Como Franz Boas formou o conceito de cultura?

1Na geografia brasileira, a chamada geografia cultural ganhou notoriedade, principalmente na década de 1990, quando, de um lado, despontava uma onda de desvalorização da teoria marxista e, de outro, uma curiosidade crescente pela geografia humanística. Naturalmente, após a difusão dessas novas ideias, nasce o interesse em conhecer as origens da geografia cultural, contudo, existiu um debate muito limitado sobre o diálogo profícuo entre geografia e antropologia que se iniciou com o pensamento de Ratzel e que produziu muitos paralelismos e situações de contato entre ambas disciplinas. No presente artigo, pretendemos esboçar alguns pontos importantes para compreender como ocorreu o debate entre geografia e antropologia através do diálogo entre Alfred Kroeber e Carl Sauer, os quais, influenciados pelo pensamento de Franz Boas e seu antigo mestre F. Ratzel, acabaram moldando o surgimento da chamada geografia cultural.

2Atualmente, a geografia cultural é frequentemente considerada como um ramo da geografia humana, mas que, no momento de seu surgimento, era um projeto ambicioso equivalente à geografia humana francesa, do início do século XX, liderada por Paul Vidal de la Blache. Sauer considera muito importante a materialidade específica de cada segmento de área ou paisagem, e, inspirado pelo caso alemão, define a geografia cultural a partir de elementos da antropogeografia de Ratzel, conjuntamente ao projeto pautado no conceito de paisagem, proposto por Schlüter, e no enfoque na diferenciação de áreas ao modo de Hettner.

3Além disso, ao se consultar seu texto célebre A morfologia da paisagem(SAUER, 1963),fica evidente o uso do método morfológico para a análise das formas na paisagem, bem como a ampla cultura geográfica que Sauer move, recuperando o próprio Vidal de la Blache e indo até a antiguidade, destacando as semelhanças de seu projeto disciplinar com o da geografia de Heródoto.Além dessas influências, é preciso evidenciar uma interpretação de que a geografia de Sauer pode ser vista como uma espécie de síntese da geografia alemã, no início do século XX, uma vez que ela incorpora elementos de Schlüter, Hettner e Ratzel mesmo que, a respeito deste último, ele privilegie um viés mais antropológico, deixando de lado um legado vinculado ao projeto político do Estado germânico.

4Para Sauer, a materialidade é consequência da cultura como uma entidade supra-orgância, ou seja, independente da sociedade e dos indivíduos que a compõem. Essa concepção foi adotada da antropologia norte-americana, marcada pelo pensamento filosófico alemão e pelo próprio pensamento geográfico, que, no caso norte-americano, teve forte influência de Franz Boas, antigo discípulo de Ratzel. Com base nessa concepção de cultura, oriunda da antropologia, temos sua famosa frase: cultura é o agente, a área natural é o meio, a paisagem cultural o resultado(SAUER, 1963, p. 343). Sauer identifica o fenômeno cultural como um recorte espacial delimitado em determinado período histórico, tendo ele uma dinâmica clara: uma determinada cultura surge, se difunde, evolui e padece. Assim como o Estado nacional para Ratzel, a área cultural, para Sauer, também é vista metaforicamente como um organismo vivo.

5O objetivo deste artigo é tentar clarificar a intensa ilação estabelecida entre geografia e antropologia no momento de surgimento da geografia cultural, observando como alguns aspectos desses debates dos campos do conhecimento se entremearam. Buscamos enfocar, mais precisamente, os conceitos de área cultural e a cultura como elemento superorgânico que, apesar de debatidos em meados do século XX, no campo da geografia, ficaram por um longo tempo sem discussão sobre seus fundamentos básicos. Ou seja, no tocante à geografia cultural norte-americana ligada a Carl Sauer, surge uma crítica radical à ideia de cultura supraorgânica somente em 1980, quando é publicado o contundente artigo de James Duncan (2003, versão traduzida para o português).

6Na primeira parte do trabalho, situaremos alguns aspectos das origens da visão de cultura no pensamento alemão, esclarecendo características desenvolvidas por Ratzel, Hettner e Schülter. A seguir, veremos as contribuições de algumas concepções de Franz Boas sobre a antropologia, para finalmente analisar as origens e fundamentos do superorgânico de Kroeber, sendo este último um antropólogo que manteve longa proximidade pessoal e profissional com Carl Sauer. Além das fontes de influência em comum, é justamente Krober quem inspira Sauer a utilizar a ideia de supraorgânico, por ele elaborada, para a compreensão do fenômeno cultural.

  • 1 Holzer (2008, p. 143) ressalta a tentativa de Cosgrove em ligar a geografia humanística ao marxismo (...)

7A discussão proposta por Kroeber pode ser aparentemente obsoleta se vista com o olhar de nosso tempo, no entanto, as críticas a sua proposta feitas no âmbito do campo da antropologia foram pouco incorporadas ou analisadas pela geografia cultural. Daí ocorre a grande estagnação mencionada acima, que só finda com os apontamentos de Duncan. O resultado disso é um lapso acerca do debate de cultura que, de um lado, foi substituído pelas reflexões baseadas na fenomenologia com o desenvolvimento da chamada geografia humanística, principalmente sua corrente fenomenológica , e, de outro, significou um distanciamento das discussões sobre cultura. Posteriormente, nos Estados Unidos, alguns geógrafos ligados ao existencialismo, ao marxismo e ao pensamento gramsciano1 engendram sangue novo ao debate acerca da cultura, em um período que recobre o último quartel do século XX. Contudo, muitas das questões levantadas por Kroeber não foram especificamente debatidas na geografia, uma vez que o foco se manteve, em grande parte, na crítica ao superorgânico. Como buscaremos demonstrar no final do texto, para alguns autores o supraorgânico ainda está ativo como uma explicação possível na teoria social, mesmo que ele não utilize mais este nome explicitamente.

As bases germânicas do debate cultural

  • 2 Da mesma forma, para Fichte o reunião do todo nas partes de um organismo carateriza uma condição ún (...)

8Seria praticamente impossível compreender o conceito de cultura sem nos debruçarmos minimamente sobre o pensamento de Johann G.Herder (1744-1803). Ele é um pensador que influenciou fortemente a criação de um conceito de cultura nas ciências humanas, além de ter colaborado para o desenvolvimento da hermenêutica moderna e do romantismo. O seu sistema filosófico tenta se contrapor ao dos pensadores franceses iluministas do século XVIII, de modo a propor uma teoria do desenvolvimento histórico, utilizando-se, principalmente, dos aspectos culturais nacionais. Herder trata os Estados como organismos vivos2, valorizando o caráter singular de cada cultura, o que faz com que ele se liberte de uma concepção de Cultura (também chamada de Civilização) rígida e universal, que consistiria em uma espécie de modelo evolutivo para os valores de todos os povos do mundo (CUCHE, 2002, p. 30-40). Essa metáfora entre Estado e organismo vivo terá uma vida longa entre os geógrafos franceses, como explorou Berdoulay (1982), todavia, tal comparação viceja um valor mais de analogia do que de metáfora.

9O desprendimento de um modelo ideal e hegemônico de civilização é uma concepção corrente na Alemanha do período de Herder e faz parte da estratégia de unificação do território alemão que, por sua vez, buscava sua unidade na relativa diversidade de povos, culturas e regiões (SEEMANN, 2005, p. 10), cuja perspectiva não se pauta apenas em uma única civilização norteadora de todo processo de transformação política.

10Herder demarca, com clareza, o entrecruzamento do meio ambiente com o gênero cultural (ou gênio do povo) em determinadas sociedades. Com base no gênero cultural, Herder tentou definir a posição de cada povo na cultura como um todo, identificando as diversas trocas e influências culturais entre diversas populações. Como ressaltou Etges (2012, p. 35-48), a influência de Herder e seu historicismo foi importante para Carl Ritter (1779-1859) e para a geração subsequente que polarizou a geografia alemã, a saber: Alfred Hettner (1859-1941) e sua proposta de geografia como diferenciação de áreas, Otto Schlüter (1872-1959), que enfocou suas análises na paisagem e, Friedrich Ratzel (1844-1904), com sua proposta comparativa e darwinista acerca das relações entre homem e meio. Como destacamos, Carl O. Sauer (1889-1975), nos Estados Unidos, será um grande conciliador dessas três tradições que se opuseram na Alemanha.

Figura Carl Sauer

Como Franz Boas formou o conceito de cultura?

  • 3 Talvez essa situação se modifique apenas no pós-guerra com a ascensão do neopositivismo, quando a f(...)

11Cabe esclarecer que, na virada do século XIX para o XX, o chamado romantismo alemão, corrente filosófica ligada a Herder, perdeu parcialmente sua força em detrimento de uma mentalidade modernizadora e pragmática, a qual visava lançar a Alemanha como grande potência. Nesse período de grande difusão do darwinismo, a biologia era vista como a ciência que gozava de maior prestígio, o que queria dizer que quanto mais semelhante à biologia, mais cientificidade determinado campo de conhecimento teria3. Tal reação se demonstra clara na postura de O. Peschel, que critica Ritter, vinculando-se ao darwinismo, ao positivismo e introduzindo o ponto de vista morfológico na geografia. Entretanto, apesar dessas preocupações, Peschel não abandona o uso do método comparativo elucidado por Ritter, propondo uma morfologia comparada (OLIVEIRA, 2012, 123-125).

12Ratzel, uma geração antes de Peschel,se preocupou com a modernização científica da geografia e se relacionou profundamente com o darwinismo, conservando, porém, elementos do romantismo alemão, principalmente no final de sua vida, segundo o estudo de Oliveira (2012, p. 130). Comumente, se pensa que Carl Sauer foi o fundador da geografia cultural, mas ele próprio diz não estar evidenciando nenhum tema novo, pois Ratzel [] considerava sua Antropogeographie mais que um estímulo e uma introdução a uma geografia humana que devia fundamentar-se em um estudo da cultura(SAUER, 2000, p. 102). Além das premissas lançadas nessa obra, Ratzel ainda se destaca nos estudos sobre a mobilidade populacional, [a]s condições de assentamento humano e [a] difusão da cultura por meio das vias principais de comunicação(SAUER, 2000, p. 101).

13Claramente, Sauer evoca Ratzel para legitimar e dotar o seu projeto de ciência de um argumento de autoridade. De acordo com Barros (2012), Ratzel foi profundamente influenciado por uma viagem aos Estados Unidos, onde se interessou pelos processos de adaptação das populações chinesas ao novo mundo. Uma vez que a geografia estava em lenta decadência devido ao desgaste do prestígio da obra de Ritter, Ratzel surge no final do século XIX com a aplicação inovadora do darwinismo como uma metateoria explicativa da geografia do mundo. O homem para sobreviver deve se adaptar e se apropriar de seu meio natural e o resultado desse processo é uma alteração profunda da natureza e do próprio homem, uma vez que a dispersão dos grupos humanos causa a diferenciação espacial e social, de forma semelhante ao processo de especiação animal, como colocada por Darwin.

14Ratzel, no entanto, foi influenciado por Mortiz Wagner, que acabou por admitir a seleção natural de Darwin, mas não descartou as explicações de Lamark, ou seja, quanto maior o uso de determinada parte ou característica do organismo, maior o seu desenvolvimento na espécie em questão. Além disso, a herança adaptativa de usos e desusos seria transmitida entre as gerações (BARROS, 2012). A partir dessa herança, surge um viés interpretativo difusionista, ou seja, de que o homem migra e carrega consigo uma experiência que pode ajudar ou dificultar a relação com o próximo meio que ele entrará em contato. A difusão explicaria, por exemplo, porque em tão pouco tempo os Estados Unidos seriam industrializados, uma vez que os migrantes utilizam das técnicas industriais para sua sobrevivência. Neste ponto, o legado de Ritter se faz presente, pois Ratzel considera os pontos de interação entre os continentes como possibilidades de difusão e transformação cultural.

15No entanto, um só meio geográfico poderia dar origem a múltiplos padrões culturais e Ratzel, em claro diálogo com a ecologia, se questiona como o meio pode provocar migrações, influenciar costumes e artefatos culturais, ao mesmo tempo em que a cultura expressa claramente a delimitação de uma área central (core),a partir da qual a difusão ocorre (BARROS, 2012).

16Ratzel não se limitou a fazer análises culturais apenas para sua Antropogeographie, mas as aplicou ao estudo da geografia política. Ele estava empenhado em uma geografia para a consolidação do Estado alemão, porque a Geografia e a Etnologia Alemã receberam grande estímulo pelo processo de unificação nacional, em 1870(HOEFLE, 2007, p. 17).

17Sua proposta não se limita somente à unificação territorial e à eliminação dos traços feudais arcaicos, pois ele propõe um leque de reflexões e opções para o estabelecimento de um império alemão, com sua geografia inspirada no darwinismo e na analogia do estado como um organismo vivo. É importante relembrar que o espaço vital (ou Lebensraum), surge na sua obra Geografia política. Mesmo que um tanto dissociadas em alguns momentos, suas análises culturais podem ser analisadas como complementares à ótica do imperialismo de um país que havia chegado tardiamente na corrida colonial.

18Nesse contexto, os povos nômades, as organizações tribais, as ditas sociedades primitivas, são comparadas a organismos menos complexos que tendem a ser absorvidos por organismos mais complexos (RATZEL, 1987, 90-125). Uma dicotomia interessante é a divisão de povos com e sem Estado, e o enfoque na competição como elemento preponderante da evolução da vida. Tais aspectos serão criticados por geógrafos anarquistas E. Reclus, L. Metchnikoff e P. Kropotkin. Portanto, o conhecimento etnográfico consistiu uma fonte importante de dados para as reflexões de Ratzel, sendo que as ditas sociedades primitivas reportavam às formas elementares do Estado:

A maior parte dos sociólogos estudam o homem como se ele fosse formado no ar, sem ligações com a terra. O erro desta concepção salta aos olhos, verdadeiramente, para tudo o que se refere às formas inferiores da sociedade, porque sua extrema simplicidade os faz relembrar as formas mais elementares do Estado (RATZEL, 1987, p. 203; tradução nossa).

19Para este autor, não existe um Estado sem território e sem fronteira, e, justamente através das formas elementares do Estado, é possível compreender melhor as relações entre o homem e seu solo (RATZEL, 1987, p. 203). Ratzel utilizava uma espécie de método comparativo certamente ecoando Ritter , contrapondo situações geográficas, políticas e moraisdos povos de diversas partes do globo. Sua classificação desses agrupamentos humanos, bem como as reflexões da Antropogeographie foram de grande interesse para os antropólogos que utilizaram amplamente suas análises de difusão da cultura, [enquanto] os geógrafos ocidentais consideraram Ratzel somente como ambientalistaou determinista (SAUER, 2000, p. 102). Destaca-se ainda sua obra Völkerkunde, que apresenta ambiciosa etnologia espacializada do mundo, ricamente documentada e ilustrada(HOEFLE, 2007, p. 16). Ratzel seria um dos precursores do difusionismo alemão, propondo uma extensão espacial do Evolucionismo, uma vez que tenta explicar como inovações tecnológicas e sociais disseminadas entre povos (...) aceleram o ritmo da evolução cultural(HOEFLE, 2007, p. 16). Esse talvez seja um dos primeiros contatos ou uma das primeiras bifurcações entre a geografia moderna e a antropologia.

20Entretanto, se Ratzel adotou aspectos do positivismo e profundamente o darwinismo, a geração seguinte seria marcada por uma crítica intensa à essa primeira corrente de pensamento:

As críticas eram direcionadas às universidades, centros do conhecimento que haviam perdido o idealismo e o humanismo tão característico da cultura alemã, em detrimento de um conhecimento extremamente materialista e positivista, pautado por um ensino mecânico e repetitivo, aliado aos objetivos do Estado em expansão[…]. Esse sentimento de inacabado da academia e da cultura alemã no fin de siècle vai refletir tanto nas manifestações estéticas e artísticas (naturalismo, impressionismo, pré-expressionismo e expressionismo), na filosofia e história (neokantismo, historicismo, Nietzsche) e nos estudos sobre a sociedade urbana e industrial (OLIVEIRA, 2012, p. 126-27).

21O resultado desse processo é que posteriormente a Ratzel, encontramos na geografia alemã pensadores influenciados fortemente pelo neokantismo, que também estavam interessados em uma sistematização e em uma definição clara do campo disciplinar da geografia. De um lado, encontramos Hettner, que defende o projeto da geografia como diferenciação de áreas e, de outro, Schlüter, que defendia a paisagem como objeto da geografia. Os desdobramentos dessa última definição de geografia tem vida longa na geografia alemã, apesar das diferentes nuances interpretativas no que diz respeito aos seus detalhes. Em um texto publicado originalmente em 1950, portanto no pós Segunda Guerra Mundial, Carl Troll demonstra como as paisagens podem ser organizadas segundo uma taxinomia própria, em uma nítida comparação com a biologia (TROLL, 1997, p. 2).

  • 4 Schlüter também como Sauer admite que a geografia morfológica do presente funciona como elemento ch (...)

22Como vimos acima, Peschel já havia introduzido a morfologia na análise geográfica, assim como Schlüter. Contudo, o diferencial será a delimitação rigorosa que Schülter faz do que geografia deve estudar exatamente, limitando-se aos fenômenos visíveis da paisagem. Só se devem ser analisados elementos invisíveis, na medida em que estes expliquem formas materiais da paisagem (SEEMANN, 2004, p. 67-68), um modelo de análise que foi, em parte, adotado por Sauer4 e, também, um artifício utilizado por Schlüter, para não se sobrepor a campos amplos de conhecimento, como a economia e a sociologia. Schlüter não apreciava as formulações de Ratzel e exclui a economia e a política da geografia, pois elas dificultariam a adaptação contínua na organização da superfície terrestre(SEEMANN, 2004, 68).

  • 5 Schlüter teve força de inserção na geografia francesa influenciando, por exemplo, Jean Brunhes.

23Aqui é interessante notar um mecanismo da história da disciplina que muito tem nos intrigado ultimamente: Schlüter, através de Richthofen, se interessa pela geomorfologia e vai gradualmente transpondo o método morfológico do estudo da natureza mais especificamente, das formas do relevo e de fisionomia das plantas para o estudo da sociedade. Mesmo que ele admita que natureza e sociedade são elementos distintos, o método morfológico se aplica para o estudo das formas naturais e culturais. As origens genéticas de tais formas têm explicações e causas completamente distintas, entretanto, sua análise resulta em uma noção de estrutura que sintetiza o objeto analisado. Ressalta-se que o pensamento de Emmanuel de Martonne faz o mesmo movimento, transpondo a observação morfológica do relevo para a descrição e a explicação das formas do tipo de ocupação humana, encobrindo detalhadamente o sítio e seguindo para sua a situação. O resultado desse caminho explicativo também é uma ideia de estrutura (PEDROSA, 2013, p. 44-70)5.

24Tal similitude nos espanta, não só pelo referido fato ter ocorrido em duas escolas nacionais diferentes, mas, também, por estar presente aí, a possibilidade do início de um processo de sofisticação dos instrumentos da análise e teorias da geografia. No caso francês, a concepção de E. de Martonne foi transmitida para A. Cholley, que, por sua vez, influenciou toda uma geração, que incluía Jean Dresch, Pierre George e Jean Tricart (PEDROSA, 2013). Cabe relembrar que Lévi-Strauss, por exemplo, declarou em várias ocasiões que sua concepção de estrutura, que não possuiu uma conotação visível, foi inspirada pelas estruturas geológicas. Mesmo que tal argumento careça ainda de maior investigação, evidenciamos que talvez essa seja uma comparação importante acerca do desenvolvimento do pensamento geográfico e das ciências sociais.

25Dito isso, a principal disputa de Hettner e Schlüter recaía sobre a definição estrita do objeto da geografia, abrangendo, também, suas diferentes posições gnosiológicas. Apesar de ambos os autores serem influenciados pelo neokantismo, Schlüter tinha clareza que não era possível tratar natureza e cultura como um mesmo tipo de conhecimento (SEEMAN, 2004). Além disso, Schlüter queria se ater ao visível, enquanto Hettner via a necessidade explicativa de debater a essência de fenômenos que se desdobravam para além do visível, seja acerca de fenômenos sociais (espirituais como eram chamados na época), que não são evidentes simplesmente pela observação, sejam nas delimitações mais abstratas de recortes regionais (ETGES, 2012, p. 50-55). O objetivo de Hettner era justamente diferenciar as áreas sem excluir a paisagem, mas Schlüter continuava limitado à paisagem ao visível e à dimensão fisionômica (ETGES, 2012, p. 52-55).

  • 6 Cabe destacar que Waibel, também influenciado por Schlüter, o critica e começa a trabalhar com a id (...)

26Carl Troll (1997, p. 3), em um célebre balanço do pensamento geográfico alemão, diz que a paisagem é um conceito da geografia regional e comparativamesmo que nem sempre sua definição tenha sido clara. Troll (1997, p. 2) ressalta que a paisagem tem uma dimensão formal ou fisionômica e uma dimensão funcional ou fisiológica, todavia, até 1950, não era clara a distinção entre área e paisagem. De maneira similar à definição feita acima por Troll, Sauer tentou conciliar as concepções de área e paisagem de maneira integrada, mesmo que a morfologia e a observação do visível continuassem a ter um peso importante em sua obra6. Sua reação contrasta com a postura de Richard Hartshorne que, consolidando uma interpretação do pensamento de Hettner, exclui completamente a paisagem, privilegiando a área como força motriz de uma geografia que tem por definição a diferenciação de áreas da superfície terrestre.

27Sauer, por sua vez, encara a paisagem através da morfologia, como já dissemos, mas não se esquiva da contribuição de Hettner para o desenvolvimento de uma geografia regional, apesar de a cultura ser um fator importante para sua delimitação. Neste momento, a ideia de áreas culturais como recorte de uma determinada sociedade em um meio geográfico, o auxilia na edificação de sua geografia cultural, implicando, desta forma, no aprofudamento do seu diálogo com a antropologia.

A Herança de Franz Boas para a Geografia

  • 7 Esta referência se trata de textos originais de Franz Boas traduzidos para o português sob a organi (...)

28Franz Boas (1858-1942) foi professor de Kroeber e formou-se em geografia, tendo assistido, na Alemanha, aulas de Ratzel. Por ser judeu, de origem alemã, Boas se erradica nos Estados Unidos, onde tem sua obra reconhecida pela comunidade acadêmica, formando muitos discípulos, bem como a escola da História Cultural (CUCHE, 2002, p. 68). Sendo assim, Boas, intrigado com a influência do meio sobre o homem, se dedicou ao estudo do determinismo ambiental, e, para isso, viajou até as comunidades esquimós, onde pôde concluir que o papel dos aspectos ambientais na vida do homem não é uma variável fácil de ser detectada (CASTRO7, 2004, p. 1-20). Como nos aponta Cuche (2002, p. 40), Boas parte para campo como geógrafo e retorna como antropólogo, entretanto, ele nunca esqueceu de sua disciplina de formação, uma vez que são comuns em suas obras as discussões sobre as formulações de autores da geografia, como Hettner, Jean Brunhes, Ritter, Guyot, Ratzel e Paul Vidal de la Blache (CASTRO, 2004, p. 60).

Como Franz Boas formou o conceito de cultura?

29O legado de Ratzel penetrou o campo da antropologia e, curiosamente, Sauer relata ter entrado em contato com este pensador através dos antropólogos formados por Boas (PARSONS, 1976). Sauer tenta negar o determinismo geográfico das interpretações de Ratzel, feitas por Ellen Semple, e, para isso, adota o uso das técnicas como fator de emancipação do meio. Portanto, Boas é um dos responsáveis pela reação ao determinismo fatalista, que nos Estados Unidos teve força intelectual significativa desde os primeiros momentos de institucionalização da geografia. Tal projeto intelectual vai ser retomado por Sauer a partir da obra de Kroeber, que também oferece subsídios para uma crítica ao evolucionismo, de modo a fazer oposição projeto darwinista (HOEFLE, 2007, p. 7 e SEEMANN, 2005, p. 7-8).

30Um dos princípios gerais da antropologia de Boas é o uso do método histórico para a antropologia, questionando as grandes leis evolucionistas da sociedade humana e apontando as limitações do método comparativo, que, segundo ele, era utilizado com pouco rigor pelos antropólogos de sua época (CASTRO, 2004, p. 33-36).

31Como aponta Seemann (2005, p. 10), Boas deseja, através do movimento histórico de cada sociedade, esmiuçar o desenvolvimento particular de cada mudança cultural. Sua crítica ao método comparativo reside nessa ideia, já que duas sociedades podem ter uma organização política idêntica, e, contudo, serem formadas de maneiras e em ritmos totalmente diferentes. Tal ceticismo o encaminha para o uso do método indutivo de pesquisa e para um empirismo exacerbado, com métodos complexos de coleta de dados (SEEMANN, 2005, p. 11-13).

32Boas nos mostra, ainda, que as estruturas psicológicas e a influência do meio ambiente são importantes variáveis a serem analisadas (CASTRO, 2004, p. 33-35). Portanto, uma dada cultura é formada pelos fatores psicológicos, pelo meio ambiente e pela história particular de um grupo humano, que se manifestam através de uma área cultural que deve ser delimitada com muita cautela e embasamento científico. Seu método de análise leva em consideração a reação psicológica dos indivíduos, ou seja, a sua capacidade de absorção ou resistência frente à pressão cultural vivida diariamente, o que supostamente demonstra seu vínculo com a cultura (CASTRO, 2004, p. 66). Nas palavras do próprio autor:

O problema psicológico está contido nos resultados das investigações históricas. Quando esclarecemos a história de uma única cultura e compreendemos os efeitos do meio e das condições psicológicas que nela se refletem, damos um passo adiante, pois podemos então investigar o quanto essas ou outras causas contribuem para o desenvolvimento de outras culturas. Assim, quando comparamos histórias de desenvolvimento, podemos descobrir leis gerais. Esse método é muito mais seguro do que o comparativo, tal como ele é usualmente praticado, porque, em lugar de uma hipótese sobre o modo de desenvolvimento, a história real forma a base de nossas deduções (CASTRO, 2004, p. 37).

33Vemos então como Boas influenciou Sauer, pois se pode compreender a ligação entre a sua geografia histórica e cultural, mesmo que Sauer e sua geografia cultural não tenham enfatizado de maneira profunda a variável psicológica, cara às formulações de Boas. Contudo, a abordagem cultural e histórica se complementam, já que a cultura é apreendida pelo movimento histórico, tornando possível a formulação de leis, não a partir da comparação das culturas e seus valores, mas levando em consideração seus desenvolvimentos históricos. A busca pela história confere uma nova dimensão ao método comparativo, ela direciona o que deve ser comparado, oferecendo uma ferramenta mais acurada para o resgate do movimento histórico da cultura.

34Boas incentivou a realização de monografias sobre determinados povos, mas sua iniciativa não ganhou força, nem produziu um volume substancial de obras. Quanto à continuidade espacial, nota-se que ela se apresenta de forma relativa, uma vez que é muito difícil definir com clareza as conexões espaciais entre as culturas. Dessa forma, o método histórico atingiu uma base mais sólida ao abandonar o princípio enganoso de supor conexões onde quer que se encontrem similaridades culturais(CASTRO, 2004, p. 41), pois somente a história concreta é capaz de revelar as relações entre as culturas. Ainda sobre seu método:

os pesquisadores norte-americanos estão sobretudo interessados em fenômenos dinâmicos da mudança cultural; que tentam elucidar a história da cultura pela aplicação dos resultados de suas investigações; e que relegam a solução da questão final sobre a importância relativa do paralelismo do desenvolvimento cultural em áreas distantes em oposição à difusão em escala mundial e à estabilidade de traços culturais por longos períodos de tempo a uma época futura, em que as condições reais de mudança cultural sejam mais bem conhecidas (CASTRO, 2004, p. 42).

35Portanto, o foco da pesquisa está nas trocas e difusões dos traços culturais, levando em conta as possibilidades de comunicação, de acordo com a continuidade espacial relativizada. Além disso, o pesquisador parte do pressuposto que cada cultura é algo dinâmico, que está sempre em um movimento singular, sendo que contatos entre elas podem causar profundas modificações.

36Boas também discute o conceito de raça e a possibilidade dos componentes genéticos determinarem o comportamento de uma sociedade, condicionando o pertencimento e reprodução de determinada cultura. Contudo, ele desmistifica o conceito de raça, bem como a possibilidade de existirem povos puros, indicando a grande miscigenação entre os indivíduos no curso da história. O darwinismo, até certa medida, colaborou muito com esse tipo de problema, induzindo à existência de raças inferiores e superiores, além de indicar as guerras como momentos de seleção natural. Boas argumenta, ainda, que o comportamento de uma sociedade inteira não pode ser condicionada pela genética e que a cultura passada entre gerações influencia muito mais o comportamento individual do que a herança genética (CASTRO, 2004, p. 60-82).

37Devido ao seu apelo empirista em busca da materialidade histórica e cultural, sua antropologia mantém contato com a arqueologia, uma fonte importante de dados concretos. Nota-se que o mesmo ocorre com a geografia histórica proposta por Sauer, o que se torna evidente na sua proposta de trabalho de campo, a qual busca formas antigas e ruínas na paisagem para a reconstituição de um cenário passado. Boas enfatiza que é importante buscar relações entre os aspectos estudados no interior de cada sociedade e que, portanto, não se deve tratar economia, religião e linguagem de forma separada, sem procurar o fio condutor que liga essas características. Isso, no entanto, resultou em uma abordagem que frequentemente situou as esferas sociais da economia e da política dentro da cultura, mais ou menos isolada, de determinados povos. As informações do quadro social esboçado pelo método boasiano são complementadas com o conhecimento sobre o quadro físico-natural, que confere uma explicação mais complexa sobre a vida cultural de cada povo.

38Ainda sobre o determinismo, Boas está interessado em saber o quanto o ambiente auxilia ou atrasa o desenvolvimento técnico e mostra que, mesmo em lugares com a abundância de recursos, são a técnica e a ação do homem os responsáveis pela exploração da natureza.Melhor dizendo, não basta a presença dos recursos naturais, é preciso saber usá-los com técnicas adequadas e, ainda, que não haja nenhuma interdição cultural, uma vez que as condições ambientais podem estimular as atividades culturais existentes, mas elas não têm força criativa(CASTRO, 2004, p. 61). As culturas são influenciadas, mas não são necessariamente uma resposta direta ao meio ambiente. A natureza, mesmo que vista em um segundo plano, não deixa de ter um papel no desenvolvimento da cultura, enquanto as relações espaciais dão apenas a oportunidade para o contato; os processos são culturais e não podem ser reduzidos a termos geográficos(CASTRO, 2004, p. 62). Observa-se então uma distinção clara entre geografia e análise da cultura, mesmo que elas se inter-relacionem no mundo empírico.

39No entanto, as áreas culturais têm um caráter eminentemente geográfico com um ponto central de difusão, onde a cultura aparece com seu vigor máximo. Em contraposição, temos as áreas periféricas, onde podemos notar uma mistura de traços culturais, provenientes de outras áreas culturais (Cuche, 2002, p. 68-69):

o conceito de área cultural funciona’ bem no caso das culturas indígenas da América do Norte, pois ali áreas culturais e áreas geográficas são mais ou menos coincidentes. Mas, em muitas outras regiões do mundo, seu caráter operatório é discutível, pois as fronteiras são bem menos nítidas e as áreas culturais só podem ser definidas de maneira aproximativa, a partir de um número pouco significativo de traços comuns. No entanto, empregada de maneira flexível, a noção não é desprovida de utilidade descritiva (CUCHE, 2002, p. 69).

40Aqui podemos detectar as limitações da área cultural um problema que também se aplica à obra de Sauer face à sociedade moderna. Entretanto, é interessante notar que a concepção de área cultural é muito similar à teoria das localidades centrais (SPOSITO, 2003, p. 179-181), já que, segundo esta teoria, temos a area core, quehierarquiza o restante de região econômica. Se compararmos a teoria dos lugares centrais de Christaller, a teoria de von Thünen, ou algumas interpretações preliminares da sociologia urbana da Escola de Chicago, poderemos notar que elas se pautam em modelos abstratos ideais, que encaram o espaço como um elemento dotado de uma estrutura que organiza fenômenos que perdem intensidade ou mudam de natureza, do centro para a periferia. O conceito de área cultural não chegou a ser aplicado nas primeiras pesquisas empíricas de Boas e não conformou realmente uma divisão das áreas com um amplo resultado cartográfico, por exemplo (SEEMANN, 2005, p. 15). Dessa maneira, foram delineadas ‘áreas culturais, com povos de estilos de vida semelhantes que são estudados com base na história local(HOEFLE, 2007, p. 18). Além disso, seu trabalho é marcado pela:

descrença na descoberta de leis naturais que governam o comportamento humano, a rejeição de uma unidade psíquica comum para toda a humanidade em qualquer época e lugar, o foco na individualidade e diversidade dos fenômenos e não em sua semelhança e universalidade, e a ênfase no desenvolvimento histórico real (indução) em vez de conjecturas e especulações (dedução) (SEEMANN, 2005, p. 11-12).

41Na sua proposta antropológica, existe um distanciamento de uma explicação holística universalizante, sendo as diversas culturas apreendidas em sua especificidade, como um elemento único. Da mesma forma, a relação entre indivíduo e cultura deve se apresentar de maneira bem delineada, uma vez que os próprios indivíduos são os responsáveis pela difusão e dinâmica da cultura, seja por meio de sua psicologia e visão de mundo, seja em razão de sua relação com o restante da sociedade e o meio ambiente.

  • 8 É interessante notar que o marxista Karl A. Wittfogel, exilado da Alemanha nazista, se insere no gr (...)

42No final de sua carreira, Boas defende a conservação e manutenção de todas as culturas ameaçadas, além do respeito e tolerância com sua diversidade. Da mesma forma, Carl Sauer adotará uma postura similar, sem que, entretanto, da mesma forma que Boas, problematize até as últimas consequências o extermínio das populações indígenas, o caráter imperialista ou o uso político de determinados estudos culturais. Além disso, Boas fornece todo o aparato para a constituição e perpetuação da antropologia americana, inspirando a escola da História Cultural, que gerou grandes pensadores como o próprio A. Kroeber ou o psicólogo e antropólogo Clark Wissler8. A preocupação maior da escola era dar continuidade à temática da distribuição, contato e, sobretudo, a configuração das culturas, refinando os conceitos desenvolvidos pelos etnólogos difusionistas alemães do século XIX.

  • 9 A difusão, na geografia, também ganhou muita relevância na época de ascensão da nova geografia. O p (...)

43Mesmo com um número significativo de inovações, os autores da escola da História Cultural foram muito criticados pelos seus pares, já que o conceito de difusão sofreu distorções em alguns casos, apesar do grande rigor teórico e empírico herdado de Boas9. Entretanto, como nos indica Cuche (2002, p. 67-70), os boasianos elaboraram o conceito de modelo cultural, que se refere aos mecanismos utilizados pela cultura para se adaptar ao meio ambiente.

44Uma crítica importante indica que Boas acaba por gerar “’uma Psicologia Social pseudocientífica empobrecidacomo resultado de um empirismo que era tão extremo que se tornou prejudicial ao progresso da disciplina’”(WAX apud SEEMANN, 2007, p. 7). Outros acusam Boas de não ter empenhado esforços para consolidar uma teoria, tendo em vista o rico material coletado ao longo de anos de pesquisa (SEEMANN, 2007, p. 7).

45Ao manter o foco nas relações entre as culturas, a escola da História Cultural contribuiu para avanços sobre o esclarecimento das trocas culturais e do processo de aculturação, o que gerou uma melhor elaboração do conceito de empréstimo cultural. Uma das conclusões de Boas e de seus discípulos é que tudo depende de quem oferece e quem recebe os traços culturais específicos (CUCHE, 2002, p. 68-70).

Kroeber e a natureza da Cultura

46Ao iniciar o debate sobre a cultura, Kroeber faz uma espécie de abstração, remontando às origens da vida. Sendo assim, considera que o desenvolvimento da vida humana começa no nível inorgânico, segue para o orgânico e finalmente para o nível social ou cultural. Kroeber reconhece a cultura como um nível particular, uma ordem ou uma emergência dos fenômenos naturais:

o nível [cultural] é marcado por uma certa organização distintiva de seus fenômenos característicos. É de supor que a emergência dos fenômenos da vida, a partir da anterior existência inorgânica, seja a segregação mais antiga e mais básica de uma ordem ou nível. Semelhante a emergência não quer dizer que os processos físicos e químicos sejam suprimidos mas sim que novas organizações ocorrem no novo nível (KROEBER, 1993, p. 11).

47Ao passarmos de um nível para outro, mudam as características dos fenômenos, mesmo que eles estejam inter-relacionados. Sucessivamente, temos o surgimento dos fenômenos inorgânico, orgânico e social, que criam uma grande interdependência entre si, sendo o mais complexo chamado de social, supraorgânico, superindividual ou superorgânico. A inovação de Kroeber consiste no fato de instrumentaliza-lo para isolar os fatores culturais e identificá-los dentro dos fenômenos sociais uma divisão criticada por Boas. Dessa forma,Tylor definiu a cultura, Boas avaliou com grande justeza muitas de suas propriedades e influências, mas a tese de um nível cultural distinto não interessava a nenhum deles(KROEBER, 1993, p. 13).

Figura Alfred Louis Kroeber

Como Franz Boas formou o conceito de cultura?

48De acordo com sua visão da ciência antropológica, a separação analítica da cultura foi seu grande avanço ou sua ideia original, mas muitos acusaram tal concepção de possuir um certo misticismo, ou seja, de estar distante de uma formulação científica pouco clara (KROEBER, 1993, p. 13). A sua maneira característica de tomar a vida, o espírito, a sociedade e a cultura de forma separadas, como um elevado grau de consciência, levam a deduzir que tais fenômenos funcionam de forma autônoma. Contudo, o que se busca na realidade é um modo de análise que resulte na obtenção de dados culturais puros, identificando-os como algo separado da natureza:

Só por meio de uma abordagem cultural de fato dos fenômenos culturais é possível indagar algumas das suas propriedades mais fundamentais. Até que ponto se pode proceder a uma abordagem tão pura sem ter consciência explícita dela é uma coisa que, provavelmente, varia com fatores pessoais. Não obstante, parece-me que, se uma pessoa pretende ter uma perspectiva largamente teórica ou filosófica a propósito da cultura, não pode evitar como ordem distinta de fenômenos da natureza (KROEBER, 1993, p. 13).

49A tentativa de apreender a cultura em si ressalta-se que, como Boas e Sauer, Kroeber também vê na arqueologia a fonte de dados culturais puros e brutos – é condicionada pelo acúmulo de eventos passados, o que nos releva o peso da história na compreensão da dinâmica cultural. Ao se subtrair os fatores históricos, se elimina um componente de maior dimensão no processo de análise, justamente, aquele que permite uma integração dos fenômenos com a cultura (KROEBER, 1993, p. 10-13).

50O contexto cultural e histórico se localiza no espaço e no tempo, possuindo uma sequência, que ocorre de uma forma estritamente acidental. Kroeber, de maneira muito próxima a seu mestre Franz Boas, não busca na relação com a história uma lógica ou sentido único, mas o reconhecimento das qualidades e os padrões de organização particulares. A qualidade cultural pode ser entendida como reconstituição da história, de forma a permitir uma apreensão do movimento da sociedade.

51Além disso, Kroeber se posiciona contrário a uma dicotomia drástica entre o método nomotético e ideográfico, pois as duas abordagens poderiam ser utilizadas para qualquer fenômeno da sociedade (KROEBER, 1993, p.13). Seu trabalho busca os padrões qualitativos (ou históricos) da totalidade da cultura, que podem ser alcançados parcialmente por meio dos aspectos psicológicos ou do ethos de cada grupo (KROEBER, 1993, p. 14). Certamente, os valores morais constituem um ingrediente essencial da cultura e, mesmo possuindo forte teor de subjetividade, eles podem ser abordados de forma objetiva. Dessa maneira, é possível fazer associações e correlações, ou seja, estudos comparativos entre as manifestações dos sistemas de valores possuídos por diversas culturas. Assim, temas como ideologia ou religião são importantes para essa proposta, porém o relativismo que permeia o pensamento de Kroeber defende a comparação dos valores culturais, ressaltando sua eventual similitude, sem que exista jamais uma hierarquização. Outra premissa importante para o relativismo é de que qualquer fato cultural deve ser avaliado de acordo com os valores da cultura a qual se faz parte. Esse é um desejo de investigação nem sempre concretizado, pois existe uma grande dificuldade de se afastar todo tipo de valor cultural do pesquisador, de maneira a torná-lo absolutamente neutro.

52A respeito da totalidade cultural, ou seja, dos todos culturais, o autor nos indica e critica os trabalhos de sua época:

os todos culturais apresentam uma série de problemas: no que se refere à sua distinção ou continuidade, por exemplo, ao seu grau de consistência ou integração interna à sua natureza, e ao que contribui para as descontinuidades e integração que evidenciam. Os antropólogos adquiriram uma habilidade considerável na apresentação de todos culturais de dimensão tribal, como unidades discretas, tal como em seguir a circulação material e de formas entre as culturas; mas têm-se preocupado pouco com os problemas de segregação exterior e consciência interna, em particular de civilizações grandes (KROEBER, 1993, p. 16).

53É interessante notar que para Kroeber, uma cultura entendida como parte do todo cultural é um dado próprio de determinado grupo e não fruto de uma geração de indivíduos vivos, mas daqueles que os procederam.

54De acordo com Kroeber, alguns poucos valores morais possuem uma faceta universal que alcançam um patamar fixo, pan-humano ou quase absoluto. Temos, então, algumas ideias que são recorrentes em diversos grupos humanos e que podem ser admitidas como universais, contudo, nenhuma cultura possui valores perfeitos ou imperfeitos. A descoberta do valor universal é fruto de longas análises e comparações, e, quanto a Kroeber, este também utiliza o método comparativo e o relativismo cultural, na tentativa de forjar um conjunto coerente de valores recorrentes em todas as culturas (KROEBER, 1993, p. 13-15).

55Quanto à observação social, temos o uso de outros níveis de análise, o que denota o desejo de uma teoria social mais ampla.Primeiramente, a sociedade e a cultura são os dois componentes diferentes que moldam os indivíduos, sendo estes responsáveis pela formulação da consciência psicológica ou da personalidade, o que evidencia o caráter indissociável entre sociedade, cultura e psicologia, elementos estes componentes dos níveis de análise social para Kroeber. Sobre isso, registra-se, ainda, que a opção do autor é tratar cada um dos mencionados elementos de maneira isolada, a fim de se obter uma melhor eficiência na produção do conhecimento, de modo a suspender alguns problemas de método:

uma sintetização prematura e em curto-circuito é, desse modo, evitada, por meio de discriminação que surge associado nos fenômenos e deslindando, do emaranhado que a actualidade nos apresenta, um nível de factores de cada vez e vendo até onde é possível segui-los nessa qualidade, antes de os voltar e a prender numa teia maior de compreensão, juntamente com outros fios (KROEBER, 1993, p. 17).

56Assim, verifica-se uma preocupação em se separar os fatores sociais dos individuais, visando a obtenção de dados estritamente culturais, para, posteriormente, relacioná-los entre si. Ademais, sociedade, cultura e indivíduo são como “peças” da máquina social que devem ser desmontadas, compreendidas e depois remontadas pela análise de seu funcionamento, sempre procurando não ignorar os elementos do quadro natural, porque apesar destes exercerem influência sobre alguns aspectos, os mesmos nunca determinam seu comportamento e evolução da cultura (KROEBER, 1993, p. 16-18). A cultura, como um dos níveis de análise, se apresenta de maneira independente da sociedade, podendo-se tomar, como exemplo disso, a cultura egípcia: mesmo que os egípcios da antiguidade não existam mais, os seus valores estéticos ainda estão impregnadas nas paisagens do entorno do seu sítio original. Sua cultura monumental, seus escritos, seus ensinamentos e organização social ainda nos suscita curiosidade e vislumbramento, sendo assim, pode-se dizer, em suma, que apesar do fato da cultura egípcia estar em uma fase avançada e permanente de decadência, ela ainda é capaz de se fazer notar. Nesse sentido, a cultura supraorgânica se apresenta como uma espécie de entidade autônoma capaz de se manifestar independente da sociedade e dos indivíduos que estiveram ligados a ela, considerando-se que a cultura é uma dimensão da sociedade que desfruta de uma relativa independência e autonomia.

57Em busca de uma solução para o confronto entre os conceitos de civilização e cultura, Kroeber sempre leva em consideração os contextos históricos das relações e das origens das formações sociais. Para Kroeber, a história é a base de todas as ciências humanas e funciona como crítica à razão iluminista e ao modelo positivista de ciência.

58Cabe ressaltar, também, que essas ideias são absorvidas e trabalhadas por Sauer, pois para ambos os autores a visão de ciência está muito próxima a uma ciência nomotética, que tenha base histórica e que considere a cultura como uma característica superorgânica, ao mesmo tempo, não desprezando os estudos idiográficos. Tendo-se em vista que o superorgânico é utilizado no sentido em que há uma superação das limitações orgânicas do animalhomem por meio da técnica, da cultura e da sociedade, pode-se dizer que o mesmo consiste em um fenômeno que se desenvolve e ultrapassa as diversas gerações, sendo visto, portanto, com um certo grau de independência dos indivíduos e do grupo social. Tal conformação, de suma importância, é encarada como experiência coletiva historicamente acumulada, apesar de sua relativa impessoalidade: "a visão cultural não é só colectiva, é também, quase inevitavelmente, de longo alcance, porque a dimensão do tempo lhe acrescenta muita coisa, conferindo, aos fenômenos a qualidade de dinamismo, fluxo ou crescimento" (KROEBER, 1993, p. 18). Com isso, podemos constatarnão é possível descartar o paralelismo entre essas contribuições e as reflexões de Ratzel sobre a herança adaptativa.

59Novamente, a cultura é vista sob esta ótica histórica, isto é, como um organismo que tem seu nascimento, desenvolvimento e declínio, seguido do surgimento de um novo padrão. Sobre o determinismo frente ao livre-arbítrio do desenvolvimento humano, Kroeber conclui que esta é uma questão sem uma resposta científica e que a influência do meio deve ser observada na realidade, sem que sejam elaboradas abstrações ou possibilidades que não correspondem ao empírico (KROEBER, 1993, p. 20). Contudo, Kroeber argumenta que a cultura é a superação do nível orgânico e que todos os fenômenos culturais [são] parte de um processo natural e deve ser visto cada vez mais no contexto da natureza(KROEBER, 1993, p. 21). O autor usa de tal artifício para superar essa cisão, entre natureza e sociedade, a qual ele considera empiricamente artificial, já que os níveis de existência são interdependentes.

60Dentro da antropologia norte-americana se criticou, principalmente, a ênfase dada aos valores morais que resultam em um retrato estável (ou até mesmo imutável) da cultura, cenário este que faz com que se esconda a faceta dinâmica da cultura, que se transforma e reage às novas circunstâncias impostas pelos acontecimentos sociais ou mesmo pelas mudanças naturais (CLAVAL, 2002, p. 21 e CUCHE, 2002, p. 68, 80-87). Porém, como vimos anteriormente, Boas e Kroeber buscavam alcançar justamente uma forma de análise da cultura que não a considerasse como estática.

61Além disso, a ideia do superorgânico consistiu em um dos principais pontos debatidos pelos antropólogos e, posteriormente, pelos geógrafos que buscaram novas alternativas. Nesse aspecto, Cuche pontua a crítica dos antropólogos feitas a Kroeber:

O essencialismo ou substancialismo, que consiste em conceber a cultura como uma realidade em si – crítica freqüentemente dirigida aos culturalistas – é uma crítica que se aplica somente a Kroeber, que considerava a cultura como ligada ao âmbito do ‘super-orgânico’ (...) Kroeber atribuía conseqüentemente à cultura uma existência própria, independente da ação de indivíduos e fugindo ao seu controle (CUCHE, 2002, p. 87).

62Ato contínuo, antes de encerramos, cabe ainda uma provocação. As teorias pós-mondernas utilizam de modo amplo o relativismo entre cultura e superorgânico, que pode ser visto por muitos como uma teoria obsoleta, diante da possibilidade de comparação à ideia foucaultiana de discurso. Sobre isso, nos provoca Marshall Sahlins:

O indivíduo, escreveu White, é desse ponto de vista [da teoria supra-orgânica] como uma aeronave sem piloto, controlada do solo por ondas de rádio. E, no entanto, basta substituir ‘cultura’ por ‘discursona seguinte passagem do atualíssimo Foucault para sermos levados de volta ao obsoleto White […] Ao ditar, seletivamente, o que pode ser percebido, imaginado ou exprimido, o discurso’ é o novo super-orgânico sob uma forma ainda mais coativa, como efeito de um poder’ que está em toda parte, em todas as instituições e relações cotidianas. (SAHLINS, 2004, p. 82-83).

63A ideia de discurso para Foucault não está tão distante assim de uma entidade superorgânica, uma espécie de força mística que comanda os indivíduos. Essas duas similaridades nos fazem pensar que talvez não seja por acaso que o pós-modernismo ou o pós-estruturalismo originário na França, muitas vezes com grande enfoque nos aspectos culturais, tenha sido absorvido com tanta rapidez pela intelectualidade norte-americana, como demonstrou Cusset (2005).

64Com o intuito de sintetizar o desenvolvimento até aqui apresentado, segue abaixo um quadro síntese das ideias sobre cultura, desde Herder até Sauer:

Quadro 1 – Influência dos antropólogos na geografia cultural

Último quartel do séc. XIX

Primeiro quartel do

século XX

Herder

Boas

Kroeber

Sauer

Abandono do conceito de civilização ou cultura universal

História como um elemento fundamental para o movimento da cultura

Preocupação em isolar os fatos culturais

Preocupação com o modo de vida de cada sociedade

Foco nas culturas nacionais

Influência do pensamento geográfico

Superorgânico: cultura como uma entidade essencial e com certa independência da sociedade

Relação homem-meio pautada nos impactos e adaptações dos modos de vida particulares

Preocupação com a unificação alemã

Abordagem através de estudos monográficos de cada cultura

Grande ênfase nas variáveis históricas

História como elemento central para compreender a cultura

Resgate histórico da cultura

Níveis de análise: aspectos psicológicos, antecedentes históricos e quadro natural

Níveis de análise: sociedade, cultura e psicologia

Níveis de análise: paisagem natural e paisagem cultural

Estado como um organismo vivo

Áreas Culturais e Difusionismo

Cultura como valores morais com pouco potencial para modificações

Áreas Culturais e Difusionismo

Cultura como um elemento não redutível a termos espaciais

Cultura analisada sob a perspectiva das ideias de cada povo, mas principalmente a partir de sua vida material

Cultura como agente transformador da paisagem

:

poder-se-ia distinguir duas posturas principais dentre as diversas orientações que lidam com sistemas de fatos e de representações comumente recobertos pelo conceito mais abrangente de cultura. De um lado, a problemática kantiana que encontra seus herdeiros em Cassirer, Sapir, inclusive Durkheim e Lévi-Strauss, considera a cultura – e por extensão todos os sistemas simbólicos, como a arte, o mito, a linguagem, etc. em sua qualidade de instrumento de comunicação e conhecimento responsável pela forma nodal de consenso, qual seja o acordo quanto ao significado dos signos e quanto ao significado do mundo. De outro, tende-se a considerar a cultura e os sistemas simbólicos em geral como um instrumento de poder, isto é, de legitimação da ordem vigente. Refere-se, neste caso à tradição marxista e à contribuição de Max Weber que, a despeito desta aproximação, acham-se separados por outros tantos motivos? (MICELI, 2001, p. VIII).

65Nos arriscamos, ainda, a indicar que Boas e Kroeber se situem na primeira tradição indicada. A marca do kantismo está presente em Boas e Kroeber, bem como a contraposição ao evolucionismo e um distanciamento da discussão sobre o poder e sua dinâmica social. Da mesma forma, é possível relacionar a concepção de cultura supraorgânica com uma concepção de estrutura estruturada, ou seja, a cultura tem uma organização rígida e estática que pode ser pouco modificada pelos indivíduos que dela fazem parte, portanto, eles são moldados pelas contingências culturais a que estão expostos. Na posição oposta à concepção de estrutura estruturada, encontramos a de estrutura estruturante, noção que legitima o poder do indivíduo em fazer a história e alterar as contingências herdadas da geração precedente.

66Independentemente de uma tentativa de classificação, é evidente que Sauer, Boas e Kroeber trabalham com conceitos e ideias que têm raízes na geografia e no pensamento romântico alemão: o difusionismo cultural, os todos culturais como sistemas mais ou menos fechados, a valorização da história, a rejeição ao determinismo, o vitalismo, as áreas culturais e o papel atribuído à técnica. Isso nos demonstra como a antropologia e a geografia do final do século XIX e início do XX tem muitos elementos em comum e, de certa forma, uma sobreposição de seus objetos de estudo. Não é possível negar o fato de que geógrafos de renome fizeram carreira ou obtiveram um reconhecimento importante na antropologia: F. Ratzel, F. Boas, Karl A. Wittfogel são exemplos disso. Defendemos o fato de que recuperar essa rica herança de diálogo interdisciplinar nos permitirá repensar as tradições geográficas, bem como problemas epistemológicos da geografia que se fazem presentes contemporaneamente.

67Assim como a geografia clássica de Vidal de la Blache, a tradição boasiana vê que a natureza não determina a sociedade mas lhe imprime uma marca, já que as culturas tradicionais estão intimamente ligadas com o seu meio original. Para essa tradição de pensamento, a técnica contorna os empecilhos da natureza e a modifica, porém, muitas vezes a cultura é interpretada como elemento isolado da sociedade. Mesmo que exista uma imperativa busca pelos antecedentes históricos de determinada sociedade, a cultura não é vista dentro de seu próprio tempo, ou seja, a obsessão por dados culturais puros não só isola a cultura da dinâmica social total, como também a priva de sua situação histórica contemporânea e das contradições em que ela está submetida ao se aculturar.

68Talvez, a falta de uma divisão mais significativa de áreas culturais nos EUA tenha se dado pela ausência de uma divisão estritamente regional das monografias promovidas por Boas, pois claramente o foco da pesquisa se pauta mais na cultura em si do que no recorte espacial rígido. Como dissemos acima, a antropologia cultural norte-americana não problematizou até as últimas consequências o desaparecimento das sociedades indígenas do continente, apesar da nítida simpatia pelos valores humanos e pelas culturas estudadas. Muito provavelmente, seria difícil delimitar com rigidez o território de tais sociedades que estavam em via de desaparecimento ou de aculturação. O vitalismo cultural pode ser interpretado como uma justificava mais ou menos natural para culturas que estavam desaparecendo frente à modernidade. Assim, a cultura que nasce, vive e morre endossa as transformações sociais, apesar da simpatia para com os autóctones e o relativismo, que pode ser outro elemento de esquiva à reflexão política do contato cultural entre as sociedades.

69Mesmo diante de um mundo globalizado, talvez a ideia de área cultural ainda tenha algum valor na atualidade. Ela poderia ser aplicada para dar concretude aos processos da geografia cultural. Independentemente dessa possibilidade, podemos observar como se manifesta na antropologia uma tensão entre a concepção idiográfica e nomotética da ciência, ilustrada nas diferenças de abordagem de F. Boas e A. Kroeber. Da mesma forma, o dilema sobre o papel da influência do meio na vida social é uma outra preocupação similar. Por fim, se dissemos no início do artigo que Sauer sintetiza várias posturas da geografia alemã, da mesma forma, poderíamos indicar que Kroeber propõe uma abordagem que usa vários elementos de tradições antropológicas precedentes. Caberia, no futuro, justamente investigar porque houve um distanciamento entre antropologia e geografia, se ambos os campos têm raízes em comum e, pelo menos no caso norte-americanos, tiveram um desenvolvimento tão sinérgico. Será que tal distanciamento ocorre por razões epistemológicas ou institucionais? Ou ainda por ambos os motivos?

Qual o conceito de cultura criado por Franz Boas?

A cultura era conceituada como resultado do pensamento racional do homem, manifesto em diferentes graus, dentro de uma escala evolucionista. Encarava-se a história cultural como processo unilinear e universal, cujas expressões peculiares a cada sociedade, em dado momento, refletiam o seu estado de desenvolvimento.

Como Franz Boas concebia o estudo da cultura?

A noção de cultura é pluralista e embasada em características históricas e sociais, e não biológicas. Boas foi fundamental para que concepções racialistas, que atribuíam certos comportamentos e traços culturais a características físicas de um povo, fossem suplantadas.

Por que o antropólogo Franz Boas investia no conceito de cultura *?

2 – Franz Boas investiu no conceito de cultura para combater a ideia de evolucionismo. Ou seja, para Boas, se avaliava a cultura e se descrevia a sociedade. As sociedades, cada uma com sua cultura, não são mais nem. menos evoluídas.

Como Boas explicava as diferentes culturas?

Boas pensava as diferentes culturas como parte da cultura Egípcia, que difundiu seus traços culturais por todo o mundo. 2) Diferente do método comparativo, que tem um caráter generalizado, Boas propôs um estudo particular das sociedades, que se configurou como o principal atributo do particularismo histórico.