísmo não deixa de ser uma convicção a respeito de temas de natureza religiosa, e um Estado que se definisse como ateu estaria, portanto, adotando um posicionamento que viola a neutralidade definida por Habermas.”

Disponível em:https://www.gazetadopovo.com.br/opiniao/nossas-conviccoes/o-estado-laico-7ohptaue1r2a7g1cxq3892syc/. Acesso em 10 de outubro de 2020.

Com base na leitura dos textos motivadores e nos conhecimentos construídos ao longo de sua formação, redija um texto dissertativo-argumentativo, em modalidade escrita formal da língua portuguesa, sobre o tema qual a importância social de um Estado laico?

O Brasil vive uma crescente onda de intolerância religiosa, principalmente quando se trata de religiões de matrizes africanas. Segundo dados do Disque 100 – do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, 61% dos casos de violações de direitos são voltados aos adeptos das religiões de matriz africana, seguido dos espíritas com 18%.

Uma das raízes desses casos de violência e intolerância é o histórico escravocrata do país, e que ainda deixou resquícios, como o racismo estrutural, que contribui para a manutenção das desigualdades sociais. As religiões que fogem do que é considerado padrão no país majoritariamente cristão, são frequentemente violentadas, conforme apontam os dados fornecidos pelo Governo Federal.

Diante da preocupação com o aprofundamento dos casos de intolerância, e por considerar a importância de se assegurar o Estado Laico e a constituição que estabelece o respeito à todas as religiões, a vereadora Linda Brasil (PSOL), vem pautando discussões acerca do Projeto de Lei nº194/2021, que tramita na Câmara Municipal de Aracaju, que apesar de trazer em seu título a proposta de Liberdade Religiosa, na verdade, abre margem para que possam agir com intolerância e discriminação contra outras religiões e minorias, uma vez que propõe no artigo 2º que a “livre manifestação do pensamento ou opinião, bem como a divulgação de credo ou doutrina religiosa, não configura ato ilícito indenizável ou punível, ainda que confronte ou discorde do entendimento ou crença de outras religiões ou grupos da sociedade organizada.”.

Para o professor da UFS, do Núcleo de Graduação em Ciências da Religião e do Programa de Pós-graduação em Ciências da Religião, Alexandre Jesus dos Prazeres o Projeto apresenta problemas de ordenamento jurídico. “No art. 2º, onde há uma exigência a liberdade de “manifestar-se livremente”, percebe-se algo problemático, pois a liberdade religiosa, de expressão ou de pensamento deve ser exercida em conformidade com o ordenamento jurídico do país. Portanto, a liberdade não é liberdade para fazer o que se quer, ou sob pretexto de liberdade religiosa propagar discursos de ódio, de cunho racista, xenófobo, homofóbico ou que afeta a honra e a dignidade de terceiros”, observou.

A constituição brasileira e a atual legislação já asseguram que o estado é laico e que as pessoas tem liberdade religiosa. Que propósitos podem estar por trás de uma proposta, aparentemente bem intencionada? Não é possível a criação de um Projeto dessa natureza sem dialogar com grupos que sofrem violência e perseguição historicamente, abrindo espaço para que crenças e religiões possam em seus fundamentos expressar intolerância contra outros/as/es, claramente um retrocesso que tem alimentado graves violências ao longo dos anos, principalmente contra grupos mais vulneráveis como a população indígena, negros/as, LGBTQIA+ e outros.

Para o advogado Douglas Costa, presidente da Comissão de Liberdade Religiosa da OAB/SE, esse Projeto não tem funcionalidade, uma vez que a constituição já garante essa liberdade religiosa. Além disso, não é admissível uma produção verticalizada de uma legislação que vai impactar a vida das pessoas.

“É um Projeto de Lei para dizer o óbvio, o que já está dito. Porque nós temos na Constituição Federal a Liberdade de Culto, a Liberdade de Imprensa, no artigo 5º. Então ao meu ver ele já nasce viciado, porque ele usurpa uma competência legislativa da União. Me leva a reflexão sobre quais as motivações para a criação de um Projeto de Lei sobre o que já está assegurado na nossa Constituição”, afirmou o presidente.

Assim como Douglas, outros juristas já afirmaram que o município não tem competência para legislar sobre tal matéria. A Lei conforme está formulada, apesar de passar a ideia de que quer legitimar o que já existe, acaba ferindo outras instâncias legislativas e normativas, uma vez que atinge normas de hierarquias maiores ao entrar em temas como educação, comunicação e o estabelecimento de multas. Assim o projeto fere, inclusive, a Lei Orgânica de Aracaju, a Constituição do Estado de Sergipe, a Constituição Federal Brasileira e Tratados e Convenções Internacionais, bem como interpretações do Supremo Tribunal Federal (STF), dos Tribunais de Contas e do Ministério Público de Contas, sem falar nas atribuições do Conselho Municipal de Educação de Aracaju.

O projeto tem pelo menos três graves problemas: violação da laicidade estatal; fere a competência exclusiva da União – PL que institui normas gerais e violação da discricionariedade da administração pública.

O PL, ao dispor sobre diretrizes gerais de Liberdade Religiosa, está a querer tutelar o funcionamento do estado por meio de uma concepção religiosa.

O PL também adentra em questões de âmbito educacional, de competência de órgãos específicos e regidos pela LDB e LDBEN ((Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional). Movimentos Sociais, sindicatos, Conselhos de Direito, se manisfestaram através de notas públicas exigindo que o PL não seja sancionado em respeito à diversidade religiosa, a laicidade, a autonomia dos órgãos que tem a competência para tratar da legislação educacional no município.

Além dos problemas apontados, o PL ainda sugere a liberdade do uso midiático para propagação religiosa, sabendo que atualmente no pais, alguns grupos religiosos dominam veículos de comunicação, pelo menos 9 meios, dos 50 veículos de maior audiência, são em sua maioria de origem evangélica. Ainda, segundo pesquisa da Agência Nacional de Cinema (Ancine), 21% do total da programação das televisões abertas são de conteúdo religioso. O Coletivo Intervozes tem produzido e pesquisado sobre os impactos negativos do uso e proliferação de determinados grupos na mídia brasileira.

A televisão com espaço informativo e educativo cumpre um importante papel na formação do pensamento de milhares de cidadãos, principalmente de jovens e crianças, assim sendo, ao defender o uso e difusão religiosa através dos meios de comunicação, e sabendo que as religiões mais perseguidas no país não tem o mesmo acesso e vantagens econômicas, o PL fortalece a continuidade de um processo de exclusão que as populações afroreligiosas já sofrem em seu cotidiano.

Para a deputada estadual do Rio de Janeiro, Mônica Francisco (PSOL), evangélica, vice-presidente da Comissão de Combate às Discriminações e Preconceito de Raça, Cor, Etnia, Religião e Procedência Nacional e integrante da CPI de Intolerância Religiosa da Alerj, é preciso estar atentas/os às tentativas de demonização das religiões de matrizes africanas, que consequentemente é uma forma de perseguição ao povo negro.

“Aqui no Brasil, há uma tentativa de continuidade do projeto eugenista que deu errado, por meio da atualização dos processos de opressão e demonização do corpo negro. É um projeto das elites que perseguem as culturas”, ressaltou a deputada estadual Mônica Francisco (PSOL).

A psicóloga e Iyalorixá Jouse Zuzarte, também acrescentou a importância do debate público na formulação de legislações que tratem da diversidade religiosa, respeitando assim aqueles e aquelas que serão diretamente atingidas/os pela legislação.

“Debater o PL da Liberdade Religiosa é um dever ético e, enquanto liderança de terreiro, é um dever responder o convite a esse debate, pois quando não há debate público, a sociedade fica à mercê de um controle social”, refletiu Iyá Jouse Zuzarte.

Para Linda, é fundamental que haja discussão e mobilização para barrar qualquer tentativa de cerceamento da liberdade religiosa e de fundamentalismo religioso. 

Garantir a liberdade religiosa verdadeiramente é não usá-la como pretexto para permitir uma “liberdade” que se concretize em uma opressão moral e psicológica, que reforce preconceitos e discursos de ódio que incitem discriminação, hostilidade ou violência contra pessoas e grupos humanos”, destacou.

Qual é a importância da laicidade na Constituição brasileira?

A importância do Estado laico centra-se no fato de que a liberdade religiosa é um direito humano fundamental, o qual que deve ser garantido. Somente um Estado laico pode resguardar o respeito e a igualdade entre toda e qualquer religião, sem privilegiar algumas ou depreciar outras.

Por que é importante essa ideia de laicidade?

Com o desenvolvimento de sociedades com pluralidade de tradições religiosas, portanto, a laicidade passou a ser não apenas uma separação entre Estado e religião e passou a se definir também como um pressuposto para que as diferentes tradições possam encontrar caminhos de coexistência.

O que é um Estado laico e qual a sua importância?

O Estado laico trata todos os seus cidadãos igualmente, independentemente de sua escolha religiosa, e não deve dar preferência a indivíduos de certa religião. O Estado também deve garantir e proteger a liberdade religiosa de cada cidadão, evitando que grupos religiosos exerçam interferência em questões políticas.

Qual a importância da sociedade laica na sociedade contemporânea?

Ela é parte da nossa identidade. Reflete a nossa escolha e as nossas conquistas. Mas, também sabemos o quanto foi, historicamente, desastroso colocar os valores religiosos como imposição num contexto social tão amplo e plural como a nossa sociedade.