Decis�o Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justi�a: Relat�rio I – Por apenso � ac��o especial de liquida��o de heran�a vaga em benef�cio
do Estado, instaurada pelo Minist�rio P�blico na sequ�ncia dos �bitos de AA, ocorrido em 28.11.1997, no estado de solteira, e de sua m�e BB, falecida no estado de vi�va, em 24.01.1998, que corre termos na Inst�ncia Local de Montemor-o-Velho/comarca de Coimbra, CC e mulher DD vieram reclamar cr�ditos no
montante global de €36.517,32, alegando que, enquanto familiares daquelas, desde 1946 at� � data dos respectivos �bitos prestaram alimentos e servi�os v�rios e custearam despesas das falecidas, que descriminam e que ascendem ao valor supra referido, sendo pois titulares desses cr�ditos sobre a heran�a. O Minist�rio P�blico contestou por impugna��o e excepcionou a prescri��o dos cr�ditos reclamados relativos aos anos de 1946 a
1994. No despacho saneador, foi a excep��o julgada improcedente e, inconformado com a decis�o, o Minist�rio P�blico apelou, com �xito, tendo a Rela��o de Coimbra decidido pela prescri��o dos cr�ditos reclamados referentes ao per�odo entre 1946 e 05 de Novembro de 1994. Agora, inconformada, interp�s a reclamante DD recurso de revista, finalizando a sua alega��o, com as conclus�es que se
transcrevem: 1. Conforme se alcan�a dos autos, EE faleceu a 23 de Fevereiro de 1946 e AA faleceu a 28 de Novembro de 1997, no estado de solteira, sem descendentes e sem ter feito testamento ou doa��o por morte. 2. � data da morte deixou como �nica e universal herdeira a sua m�e, BB, que veio a falecer a 24 de Janeiro de 1998, no estado de vi�va, sem descendentes ou ascendentes
e sem que lhe sobreviessem irm�os ou seus descendentes. 3. Por douta senten�a proferida nos autos principais transitada em julgado em 27.02.2012, declararam-se vagas para o Estado as heran�as abertas por �bito de AA e de BB. 4. Posteriormente os reclamantes CC e mulher, DD, notificados que foram nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 1134�, n.� 1 do C�digo de
Processo Civil (CPC), na redac��o ent�o aplic�vel (ora artigo 940�). 5. Na sequ�ncia de tal notifica��o, por apenso aos autos de ac��o especial de liquida��o de heran�a vaga em benef�cio do Estado, das heran�as de AA e de BB, CC e mulher, DD, vieram na qualidade de credores das heran�as, reclamar cr�ditos no montante global de 36.517,32€, constitu�dos desde 23 de Fevereiro de 1946 at� � data da interposi��o do
requerimento. 6. Notificado, o Minist�rio P�blico deduziu impugna��o, arguindo a excep��o perempt�ria de prescri��o relativamente aos cr�ditos reclamados reportados aos anos de 1946 a 1994, com base no disposto no artigo 309� do C�digo Civil. 7. Os reclamantes responderam � excep��o, pugnando pela sua improced�ncia, o que veio a ser decidido, no saneador, por se entender
que antes do ac�rd�o do STJ a declarar vagas as heran�as, os reclamantes n�o podiam exercer os seus alegados direitos sobre as mesmas. 8. Contudo, a Rela��o de Coimbra, na sequ�ncia do recurso do Minist�rio P�blico, considerou que o prazo prescricional come�ou a correr ininterruptamente com a pr�tica dos v�rios actos que constituem a fonte da obriga��o e n�o com o tr�nsito do ac�rd�o do STJ. 9. Ocorre, por�m, que a reclamante apesar de muito respeitar o douto ac�rd�o proferido em segunda inst�ncia com o mesmo n�o concorda nem se conforma, porquanto considerar que a douta senten�a tirou a decis�o correta e legal. 10. Com efeito o douto despacho proferido aplicou ao caso dos autos o n.� 1 do artigo 306� do C�digo Civil que estipula que o prazo de prescri��o s� come�a a correr quando o direito puder ser
exercido. 11. E efectivamente os reclamantes n�o podiam exercer o seu direito antes de proferido o ac�rd�o do Supremo Tribunal de Justi�a, que apenas em 27.02.2012 se clarificou definitivamente que seria o Estado o benefici�rio das heran�as. 12. E assim tendo presente a situa��o dos autos o douto despacho julgou que a prescri��o apenas se iniciou ap�s a prola��o do ac�rd�o
do STJ, porque "...entre a data dos �bitos e o tr�nsito em julgado da senten�a que declarou vagas as heran�as em benef�cio do Estado n�o podia ser exercido o direito dos reclamantes...". 13. A contagem do prazo de prescri��o de (20) vinte anos, como de resto contabiliza o Minist�rio P�blico, iniciou-se em 27.02.2012 e s� terminar� em 27.02.2032. 14. De modo que tendo os
reclamantes apresentado o seu requerimento de reclama��o de cr�ditos em 31.10.2014, o seu direito n�o se acha prescrito como de resto muito bem se decidiu em primeira inst�ncia. 15. Mesmo que assim n�o se entenda, o que n�o se concede mas por dever de oficio se concebe, sempre se acrescentar� o j� alegado em sede de resposta � excep��o, designadamente que por for�a do formalismo especial do presente apenso os reclamantes apenas
poderiam deduzir a sua reclama��o ap�s notifica��o judicial para os termos e os efeitos do artigo 940� do CPC (Novo), notifica��o que apenas ocorreu em 22.10.2014. 16. Pelo que mesmo aplicando-se ao caso dos autos o artigo 322� do C�digo Civil que refere a prescri��o dos direitos de heran�a ou contra ela n�o se completa antes de decorridos (6) meses, depois de haver pessoa por quem ou contra quem, os direitos possam ser invocados,
ainda assim a reclama��o de cr�ditos foi apresentada muito antes do prazo de prescri��o de haver complementado. O Minist�rio P�blico ofereceu contra-alega��o a pugnar pelo insucesso da revista. Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir da �nica quest�o suscitada no recurso e que versa sobre a prescri��o dos cr�ditos reclamados anteriores a 1994. II - Fundamenta��o de facto A factualidade a ter em conta � a seguinte: 1. AA faleceu a 28.11.1997, no estado de solteira, sem descendentes, n�o tendo feito testamento ou doa��o por morte. 2.
� data da morte deixou como �nica e universal herdeira a sua m�e, BB, que veio a falecer a 24.01.1998, no estado de vi�va e sem descendentes ou ascendentes, sem que lhe sobreviessem irm�os ou seus descendentes, n�o tendo outorgado testamento ou feito doa��o por morte. 3. O Minist�rio P�blico instaurou na extinta comarca de Montemor-o-Velho, a ac��o n� 125/06.9TBMMV, para liquida��o a favor
do Estado das heran�as abertas por �bito das supra identificadas AA e BB. 4. Na referida ac��o, CC e mulher DD deduziram a habilita��o do CC como herdeiro da falecida BB. 5. Por senten�a de 07.06.2010, foi o pedido de habilita��o de CC e mulher DD julgado improcedente e declaradas
vagas para o Estado as heran�as abertas por �bito de AA e de BB. 6. Esta senten�a foi confirmada pelo ac�rd�o da Rela��o de Coimbra de 17.05.2011, que por sua vez foi confirmado pelo ac�rd�o de 09.02.2012 do Supremo Tribunal de Justi�a, que transitou em julgado em 27.02.2012. 7.
Neste processo de liquida��o de heran�a vaga em benef�cio do Estado, os Reclamantes deduziram a reclama��o em 31.10.2014. III – Fundamenta��o de direito A aprecia��o e decis�o do presente recurso, delimitado pelas conclus�es da alega��o da recorrente (art.�s 635�, n.� 4 , e 639�, n.�
1, do C�d. de Proc. Civil[1]), passam, como j� se disse, pela an�lise e resolu��o da �nica quest�o jur�dica colocada a este tribunal e que se prende com a prescri��o dos cr�ditos reclamados anteriores a 05 de Novembro de 1994. As inst�ncias divergiram na solu��o encontrada para a quest�o, enquanto a 1� inst�ncia
considerou que tais cr�ditos n�o se encontravam prescritos, a Rela��o entendeu, ao inv�s, que se verificava a prescri��o desses cr�ditos. Apreciemos, ent�o, o delineado diferendo dilucidando que inst�ncia o ter� equacionado e solucionado em conformidade com as regras estabelecidas para a prescri��o de cr�ditos. A prescri��o, cujo nome
(praescriptio) e ra�zes mergulham no h�mus fecundo do direito romano[2], assenta no reconhecimento da repercuss�o do tempo nas situa��es jur�dicas e visa, no essencial, tutelar o interesse do
devedor[3]. � um ponto discutido, mas segundo a doutrina dominante, o fundamento espec�fico da prescri��o reside na neglig�ncia do titular do direito em exercit�-lo durante o per�odo de tempo tido como razo�vel pelo legislador e durante o qual seria leg�timo esperar o seu exerc�cio, se nisso estivesse
interessado[4]. Neglig�ncia que faz presumir ter ele querido renunciar ao direito, ou pelo menos o torna (o titular) indigno de protec��o jur�dica (dormientibus non succurrit jus)�
[5]. Outras raz�es, por�m, existem para justifica��o do instituto prescricional, assim sintetizadas: 1 – a certeza ou seguran�a jur�dica, a exigir que as situa��es de facto que se constitu�ram e
prolongaram por muito tempo, sobre a base delas se criando a expectativa e organizando planos de vida, se mantenham, n�o podendo ser atacadas por anti-jur�dicas[6]. 2 – a protec��o dos obrigados, especialmente os devedores, contra as dificuldades de prova, a que estariam expostos no caso do credor vir exigir o
que j� haja, porventura, recebido. O devedor pode realmente ter pago sem exigir recibo, ou pode t�-lo perdido. Ningu�m vai �conservar recibos, quita��es ou outros comprovativos anos e anos a fio�[7]. 3- a press�o ou est�mulo educativo sobre os titulares dos direitos no sentido de n�o descurarem o seu exerc�cio ou
efectiva��o, quando n�o queiram abdicar deles. Ainda que olhada, sob o ponto de vista da moral e do direito natural, com certo desfavor (os antigos qualificaram-na como impium remedium ou impium praesidium)[8], a prescri��o continua a ser reclamada pela boa organiza��o das sociedades civilizadas, apresentando-se, entre n�s, como uma excep��o n�o privativa dos direitos de cr�dito (art.� 298� do C�d. Civil) e, por isso mesmo, inserida na sua parte geral, no cap�tulo relativo ao tempo e � sua repercuss�o sobre as rela��es jur�dicas (art.�s 296� a 327� do C�d. Civil). � prescri��o est�o sujeitos todos e quaisquer direitos que n�o sejam
indispon�veis ou que a lei n�o declare isentos dela (art.� 298�, n.� 1, do C�d. Civil) e, uma vez completado o prazo prescricional, tem o benefici�rio a faculdade de recusar o cumprimento da presta��o ou de se opor, por qualquer forma, ao exerc�cio do direito prescrito (art.� 304�, n.� 1, do C�d. Civil), desse modo, bloqueando e paralisando a pretens�o do credor[9],
na configura��o de excep��o perempt�ria (art.� 576�, n.� 3, do C�d. Proc. Civil). Focando-nos, agora, nos cr�ditos reclamados, vemos que se reportam �s seguintes despesas alegadamente suportadas com as duas falecidas, cujas heran�as foram declaradas vagas a favor do Estado: �� �a) funeral da
BB – (€498,80); �b) ajuda econ�mica, desde 1946 at� ao decesso daquelas – (€13.697,85); �����c) acompanhamento m�dico da AA – (€2.455,84); ������d) instala��o da energia el�ctrica – (€99,76); ������e) cuidados prestados na sua habita��o – (€1.131,20); ������f) cuidado dos pr�dios desde 1946 – (€3.413,40); ������g) pagamento das contribui��es prediais tamb�m desde 1946 – (€439,65). A g�nese temporal de alguns desses cr�ditos remonta a 1946, prolongando-se at� aos �bitos da AA (28.11.1997) e de sua m�e, BB, ocorrido a 24.01.1998, pelo que a sua eventual prescri��o est� dependente da determina��o do inicio
da contagem do prazo, no fundo, a verdadeira diverg�ncia entre as inst�ncias e cuja dilucida��o constitui o n� g�rdio do recurso. Ali�s, como assinala Ant�nio Menezes Cordeiro[10], o inicio do prazo � inquestionavelmente �factor estruturante do pr�prio instituto da
prescri��o, dele dependendo, depois, todo o desenvolvimento subsequente, existindo, a tal prop�sito, no Direito comparado dois grandes sistemas: o objectivo e o subjectivo�. O primeiro �� tradicional, d� primazia � seguran�a e o prazo come�a a correr
assim que o direito possa ser exercido e independentemente do conhecimento que disso tenha ou possa ter o respectivo credor, sendo compat�vel com prazos longos�[11]. O segundo privilegia, por�m, a justi�a, iniciando-se o prazo apenas �quando o credor tiver conhecimento dos elementos essenciais relativos ao seu direito e joga com prazos curtos�. � Nesta mat�ria, o art.� 306�, n.� 1, do Cod. Civil, adoptou o sistema objectivo[12], que, como atr�s se salientou, dispensa qualquer conhecimento, por parte do credor, dos elementos essenciais referentes ao seu direito, iniciando-se o decurso do prazo de prescri��o
�quando o direito puder ser exercido�, sendo que a injusti�a a que tal sistema possa dar lugar � temperada pelas regras atinentes � suspens�o e interrup��o da prescri��o (art.�s 318� a 327�, do C�d. Civil). A express�o constante daquela disposi��o (art.� 306�, n.� 1, do Cod. Civil), “quando o direito puder ser exercido” deve ser interpretada no sentido de o prazo de prescri��o se iniciar quando o
direito estiver em condi��es (objectivas) de o titular o poder actuar, portanto desde que seja poss�vel exigir do devedor o cumprimento da obriga��o[13], isto �, ocorre a partir do momento em que o credor tem a possibilidade de exigir do devedor que realize a presta��o devida e, uma vez iniciado o prazo de prescri��o de qualquer direito, a respectiva contagem
prossegue a menos que ocorra qualquer suspens�o ou interrup��o (art.�s 318� e ss do C�d Civil), n�o relevando sequer a sua transmiss�o (art.� 308�, n.�s 1 e 2, do C�d. Civil). Retomando o foco sobre os cr�ditos reclamados v�-se que nenhum deles est� sujeito a qualquer condi��o suspensiva ou termo inicial (pelo menos nada foi alegado, a tal prop�sito), constituindo, assim, obriga��es sem prazo, tamb�m chamadas
“obriga��es puras”, cujo cumprimento pode ser exigido a todo o tempo (art.� 777�, n.� 1, do C�d. Civil). Os reclamantes podiam, pois, exigir directamente das falecidas o pagamento de cada um dos cr�ditos, logo que constitu�dos, e consequentemente iniciou-se, ent�o, ou melhor no respectivo dia seguinte (art.�s 296 e 279�, b), do C�d. Civil), o
curso do respectivo prazo de prescri��o (art.� 306�, n.� 1, do C�d. Civil). Nada os impedia de exercer os invocados direitos junto daquelas, em tempo oportuno, tanto mais que as mesmas disponham de patrim�nio, n�o tendo necessidade, de modo algum, em aguardar pela clarifica��o de que seria o Estado o benefici�rio das heran�as. Essa decis�o e a subsequente instaura��o do processo especial de
liquida��o de heran�a vaga em benef�cio do Estado apresentam-se, de todo, irrelevantes, para este efeito, pois tratando-se os cr�ditos reclamados de obriga��es puras em que o credor tem a possibilidade de exigir do devedor que realize a presta��o devida, a todo o
tempo[14], o prazo prescricional come�ou a correr a partir da respectiva g�nese temporal (art.� 306�, n.� 1, do C�d. Civil) e n�o com o tr�nsito do ac�rd�o do STJ que declarou vagas as heran�as. Ponderando que, no caso vertente, os cr�ditos foram reclamados a 31.10.2014 e a notifica��o do
Minist�rio P�blico para os impugnar ocorreu no dia 26.11.2014, ou seja para l� dos cinco dias a que alude o n � 2 do art.� 323� do C�d. Civil, h� que considerar, por um lado, que o prazo prescricional se interrompeu no dia 05 de Novembro de 2014 e, por outro, que todos os cr�ditos anteriores a 5 de Novembro de 1994 se encontram prescritos, por sobre eles ter decorrido o prazo ordin�rio de prescri��o de vinte anos, (art.� 309� do C�d. Civil). Nesta conformidade, improcedem as conclus�es da recorrente, a quem n�o assiste raz�o para se insurgir contra o decidido pela Rela��o, que n�o merece os reparos que lhe aponta nem viola as disposi��es legais que indica. IV – Decis�o Nos termos expostos, decide-se negar a revista e confirmar
consequentemente o ac�rd�o recorrido. Custas pela recorrente. Lisboa, 22 de setembro de 2016 Ant�nio Joaquim Pi�arra (relator) Fernanda Isabel Pereira Olindo Geraldes ____________________________ [1] Na vers�o aprovada pela Lei n� 41/2013, de 26 de Junho, uma vez que os recursos t�m por objecto decis�o proferida j� depois de 01 de Setembro de 2013 e o processo referente � reclama��o de cr�ditos � posterior a 01 de Janeiro de 2008 (cfr. os seus art.�s 5�,
n.� 1, 7�, n.� 1, e 8�). O que é exceção de prescrição?Matéria de defesa que se argui na contestação ou mesmo em outras fases do processo, para que se decrete a prescrição do direito do autor e seja, em conseqUência, julgado carecedor da ação.
O que significa dizer que a prescrição é uma exceção substancial?A exceção substancial é aquela que, para ser conhecida pelo juiz, tem que ser manifesta- da pelo demandado no momento oportuno, sob pena de preclusão. Deste modo, a exceção substancial não permite a apreciação ex officio, salvo para a análise da prescri- ção (vide artigos 193 e 194 do Código Civil e artigo 219, § 5º.
Quando não cabe prescrição?Não corre a prescrição: I – entre os cônjuges, na constância da sociedade conjugal; II – entre ascendentes e descendentes, durante o poder familiar; III – entre tutelados ou curatelados e seus tutores ou curadores, durante a tutela ou curatela.
O que são exemplos de prescrição exceto?B é sujeita a interrupção e suspensão. C extingue apenas a ação que protege o direito. D é irrenunciavel.
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