O que significa voltar as coisas mesmas na fenomenologia?

ARTIGO

Fenomenologia e (in)consciência: Husserl, Freud e psicoterapia

Phenomenology and (un)consciousness: Husserl, Freud and psychotherapy

Cinthia Cardoso Dutra

Psicóloga e Mestranda em Filosofia na PUC-Rio. Bolsista do CNPq

Endereço para correspondência

RESUMO

O presente artigo pretende discutir a possibilidade e a relevância, especialmente para a psicologia clínica, de se estabelecer uma comparação entre o conceito de inconsciente tal como descrito por Freud e a análise fenomenológica da consciência apresentada por Husserl. Para tanto, o contexto histórico e as diferenças teleológicas entre as duas teorias são brevemente examinados e alguns dos seus principais conceitos são apresentados. Finalmente, é discutida a relevância desta questão para a psicologia clínica, através da caracterização da atuação do psicoterapeuta orientado fenomenologicamente.

Palavras Chave: Fenomenologia, Freud, Husserl, inconsciente, psicologia fenomenológica.

ABSTRACT

The present article intends to discuss the possibility and the relevance, especially for clinical psychology, of establishing a comparison between the concept of unconscious just as it has been described by Freud and the phenomenological analysis of consciousness presented by Husserl. In order to carry out this task, the historical context and the teleological differences between the two theories are examined shortly and some of their main concepts are introduced. Finally, lhe relevance of this subject for clinical psychology is discussed through the characterization of l the phenomenologicalpsychotherapist's activity.

Keywords: Phenomenology, Freud,

As obras de Edmund Husserl (1859-1938) e Sigmund Freud (1856-1939) têm sido exaustivamente estudadas e deram margem a inúmeras ramificações. Seus discípulos têm ido além das noções e conceitos originalmente propostos por eles, desenvolvendo novas teorias e novos métodos. A fenomenologia husserliana tem servido de base para avanços metodológicos em diferentes áreas do conhecimento, particularmente na psicologia, e as obras de filósofos como Heidegger, Merleau-Ponty e Sartre, por exemplo, não podem deixar de ser consideradas num estudo efetivo da consciência numa abordagem fenomenológica. A psicanálise freudiana, de forma semelhante, deu origem a importantes ramificações: autores como Jung, Reich, Klein, Bion e Lacan (para citar apenas alguns) desenvolveram seus próprios sistemas psicanalíticos a partir das idéias originais de Freud a respeito de inconsciente, líbido, pulsão e representação. Reconhecemos a importância destes avanços teóricos, mas não pretendemos abordá-Ios aqui. Nosso objetivo é outro: pretendemos discutir a possibilidade e a relevância para a psicologia clínica de se estabelecer uma comparação entre o conceito de inconsciente tal como descrito por Freud e a análise fenomenológica da consciência, apresentada por Husserl.

Ellenberger (1959) observa que Freud e Husserl nasceram e morreram em datas muito próximas e publicaram suas obras principais (Husserl, as Investigações Lógicas; e Freud, A Interpretação dos Sonhos) no mesmo ano de 1900. Além disso, Freud freqüentou por dois anos as aulas de filosofia de Franz Brentano, de quem Husserl foi o discípulo mais proeminente. Apesar da contemporaneidade, que nos permitiria supor que um tivesse conhecimento dos trabalhos desenvolvidos pelo outro, não se encontram, quanto a isso, referências explícitas em suas respectivas obras.

Para melhor compreendermos a discussão que pretendemos iniciar aqui, devemos manter sempre em mente o fato de que embora tanto a fenomenologia quanto a psicanálise abordem, de certa forma, o estudo da consciência, trata-se de dois campos distintos, surgindo de pontos de partida diferentes, com propósitos diferentes, usando métodos e terminologias diferentes" (Ellenberger, 1959: 94). Por esse motivo, é essencial que comecemos este trabalho apresentando uma síntese das condições culturais e históricas que serviram de palco para o aparecimento e desenvolvimento de ambas as teorias.

FENOMENOLOGIA: CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA

A fenomenologia surgiu, principalmente, como uma crítica do conhecimento, preocupada em resolver uma crise: a crise em que se encontravam as ciências à época da virada do século XX. "A crise de uma ciência", conforme explica Husserl, "indica simplesmente que seu caráter genuinamente científico, e toda a forma como estabeleceu seus objetivos e desenvolveu sua metodologia, tornou-se questionável" (Husserl, 1997: 3). O problema da crise das ciências foi colocado por Husserl no início do século XX, e o inspirou a desenvolver a fenomenologia, mas permanece ainda por muitos anos, pois é o mesmo a que se refere o título de sua obra de 1936: A Crise das Ciências Européias e a Fenomenologia, e ainda o mesmo que aparece na introdução das Meditações Cartesianas, de 1931: "Em lugar de uma discussão e da exposição dos sistemas filosóficos, há a mera aparência de um filosofar e de um criticar. Os filósofos se reúnem em congressos, mas as filosofias não se reúnem" (Husserl, apud Marques, 1997: 59).

Nesse contexto, Husserl atribui à filosofia a tarefa de repensar seus próprios fundamentos e os das outras ciências em bases de rigorosa racionalidade, numa tentativa de elucidar seus processos de conhecimento. Husserl discute este problema também nas Conferências de Paris: "É necessária uma reconstrução radical que satisfaça a idéia de filosofia como unidade universal das ciências na unidade de uma fundamentação absolutamente racional' (Husserl, 1992: 10). Este projeto só é exeqüível, segundo Husserl, através do método de investigação proposto pela fenomenologia, assunto que abordaremos aqui mais tarde.

Desta forma, a fenomenologia se constitui fundamentalmente, como uma teoria do conhecimento, com o principal objetivo de estabelecer a filosofia como uma ciência de rigor e racionalidade. É a partir dessa demanda, movido por um interesse científico-filosófico, que Husserl parte para um estudo fenomenológico da consciência, que é, como veremos, a instância doadora de sentido e, portanto, constituinte dos objetos de conhecimento.

O INCONSCIENTE FREUDIANO: GÊNESE E CONTEXTUALIZAÇÃO

A despeito da proximidade espaço-temporal a que nos referimos anteriormente, Freud parece estar preocupado com questões bem diversas daquelas que afligiam Husserl. Suas investigações partiram de observações clínicas e da auto-observação (A Interpretação dos Sonhos é em grande parte baseada em sua própria experiência e em seus próprios sonhos). Freud estava insatisfeito com as técnicas de que a psiquiatria tradicional dispunha àquele tempo para o tratamento das neuroses: parecia haver um verdadeiro abismo entre a fisiopatologia do cérebro e os sintomas persistentes que ele podia observar na sua prática clínica. Segundo Ellenberger (1959) Charcot, Janet e Breuer já haviam detectado tais dificuldades no tratamento de pacientes histéricas e obtiveram bons resultados clínicos quando começaram a admitir a hipótese de que os sintomas resultavam de representações inconscientes de alguma situação traumática. O método terapêutico deveria consistir, então, em trazer tais reminiscências esquecidas à consciência através da hipnose. Os resultados positivos obtidos por estes médicos estimularam Freud a explorar de uma forma mais sistemática o reino dessas representações reprimidas e da vida inconsciente do homem. A formulação do conceito de inconsciente, veia central de toda a teoria psicanalítica, surgiu, então, da necessidade de explicar atos psíquicos que, segundo as observações clínicas, só poderiam ser entendidos pela pressuposição de outros atos que de forma alguma poderiam ser conscientes.

Garcia-Roza (1992) observa que antes de Freud, a palavra inconsciente já era amplamente utilizada, embora sempre de forma puramente adjetiva, para designar algo que não estava iluminado pela consciência num dado momento. Neste sentido, algo que estivesse inconsciente poderia sempre vir a se tornar consciente, bastando para isso que o foco da consciência se voltasse para ele. Tratava-se, assim, de um conteúdo passivo, que não designava nada de relevante para a compreensão da subjetividade. Como observaremos a seguir, pode-se chamar este inconsciente de"adjetivo" (no sentido de que ele meramente qualifica fatos mentais que não estão conscientes), em oposição ao Inconsciente desenvolvido por Freud, que deve ser entendido como um substantivo (o Inconsciente)1 1 Em Freud, o inconsciente "adjetivo" aparece no sistema Pré-Consciente, do qual não trataremos no presente artigo. .

A noção de inconsciente como foi cunhada por Freud no capítulo VII de A Interpretação dos Sonhos,de 1900,e no artigo O Inconsciente, de 1915, designa, no entanto, algo bastante diverso. Freud não se refere ao inconsciente como uma parte da consciência que não se mostra: o inconsciente freudiano é um sistema psíquico dinâmico, ativo, que exerce grande influência na vida consciente, e possui uma estrutura própria,diversa daquela que pertence ao sistema consciente. Para Freud, a formulação de um sistema psíquico inconsciente era absolutamente necessária, pois suas observações clínicas apresentavam provas suficientes de que a vida consciente era incapaz de fornecer explicações sobre fenômenos como os sonhos, os atos falhos, os sintomas histéricos e neuróticos. Para ele, "exigir que tudo quanto acontece na mente deve também ser conhecido pela consciência significa fazer uma reivindicação insustentável" (Freud, 1999: 42).

Esclarecida a necessidade da formulação do conceito de inconsciente, Freud (1999) tenta provar também a sua legitimidade. Para isso, ele afirma que no nosso modo habitual, e geralmente aceito, de pensar, inferimos que outras pessoas possuem uma consciência (da qual não podemos ter nenhuma prova), a partir do fato, evidente para nós, de que possuímos uma consciência. Ou seja, por analogia das declarações e ações observáveis de outra pessoa, posso inferir que ela possui uma consciência, semelhante àquela que eu possuo. Sem essa inferência, pela qual atribuímos aos outros a nossa própria constituição, não nos seria possível atingir qualquer nível de compreensão sobre a conduta alheia. O que Freud propõe, em seguida, é que apliquemos este mesmo processo à nossa própria consciência: "todos os atos e manifestações que noto em mim mesmo, e que não sei como ligar ao resto da minha vida mental, devem ser julgados como se pertencessem a outrem: devem ser explicados por uma vida mental atribuída a outra pessoa" (Freud, 1999:44). É claro que este processo de inferência proposto não leva ainda à revelação de um inconsciente, mas de uma segunda consciência no indivíduo, unida ainda à consciência que se conhece. Essa noção de consciência inconsciente, entretanto, não é ainda suficiente para explicar a existência de processos mentais como aqueles que a prática clínica permitia supor: processos latentes, mutuamente independentes, sem ligação uns com os outros. Muitos desses processos pareciam estranhos ou mesmo incríveis para a consciência, estando muitas vezes em oposição direta aos conteúdos mentais conscientes.

Com estas considerações, Freud julga ter motivos suficientes para concluir que os sintomas, que persistiam mesmo contra a vontade do indivíduo, só podiam ter causas inconscientes. Ele propõe, então, que modifiquemos nossa inferência a respeito de nós mesmos, pois já podemos dizer que "o que está provado não é a existência de uma segunda consciência em nós, mas a existência de atos psíquicos que carecem de consciência" (Freud, 1999: 45).

A produção do conceito de inconsciente resulta, como podemos ver, numa cisão da subjetividade. Nesse sentido, Garcia-Roza (1992) nos chama atenção para o fato de que Freud rejeita a noção de subjetividade como um todo unitário, identificado com a consciência e sob o domínio da razão. Sua concepção de subjetividade, ao contrário, envolve uma divisão em dois grandes sistemas psíquicos: o Inconsciente e o Consciente, que travam entre si uma "luta interna, em relação à qual a razão seria apenas um efeito de superfície" (Garcia- Roza, 1992:16).

Em suma, o inconsciente não é um lugar, mas uma lei particular de articulação de representações, e não podemos ter acesso a essas representações senão através de sonhos, atos falhos, sintomas neuróticos etc., ou seja, somente em situações em que os processos do sistema consciente estão "suspensos" em maior ou menor grau.

Parecem estar claras, pelo que foi exposto até aqui, as condições que levaram Freud a desenvolver sua teoria sobre o sistema inconsciente: ele não estava preocupado em desenvolver uma teoria do conhecimento, uma teoria sobre a maneira como a consciência conhece. Pelo contrário, parecia estar mais preocupado com aquilo que ela não conhece e muitas vezes não poderá conhecer. Com esse posicionamento, a psicanálise desloca a consciência do lugar privilegiado que ocupava até então, fazendo dela um mero efeito de superfície do inconsciente.

A FENOMENOLOGIA COMO TEORIA DO CONHECIMENTO: CONCEITOS BÁSICOS

Husserl, por sua vez, não estava interessado em condições psicológicas ou nas vivências concretas do sujeito empírico. Seu interesse, como veremos mais adiante, centrava-se sobre o universal, sobre a idealidade lógica, expressão pura de sentidos. Mas se estamos, como parece, diante de tantas diferenças, cabe a questão sobre a relevância e mesmo sobre a possibilidade de se estabelecer algum nível de correlação entre esses dois autores.

Recentemente, tive a oportunidade de participar de uma discussão via Internet exatamente sobre o assunto que aqui me disponho a abordar. Num determinado momento, um dos participantes, depois de tecer algumas considerações sobre a possibilidade de se comparar fenomenologia e psicanálise, fez uma observação bastante apropriada, que cito aqui integralmente: "Há um livro famoso na Irlanda que contém o seguinte capítulo: 'Cobras na Irlanda: Não há cobras na Irlanda'. Não gostaria de, após anos de estudo, aparecer com uma tese de apenas uma frase: 'Uma Comparação entre Freud e Husserl: Não há termos de comparação'." Parece que nos encontramos aqui diante do mesmo dilema. Se fenomenologia e psicanálise estão voltadas, desde sua gênese, para objetivos e objetos tão distintos, com que direito podemos comparar uma à outra? Antes de considerarmos mais profundamente esta questão, propomos deixá-la por ora em "suspenso", para proceder à exposição dos principais conceitos da fenomenologia.

Para empreender sua crítica do conhecimento, Husserl (1986) inaugura uma distinção essencial, entre o que chamou de atitude natural do senso comum (e também das ciências) e o pensamento filosófico, que põe em questão a possibilidade do conhecimento. A atitude natural, própria tanto do cientista quanto do leigo, consiste em considerar o mundo como algo existente em si, dado "aí', independente de uma consciência. Acredita-se na existência do mundo e de tudo o que nele se encontra: objetos, idéias, seres vivos, etc. Trata-se de uma atitude pré-reflexiva ou pré-filosófica, desprovida de crítica: eu encontro a realidade diante de mim e a acolho tal como ela se apresenta.

Na atitude natural, portanto, segundo Husserl (1986), estamos voltados para as coisas de uma forma ingênua: fazemos enunciados, elaboramos juízos, estabelecemos leis, sempre segundo o que nos oferece a experiência direta: inferimos, deduzimos, generalizamos... Assim se desenvol- vem as ciências. Em todos os casos, a possibilidade do conhecimento é sempre óbvia. E mesmo quando o conhecimento é tomado como objeto de investigação, trata-se de uma investigação "natural", que o considera como um fato psicológico, uma vivência empírica. No campo das ciências naturais, portanto, temos, a princípio, uma certeza (ilusória) de que seus argumentos são muito claros e compreensíveis e estamos realmente de posse da verdade objetiva. Mas, para Husserl, esta "certeza" não se sustenta depois de efetuarmos uma reflexão mais rigorosa.

Uma teoria verdadeiramente crítica do conhecimento deve se desvencilhar da reflexão natural e buscar a essência do conhecimento e de seu objeto. Esta é a tarefa da fenomenologia, uma ciência constituída como uma nova dimensão filosófica e que necessita, portanto, de um método também inteiramente novo, que a diferencie das outras ciências. O único método capaz de preencher tais exigências é o da epoché ou redução fenomenológica.

Ao adotarmos uma atitude reflexiva, própria do pensamento filosófico, abandonamos a atitude natural para assumirmos uma postura crítica perante o mundo: devemos colocar entre parênteses ou suspender nossa crença na"tese do mundo",sem negar, porém, a sua existência. Ou seja, a tese do mundo continua sendo uma vivência, só que não me utilizo mais dela. O mundo concreto deixa de ser para mim existente e passo a vê-lo apenas como fenômeno: "É-me permitido dispor de todas as ciências só enquanto fenômenos, portanto não como sistemas de verdades vigentes" (Husserl, 1986:26). Husserl não quer dizer com isso que o mundo simplesmente não existe.O mundo permanece o mesmo, o que muda é a minha forma de abordá-lo: "não o assumo simplesmente como existente, mas abstenho-me de toda a tomada de posição quanto ao ser e à aparência"(Husserl, 1992: 15).

Desta forma, ao efetuarmos a redução fenomenológica, "perdemos" o mundo num certo sentido, mas apenas para "ganhá-lo" num outro sentido, mais puro, no qual podemos vislumbrar as essências. Isso porque quando "desconectamos" o mundo, quando deixamos de considerá-lo como dado, para nos defrontarmos com ele de uma forma mais pura, livre dos pré-conceitos, o que resta é o eidos, ou essência. Ou seja, quando nos livramos de tudo o que é contingente num objeto, teremos diante de nós uma estrutura invariante, cuja presença permanente ao longo de todas as variações possíveis, define o objeto.

Essa é a região das vivências puras, da consciência pura e seus correlatos puros. A famosa frase de Husserl sobre voltar às coisas mesmas refere-se exatamente a estas essências ou idealidades universais: a fenomenologia pretende voltar-se para o objeto ideal, entendido como correlato de uma consciência pura. Mas para atingir essa consciência pura, devo colocar também entre parênteses meu eu empírico ou psicológico, minha subjetividade ligada às minhas experiências existenciais, sentimentos, inteligência, etc. É desse ato filosófico de redução do meu próprio eu que surge um eu depurado, o eu transcendental, apenas concebível em sua relação com o objeto, que também já não é um objeto mundano, mas um objeto intencional.

A intencionalidade é a propriedade fundamental da consciência: dizer que a consciência é intencional é dizer que ela está sempre voltada para um objeto, é sempre consciência de alguma coisa, e o objeto é sempre objeto-para-uma-consciência. A cada ato da consciência (noesis) se refere um correlato (noema), que só vai existir enquanto relacionado a esse ato e, portanto, apenas enquanto objeto-percebido, objeto-pensado, objeto-lembrado, objeto-imaginado etc. Em outras palavras, a consciência se volta para um objeto num ato que Husserl denominou intenção. No sentido contrário, o mesmo objeto se dá à consciência e preenche essa intenção. Quando a intenção é preenchida pela presença do objeto, temos uma intuição. Essa presença não se refere necessariamente à presença física, pois o objeto pode também dar-se como imaginado, recordado,desejado, procurado, amado, etc., e em todos esses casos ainda podemos falar de intuição. Esse processo forma uma unidade fenomenológica, que pode ser representada de forma esquemática, como se segue:

O que significa voltar as coisas mesmas na fenomenologia?

Quando a intenção é adequadamente preenchida pela intuição, fala-se de evidência. É nesse caso que podemos estar certos de que o conhecimento se dá realmente: "a evidência é a consciência que efetivamente vê, que apreende [o seu objeto] direta e adequadamente; (...) evidência nada mais significa que o adequado dar-se em si mesmo" (Husserl, 1986: 88). Husserl (1986) observa que o mesmo objeto pode se dar de forma evidente em certos casos e em outros não. Ele cita um exemplo: posso pensar o juízo 2 x 2 = 4, de uma forma meramente simbólica ou representativa; mas de outra vez, posso também pensar o mesmo juízo e ele me ser dado como evidência, isto é: a intuição preenche a intenção do visar, e o sentido da expressão 2 x 2 = 4 me é dado em si como evidente. No primeiro caso, porém, em que simplesmente falo ou penso o juízo de forma vaga ou meramente simbólica, tenho uma intenção vazia. Em outras palavras: num caso, tenho a autopresentação do fenômeno, uma "captação visual adequada", e no outro, um simples visar. Trata-se nos dois casos do mesmo fenômeno? Husserl nos diz que são dois fenômenos "totalmente diversos, unidos apenas por algo que nos dois se pode identificar, e que chamamos sentido" (Husserl, 1986: 89). Com isso, Husserl quer mostrar que o campo de investigação da fenomenologia refere-se à esfera do dar-se em si puro, da evidência.

Pelo que foi dito, fica claro que a consciência revelada pela investigação fenomenológica não se restringe à mera consciência psicológica do eu empírico: ela se configura, antes, como a "consciência pura", palco da aparição dos fenômenos. É através da unidade fenomenológica composta pela consciência intencional e seu correlato dado na intuição, que o mundo e as coisas adquirem sentido. Por esse motivo é que podemos dizer que a consciência é doadora de sentido. Esse postulado fenomenológico é de fundamental importância para o prosseguimento de nossas considerações no presente trabalho, como veremos adiante.

INCONSCIENTE FREUDIANO VERSUS CONSCIÊNCIA INTENCIONAL

O pouco que expusemos até aqui sobre a fenomenologia nos parece já suficiente para retomarmos a nossa questão: que tipo de relação pode ser estabelecida entre o conceito de inconsciente freudiano e a fenomenologia? Em primeiro lugar, devemos perguntar: qual é a possibilidade de uma tal relação? Parece bastante óbvio que, numa teoria onde a principal característica da consciência é a intencionalidade (o estar sempre voltada para alguma coisa), não pode haver lugar para uma instância dentro do próprio sujeito à qual sua consciência não pode ter acesso. Mas as implicações dessa afirmação não são assim tão simples.

Segundo Merleau-Ponty (1973), "Husserl rejeitou sempre as psicologias desenvolvidas em seu tempo, inclusive a Psicologia da Forma, muito embora tenha sido criada por autores que receberam seus ensinamentos e foram por ele influenciados" (Merleau-Ponty, 1973: 53). E continua: "A objeção perpétua de Husserl à 'Gestalt Théorie', como à toda psicologia, é de que ela desconhece a originalidade radical, absoluta, da consciência, reduzindo-a quer a átomos psicológicos, como as velhas psicologias de outrora, quer a estruturas 'totalitárias', mas provenientes da ordem do causal, do natural, do fato" (Merleau-Ponty, 1973: 54-55). Em outras palavras, a consciência é percebida pelo psicólogo em geral, de uma forma naturalista, como mais uma coisa entre as coisas do mundo, e este é um erro grave, segundo Husserl, porque o modo de ser da consciência é distinto. Segundo ele, "seguir o exemplo das ciências naturais significa quase inevitavelmente materializar a consciência, e isso leva-nos desde logo a um absurdo que está na origem da inclinação constante para proposições absurdas dos problemas, e para falsas orientações da investigação. Atentemos nisto. O mundo material é o único a ser Natureza em sentido expressivo.Toda a restante existência individual, o psíquico, é Natureza em sentido secundário, e isto é determinativo de diferenças fundamentalmente essenciais entre os métodos da Ciência natural e da Psicologia" (Husserl, 1952: 30). Não devemos, portanto, aplicar a fenômenos psíquicos o mesmo método experimental que serve à investigação das coisas da Natureza, sob pena de recairmos no absurdo.

As críticas que Husserl (1952) dirige explicitamente à psicologia experimental talvez possam ser estendidas também à psicanálise: Freud não só "materializou" a consciência, como a dividiu em dois subsistemas "rivais": o Inconsciente e o Consciente. Aliás, Freud sempre fez questão de enfatizar seu posicionamento dualista: toda a psicanálise se baseia em estruturas de pares opostos: prazer/desprazer, pulsão devida/pulsão de morte, pulsão/representação etc. O mínimo que se pode dizer da psicanálise, sob um ponto de vista fenomenológico, é que ela permanece, como todas as outras ciências, mergulhada na atitude natural, propondo-se a um estudo da consciência (e aqui não importa com que finalidade) sem ter se dado conta da estrutura intencional que a caracteriza.

A fenomenologia, ao contrário, suspende todo o conhecimento e as verdades oferecidas pelas ciências naturais para aceitar como verdade inquestionável somente aquilo que me é apresentado na unidade fenomenológica do ato intencional. Somente devo considerar como conhecimento verdadeiro aquilo que me aparece como correlato visado por minha consciência intencional, depois que efetuo a redução fenomenológica. Em outras palavras, só posso conhecer verdadeiramente o que me pode ser dado como intuição pura, preenchedora de um ato intencional. Toda a fenomenologia se baseia no princípio da intuição pura, e Husserl (1986) nos alerta para o fato de que a tendência a se desenvolver pensamentos excessivos e especulativos e deles extrair supostas evidências é extremamente perigosa para o conhecimento intuitivo das idealidades universais. Por isso, ele recomenda: "o menos possível de entendimento, mas o mais possível de intuição pura" (Husserl, 1986: 92).

Talvez possamos dizer, seguindo este pensamento de Husserl, que Freud tenha ''superutilizado" o entendimento, construindo conceitos com uma aparência de evidência, mas que são meras construções intelectuais. Um procedimento desse tipo não pode ser considerado válido sob a perspectiva do rigor fenomenológico, que enfatiza a intuição pura como elemento fundamen- tal para o conhecimento. Husserl nos diz que nada devemos deixar valer "a não ser aquilo que, no campo do ego aberto pela epoché, nos foi dado efetivamente e, antes de mais, de um modo todo imediato [e, portanto], nada [devemos] expressar que nós próprios não vejamos' (Husserl,1992:17).

Em suas lições sobre Fenomenologia da Consciência do Tempo Imanente, publicadas originalmente em 1928, Husserl se refere à impossibilidade de conteúdos inconscientes: "É absurdo falar de um conteúdo 'inconsciente' que só posteriormente se faria consciente (...). Como a fase retencional contém a consciência da anterior, sem fazê-la objeto, assim também o dado originário está já consciente - e isto na forma peculiar do 'agora' - sem ser objetal. (...) essa consciência originária é aquilo que ultrapassa a modificação retencional (...) e se ela não existisse, tão pouco seria pensável qualquer retenção; uma retenção de um conteúdo inconsciente é impossível"(Husserl, 1959: 181).

A sistematização psicanalítica do aparelho psíquico implica na noção de um passado imerso no determinismo causal, pois que se traduz por traços mnêmicos, cujos elementos representativos sofrem uma pressão ou censura, da qual muitas vezes não conseguem se libertar, mas que apesar disso exercem grande influência sobre a vida consciente presente. Se admitirmos, entretanto, a consciência como sugere Husserl (1959), sob a forma de um presente que se expande em retenção e protenção, podemos explicar fenômenos como a fantasia, a memória, a recordação, etc. sem recorrer à noção de inconsciente. Não vamos nos alongar aqui sobre este assunto, mas este é um campo fértil para discussões posteriores. Por ora, basta que tenhamos a clara noção de que o fato (óbvio) de que não posso estar consciente o tempo todo de tudo aquilo que minha consciência conhece não implica que aquilo de que não estou consciente agora foi reprimido à força, que pertence a uma outra ordem e obedece a outras leis2 2 Este fato é tão óbvio para Husserl quanto para Freud, que postula a existência do sistema Pré-consciente, onde os atos psíquicos não se encontram reprimidos, mas apenas "não-conscientes", com a possibilidade de ganharem livre acesso à consciência. .

Talvez pudéssemos simplesmente escapar de toda essa discussão filosófica dizendo que, afinal, como já ressaltamos, Freud não tinha a pretensão de um compromisso com uma verdade última, que seu objetivo era produzir um arcabouço teórico que melhor orientasse sua prática clínica na busca pela cura de seus pacientes3 3 Notemos que o termo "psicanálise" denota duas coisas diversas:' num sentido, refere-se a um método concreto e prático de terapia, elaborado a partir da constatação da ineficácia dos tratamentos existentes até então; em outro sentido, o termo "psicanálise" refere-se à fundamentação científica deste método concreto de terapia, descoberto na prática. Este sistema teórico, a que Freud chamou "Metapsicologia" surge portanto, secundariamente, como resultado de experiências empíricas. (sim, porque apesar de a Metapsicologia ter sido inegavelmente o grande legado teórico deixado por Freud, sua motivação para desenvolvê-la surgiu de suas vivências clínicas e da necessidade de um sistema que explicasse os fatos por ele observados). Ou que ele não se preocupava em estar situado na "atitude natural". Poderíamos dizer, ainda, que o conceito de inconsciente é "absurdo" (Husserl, 1959) na fenomenologia porque Husserl pensa a consciência num sentido diverso, como consciência do eu transcendental, enquanto Freud aborda a consciência do ponto de vista psicológico. Mas com isso, ou abandonaríamos de vez nossa discussão, ou talvez não conseguíssemos mais do que outro dualismo: como se existissem duas consciências: a psicológica, da psicanálise; e a transcendental, de Husserl.

Aqui estamos de volta ao dilema mencionado anteriormente. Se admitirmos que Freud e Husserl encontram-se em dois campos absolutamente distintos e que tratam de objetos diferentes, os psicólogos deveriam tomar como objeto apenas a consciência psicológica conforme foi estudada por Freud e deixar a fenomenologia para os filósofos. Husserl quis deixar bastante clara a distinção entre filosofia e psicologia, e dedicou-se mesmo à meta obstinada de livrar por completo a primeira da influênciada segunda. Apesar disso, e apesar de ele não ter pretendido de forma alguma desenvolver um sistema psicológico (e realmente não o fez), o fato é que muitos psiquiatras e psicólogos encontraram na fenomenologia um instrumento inegavelmente valioso para sua prática terapêutica. E sob esse aspecto, a discussão aqui proposta toma novo fôlego.

ATITUDE FENOMENOLÓGICA E PSICOTERAPIA

Ao adotar psicanálise ou fenomenologia como fundamento ou como um vetor de direção para sua prática clínica, o psicólogo está adotando mais do que um simples posicionamento teórico: está escolhendo uma determinada postura diante de si e do paciente. O psicólogo orientado fenomenologicamente, assim como o psicanalista, aborda o mundo do paciente como uma organização estruturada de significados que direcionam a forma com que ele percebe o mundo e a si mesmo. A compreensão desses significados, entretanto, não deve partir de uma construção teórica exterior: o psicólogo, seguindo os passos da fenomenologia, deve "colocar entre parênteses" seus próprios significados e seus conhecimentos teóricos, que apenas atuariam como fator de distorção e incompreensão. Como sinalizou Husserl: "A experiência fenomenológica enquanto reflexão deve manter-se afastada de todas as invenções construtivistas e, como genuína, deve tomar-se muito concreta, justamente com o conteúdo de sentido de ser com que ela surge" (Husserl, 1992: 21). A consciência do psicólogo deve, então, se voltar para o sentido que o paciente expressa, para a essência de seu vivido, que não se constitui meramente por símbolos referidos a um conteúdo oculto e inacessível.

O psicólogo que adota uma postura fenomenológica deve agir no sentido de auxiliar o paciente a refletir. O paciente, de forma geral, encontra-se imerso na atitude natural, o que o leva a perceber seu quadro de referência (sua estrutura de significados) como verdade única que se impõe à sua consciência. Entretanto, se passar a refletir fenomenologicamente, se voltar sua consciência intencional para o seu vivido e operar a redução fenomenológica, poderá perceber que seu significado é apenas um entre os vários significados possíveis. Assim, o psicólogo deve ser em relação ao paciente como a consciência reflexiva é para a consciência espontânea (da atitude natural) numa mesma pessoa. Ele deve suspender seus juízos e sua própria estrutura de significados e auxiliar o paciente (como o faz a consciência reflexiva) a abandonar a "atitude natural", para que ele possa visar seus próprios sentidos.

Da mesma forma que o psicanalista, o "psicólogo-fenomenólogo" também parte da observação dos comportamentos, linguagem, sonhos etc. de seu paciente, mas com a diferença de que estes fenômenos não precisam ser traduzidos ou interpretados a partir de um código intelectualmente construído. Simplesmente porque eles não simbolizam nada oculto: ao contrário, cada um desses modos de ser trazem em si uma essência comum: a essência em torno da qual se estrutura o mundo do paciente. Essa essência se mostra à consciência pela intuição, depois de realizada a epoché, sem a necessidade de recorrermos a nenhum sistema teórico intelectualmente constrúído, externo ao indivíduo. Aqui, seguimos o já mencionado conselho de Husserl: "o menos possível de entendimento, mas o mais possível de intuição pura" (1986: 92), ou, em outras palavras: o mínimo de interpretação, o máximo de descrição.

Em geral, este funcionamento segundo uma estrutura de significados é inconsciente para nós, o que não significa que haja algo reprimido: simplesmente, a consciência reflexiva ainda não e voltou para esta forma natural de proceder. Assim, tornar a experiência conscientizada, isto é: pensar reflexivamente de forma a elucidar a estrutura dos significados que direcionam nossos atos, não pode ser confundido com tornar o inconsciente consciente. Esse posicionamento fenomenológico, como podemos notar, distingue-se de forma muito clara daquele adotado pela prática psicanalítica.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pretendemos ter mostrado nessa breve exposição que uma análise comparativa sobre as teorias de Freud e Husserl, especialmente no que se refere à noção de inconsciente, não é tarefa simples, mas é possível, resguardadas as diferenças contextuais e teleológicas que mencionamos; e que uma tal discussão mostra- se bastante relevante pelo menos no que se refere à prática da psicologia clínica.

É preciso deixar claro, que não se deve atribuir à fenomenologia a tarefa de fornecer nenhum tipo de procedimento clínico que pretenda substituir as técnicas de tratamento desenvolvidas pela psicologia. O método fenomenológico apresenta-se à psicologia como uma atitude, um método de investigação4 4 O método fenomenológico serve à Investigação psicológica tanto na clínica quanto na pesquisa científica de temas clássicos da psicologia (percepção, memória, etc.). Para detalhes sobre a pesquisa fenomenológica em psicologia, ver AMATUZZI, M., "Apontamentos acerca da pesquisa fenomenológica" (Estudos de Psicologia, 13 (1),1996,5-10), e GIORGl, A., "Criteria for Evaluating Phenomenological Psychological Research" (Journal of Phenomenological Psychology, vol.. 28, nº 2, 1997). , uma forma de tentar captar o sentido do outro, com o menor grau de interferência possível de nossos próprios valores, crenças, teorias e preconceitos. Fica evidente, portanto, que quando nos referimos à prática psicológica orientada pela fenomenologia, não estamos querendo dizer que se deve simplesmente substituir a psicologia pela fenomenologia nos consultórios. Os conhecimentos desenvolvidos pela psicologia e pela psicopatologia (com uma referência especial a Karl Jaspers, por seu tratado fenomenológico de psicopatologia:Psico-patologia Geral ) são evidentemente fundamentais na clínica, e sem eles não se pode nem mesmo chamar qualquer prática de clínica. Entretanto, numa abordagem fenomenológica, esses conhecimentos teóricos devem ficar, num primeiro momento, suspensos ou entre parênteses, para evitar a interposição de sistemas interpretativos que imponham, já de antemão, significados outros àquilo que o paciente expressa. Em suma, uma psicoterapia fenomenológica, seguindo o argumento husserliano da total falta de pressupostos, se utilizaria do método fenomenológico com o objetivo principal de atingir com o maior grau de evidência possível o sentido do mundo do paciente, para somente num segundo momento do processo terapêutico, se utilizar dos conhecimentos teóricos e das técnicas fornecidas pela psicologia.

  • Endereço para correspondência:

    Av. Genaro de Carvalho 315 bloco 4 casa 8

    Recreio dos Bandeirantes

    Rio de Janeiro - RJ

    CEP 22790-070

    Tel: (OXX-21-490-2243)

    E-mail:

  • Agradeço imensamente a orientação e os comentários críticos do Prof. Paulo César Duque Estrada, do Departamento de Filosofia da PUC-Rio, e o incentivo da psicóloga e mestra Amar Yllis Schvinger.

  • 1

    Em Freud, o inconsciente "adjetivo" aparece no sistema Pré-Consciente, do qual não trataremos no presente artigo.

  • 2

    Este fato é tão óbvio para Husserl quanto para Freud, que postula a existência do sistema Pré-consciente, onde os atos psíquicos não se encontram reprimidos, mas apenas "não-conscientes", com a possibilidade de ganharem livre acesso à consciência.

  • 3

    Notemos que o termo "psicanálise" denota duas coisas diversas:' num sentido, refere-se a um método concreto e prático de terapia, elaborado a partir da constatação da ineficácia dos tratamentos existentes até então; em outro sentido, o termo "psicanálise" refere-se à fundamentação científica deste método concreto de terapia, descoberto na prática. Este sistema teórico, a que Freud chamou "Metapsicologia" surge portanto, secundariamente, como resultado de experiências empíricas.

  • 4

    O método fenomenológico serve à Investigação psicológica tanto na clínica quanto na pesquisa científica de temas clássicos da psicologia (percepção, memória, etc.). Para detalhes sobre a pesquisa fenomenológica em psicologia, ver AMATUZZI, M., "Apontamentos acerca da pesquisa fenomenológica" (Estudos de Psicologia, 13 (1),1996,5-10), e GIORGl, A., "Criteria for Evaluating Phenomenological Psychological Research" (Journal of Phenomenological Psychology, vol.. 28, nº 2, 1997).

  • Endereço para correspondência: Av. Genaro de Carvalho 315 bloco 4 casa 8 Recreio dos Bandeirantes Rio de Janeiro - RJ CEP 22790-070 Tel: (OXX-21-490-2243) E-mail: 1 Em Freud, o inconsciente "adjetivo" aparece no sistema Pré-Consciente, do qual não trataremos no presente artigo. 2 Este fato é tão óbvio para Husserl quanto para Freud, que postula a existência do sistema Pré-consciente, onde os atos psíquicos não se encontram reprimidos, mas apenas "não-conscientes", com a possibilidade de ganharem livre acesso à consciência. 3 Notemos que o termo "psicanálise" denota duas coisas diversas:' num sentido, refere-se a um método concreto e prático de terapia, elaborado a partir da constatação da ineficácia dos tratamentos existentes até então; em outro sentido, o termo "psicanálise" refere-se à fundamentação científica deste método concreto de terapia, descoberto na prática. Este sistema teórico, a que Freud chamou "Metapsicologia" surge portanto, secundariamente, como resultado de experiências empíricas. 4 O método fenomenológico serve à Investigação psicológica tanto na clínica quanto na pesquisa científica de temas clássicos da psicologia (percepção, memória, etc.). Para detalhes sobre a pesquisa fenomenológica em psicologia, ver AMATUZZI, M., "Apontamentos acerca da pesquisa fenomenológica" (Estudos de Psicologia, 13 (1),1996,5-10), e GIORGl, A., "Criteria for Evaluating Phenomenological Psychological Research" (Journal of Phenomenological Psychology, vol.. 28, nº 2, 1997).

    O que é voltar as coisas mesmas fenomenologia?

    O método fenomenológico se define como uma volta às coisas mesmas, isto é, aos fenómenos, aquilo que aparece à consciência, que se dá como objecto intencional. Seu objectivo é chegar à intuição das essências, isto é, ao conteúdo inteligível e ideal dos fenómenos, captado de forma imediata.

    O que seria o retorno as coisas mesmas?

    Voltar às coisas mesmas significa o re- torno daquilo que nos aparece como algo ex- perimentado, vivido, conhecido, mas que não é dado como algo existente no mundo. E todas as coisas que aparecem à consciência de modo puro após a epoché fenomenológica são os fenômenos.

    O que significa a frase um retorno as coisas mesmas usada por Husserl para definir a fenomenologia?

    Uma das questões fundamentais da fenomenologia, segundo Husserl (1986) é que devemos retornar às coisas mesmas. Para Merleau-Ponty (1971), este retornar as coisas mesmas, seria voltar para o mundo anterior ao conhecimento. Conhecimento este baseado na concepção científica do mundo.

    Quais são os principais conceitos dá fenomenologia?

    Fenomenologia é o estudo de um conjunto de fenômenos e como se manifestam, seja através do tempo ou do espaço. É uma matéria que consiste em estudar a essência das coisas e como são percebidas no mundo.